"Não podemos deixar de reprimir a criminalidade", diz chefe da PC
Delegado do 4º Departamento de Polícia Civil de Minas Gerais, José Walter da Mota Matos, fala dos planos e expectativas para o departamento
Repórter
17/05/2014
No currículo já são quase 24 anos de Polícia Civil (PC) em Minas Gerais. Todos como delegado. A trajetória de José Walter da Mota Matos, atual chefe da 4ª Departamento de Polícia Civil, 47, traz a experiência de quem chega com a responsabilidade de apresentar resultados imediatos para uma população temerosa com os altos índices de violência em Juiz de Fora. Até às 23h59 de 15 de maio, eram 60 homicídios consumados na cidade, conforme informações da assessoria de imprensa da PC.
E logo nos primeiros dias de trabalho, Matos apresentou seu cartão de visitas: cinco pessoas presas e três adolescentes apreendidos, todos suspeitos de estarem envolvidos em assassinatos ocorridos em Juiz de Fora. "A nossa disposição é trabalhar. Nós temos muito respeito pelas outras instituições, temos que trabalhar em harmonia com o Poder Judiciário e com o Ministério Público (MP), para respeitar os devidos processos legais. Eu sou um defensor dos direitos humanos, mas também não podemos deixar de reprimir a criminalidade, não podemos estimular a impunidade, porque isso também contribui para o aumento dos índices. Nesse sentido também já procuramos uma aproximação com a Prefeitura Municipal, que acabou de apresentar um projeto, JF+Vida, que é muito importante e vai exigir das diversas instituições da cidade um trabalho em conjunto para recuperação de pessoas com desvio de conduta e que vai resultar, com certeza, na diminuição da criminalidade. Tenho a proposta de aproximação com o gestor público e com vereadores, porque entendo que algumas medidas na área social contribuem demais na diminuição dos crimes. Fiz uma visita de cortesia para o comandante da Polícia Militar (PM), do Corpo de Bombeiros, ao diretor do Fórum, e ao presidente do Hospital 9 de Julho, já que acredito muito no trabalho em rede. Nós da PC queremos uma parceria com a Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), com outras faculdades do município, porque sabemos que Juiz de Fora é um polo na educação. Entendo que a educação não pode ficar fora nessa proposta de redução de criminalidade. Então, estamos abertos para um diálogo interdisciplinar. E acredito que em um curto a médio prazo nós vamos reverter isso", afirma o delegado José Walter.
- Caminhão guincho quebra e congestiona avenida Rio Branco
- Tatiana Bejani se suicidou, conclui inquérito
- Projeto JF+Vida é lançado com promessa de combate às drogas
O desafio, de acordo com Matos, é grande. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a população estimada em toda a Zona da Mata mineira, área da qual se tornou responsável no último dia 14 de abril, é superior à 2 milhões de pessoas. "É uma realidade complexa. Juiz de Fora tem uma peculiaridade porque, apesar de ser uma cidade polo, tem tradição de tranquilidade, harmonia e qualidade de vida. É um desafio muito grande. E nenhuma instituição, nenhum órgão vai vencer sozinho. Por isso que a gente chega com discurso de trabalhar em rede. A PC é um dos atores da defesa social, a nossa proposta aqui é de integrar e interagir com as outras instituições. Se nós somarmos PM, PC, Bombeiros, Poder Judiciário, MP, imprensa, que tem um papel muito importante, com a maioria da população, que são pessoas de bem, nós vamos vencer esse desafio, preservando a qualidade de vida. No setor específico da PC, que atua em ações investigativas de Polícia Judiciária, é muito importante para fluir as denúncias do MP. Por isso nós queremos qualificar e melhorar os nossos policiais, com ações para, num primeiro momento, prover de recursos as nossas delegacias regionais e distritos policiais. Dar os recursos que eles precisam para trabalhar. E num segundo momento, desenvolver um trabalho para cobrar os resultados da aquisição desses recursos. É uma questão de gestão também. Nesse aspecto eu quero dizer que estamos muito servidos em Juiz de Fora, com a nossa delegada regional, Sheila Aparecida Pedrosa de Melo Oliveira, que também está iniciando um trabalho como gestora. Se nós formos observar, já deu uma outra dinâmica para os trabalhos. Eu concordo que os índices estão alarmantes e preocupantes. Mas temos que divulgar que a PC tem feito prisões importantes, atuando em investigações de repercussão com sucesso, e eu tenho certeza que nós vamos vencer esse desafio. Não tem segredo, é trabalho. A gente só consegue reduzir índice trabalhando. O meu papel nesse primeiro momento é prover os recursos e estimular o meu pessoal a trabalhar, produzir e apresentar resultados. Sempre lembrando que segurança pública não se faz sozinha. A população tem um papel muito importante em ver a polícia como sua parceira. Eu prego muito a polícia comunitária, aquela em que o cidadão de bem confia no policial que está trabalhando no seu bairro, que confia na seriedade e na correção desses profissionais que estão a frente destas ações. Nós vamos cobrar muito isso dos nossos servidores. A mentalidade é de quem ocupa um cargo de direção vai ser o reflexo que vai aparecer nos resultados. Sei que é difícil, mas também vejo que Juiz de Fora tem condições e material humano para fazer frente a esse aumento da criminalidade", diz o delegado.
Futuro
Entre os planos para o futuro da PC, José Walter afirma que uma segunda delegacia regional para a cidade é uma das prioridades da atual gestão. "Aguardamos as nomeações do concurso. Tivemos recentemente a formação de 122 médicos legistas. O nosso trabalho de trazer o Posto de Perícia Integrado (PPI) para Juiz de Fora e receber este material humano. Já é um compromisso do governo do estado. Se criamos outra delegacia regional na cidade, assim como em Viçosa, já que lá temos uma importante universidade federal, serão abertos concursos públicos específicos para contratação de pessoal, como delegados, investigadores e escrivães, para atuar nesses novos órgãos. Existe essa promessa do governo do Estado. É claro que esse investimento em segurança pública tem que ser permanente nos dias atuais. Os problemas de segurança pública não são exclusividade de nenhuma cidade, existem no Brasil inteiro, inclusive no interior. A gente assusta quando vê o número elevado aqui, porque não estamos acostumados com isso. Então vamos trabalhar as causas da violência, que as consequências vão ser a redução", explica.
Para Matos, o grande objetivo é fazer crescer o departamento de Polícia Civil em Juiz de Fora. "Meu principal objetivo é deixar uma instituição melhor da que eu entrei. Já passei por muitas dificuldades na polícia, e estas dificuldades me trouxeram amadurecimento e uma condição de que eu possa produzir coisas boas, ocupando o cargo que eu estou ocupando, com a consciência de que meu cargo é circunstancial e temporário. Eu não sou o chefe de departamento, eu estou chefe de departamento. Esse paradigma deve valer para todo mundo que ocupa um cargo de confiança. Não deve ter apego ao cargo, você está ali de passagem. Tudo passa muito rápido nessa vida, então que você faça o seu melhor e deixe um legado. Essa é a minha missão, e eu tenho certeza que vou alcançar esse objetivo", garante.
A trajetória como delegado
José Walter chega à Juiz de Fora com 47 anos e passagem por várias cidades de Minas Gerais. Nascido e criado em Pouso Alegre, no Sul de Minas, a 356 quilômetros de Juiz de Fora, a carreira na PC começou aos 24 anos, aprovado no primeiro concurso que prestou para o cargo. "Ingressei na academia de Polícia Civil fazendo curso pra ser delegado. Fui designado inicialmente para o município de Inconfidentes, a oito quilômetros de Ouro Fino, que pertence à regional de Pouso Alegre. Trabalhei muito ali no Sul de Minas. Dez meses depois eu fui transferido para a comarca de Borda da Mata e atuei como delegado substituto em férias e licença médica nas comarcas de Bueno Brandão, Monte Sião, Ouro Fino e Jacutinga. Com dois anos de Borda da Mata, voltei para Pouso Alegre para ajudar na delegacia regional. Lá atuei em todas as delegacias adjuntas e só não fui delegado regional porque era muito novo. Permaneci trabalhando em Pouso Alegre até que em 2006 eu fui convidado para trabalhar em Santa Rita do Sapucaí, que tinha um problema muito grande na cadeira pública de lá. Era o recorde de fugas no estado, com 46 no primeiro semestre. Eu fui e comecei um trabalho social. Ao chegar, verifiquei que as condições de trabalho eram péssimas. O primeiro passo foi dar dignidade para os presos. Trouxemos médicos, dentistas, pusemos uma sala de aula na cadeia e criamos uma horta comunitária. E de um semestre para o outro as fugas caíram para 3, sem que houvesse uma reforma estrutural na cadeia", comenta.
Em 2008, Matos foi convidado para assumir sua primeira delegacia regional, em Diamantina, no Vale do Jequitinhonha. De lá, voltou para o Sul de Minas, em São Lourenço, novamente no cargo de delegado regional, até alcançar o posto de delegado geral. "Em São Lourenço havia certas questões entre a PC e a PM. Atuei como mediador e graças a Deus apaziguamos a situação. Depois precisaram de mim em Itajubá, já que o índice de criminalidade estava muito grande e precisando de um trabalho específico. Aceitei o desafio e voltei ao Sul de Minas. Novamente um desafio grande, porque é uma cidade universitária com um bom parque industrial, mas muito próxima do estado de São Paulo. Houve um acréscimo muito grande de violência, então nós fizemos um trabalho de planejamento estratégico com uma equipe muito eficiente e conseguimos uma redução no primeiro ano da criminalidade na ordem de 37%. Isso chamou a atenção do superintende na época, e acabei sendo promovido para delegado geral e alçando o posto de chefe de departamento, sendo designado para assumir o departamento de Ipatinga, no Vale do Aço, em novembro de 2012", conta.
A trajetória no Vale do Aço, no entanto, não foi duradoura. Matos enfrentou um grave problema de saúde e se viu na obrigação de pedir afastamento do cargo, mesmo diante de uma crise na Polícia Civil da região. "Eu tomei posse em Ipatinga no dia 18 de dezembro de 2012 com uma série de projetos pra trabalhar lá. Mas aconteceram dois fatos: eu tive dois problemas de saúde, uma infecção na perna direita e um problema de coluna por causa da obesidade. Além disso, na mesma época, houve a morte de dois jornalistas que estavam tentando denunciar a ação de possíveis grupos de extermínio na cidade. Isso chamou atenção da Associação Brasileira de Imprensa, da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), do Ministério da Justiça e do próprio Governo de Minas. E eu, estando doente, pedi ao superintendente, Dr. Jeferson Botelho Pereira, que é o atual o atual superintendente da Polícia Civil, que me dispensasse do cargo para que eu pudesse tratar da minha saúde, já que naquele momento Ipatinga exigia a presença permanente do chefe de departamento e eu não tinha condições físicas de cumprir essa missão. Fiquei lá durante quatro meses. Fui dispensado no dia 19 de abril de 2013, retornei pra Pouso Alegre, fiz meu tratamento de saúde e sarei minha perna, melhorei do problema da coluna, fiz uma medicina interdisciplinar com dieta, com nutrólogo, nutricionista e fisioterapeuta. Perdi uma boa quantidade de peso e voltei a trabalhar em Pouso Alegre, como delegado assistente do chefe do departamento de lá. Quando houve a troca do chefe da PC em Juiz de Fora, em abril, vim para cá", explica.
Vida pessoal
José Walter é pai de duas mulheres, uma de 28 e outra de 7, e está casado pela segunda vez. Junto com seis irmãos, afirma que foi criado com rigidez pelo pai militar e a mãe dona de casa, mas com muito amor e calor humano. Fato que contribuiu para sua formação. "Eu sou uma pessoa que procura fazer meu papel de cidadão e profissional da melhor forma possível. Gosto muito de ter amizades. Eu tenho muitos amigos, dentro e fora da polícia. Eu acredito que essas relações interpessoais tem o condão de melhorar o mundo. O desejo de trabalhar com investigação é como um sacerdócio. Tem ferramentas muito importantes para fazer o bem, atuando com justiça, recuperando pessoas que se perderam na vida, punindo quem insiste com desvio de condutas. Isso traz harmonia para a sociedade. Eu me considero uma pessoa de bem, tenho defeitos e qualidades como todo mundo tem. Não me julgo melhor, nem pior que ninguém. Mas tenho muita boa vontade de fazer o melhor. Posso te garantir pela minha trajetória, que me sinto realizado pessoal e profissionalmente", conclui.
Entre na comunidade de notícias clicando aqui no Portal Acessa.com e saiba de tudo que acontece na Cidade, Região, Brasil e Mundo!