Um belo espetáculo mudo e preto e branco no vencedor do Oscar, O Artista
Muitos até dizem, erroneamente, que o filme é uma versão dramática e muda de Cantando na Chuva, extraordinário musical de Gene Kelly, que mostrava o "estrago" que o som causou quando chegou às telonas. Entretanto, o tom irônico e rítmico em que o tema foi tratado, contrasta com o drama melancólico, apesar de sutil, que conduz a produção franco-americana. E, ao contrário dos personagens do longa de 1952, o protagonista não é refém da mudança, e sim um resistente, já que nem tenta se adaptar à nova era.
A construção do roteiro apresenta uma articulação cinematográfica de vanguarda inteligente, especialmente quando monta as imagens de maneira metafóricas, assim como Serguei Einsestein o fizera na revolução do cinema russo da década de 20. E isso se fez muito importante para que a mensagem tivesse efeito sob o público. Além disso, a forma como acerta na caracterização do tempo-lugar mostra que pesquisou muito para mostrar a efervescência da Hollywood da década de 20, com as orquestras que sonorizavam as salas de cinema e, claro, todo o glamour que cercava as estrelas dos grandes estúdios.
Para construir seus protagonistas, Hazanavicius criou verossimilhanças como mitos da época. O seu George Valentin é inspirado em vários deles, dos quais Rodolfo Valentino, o primeiro grande galã, tem referências nos trejeitos e até no nome. Já Peppy Miller é uma mistura da musa do mudo Clarence Badger, com deusas da era do início do som, como Joan Crawford e Claudette Colbert (essa pelo lado cômico de filmes como Aconteceu Naquela Noite).
Os atores do filme mostram uma personalidade e talento incrível para conduzir seus personagens, já que teriam de construir uma linha tênue entre a simulação e a interpretação. Berenice Bejo se mostra versátil para viver as duas versões de Miller, mas mantendo o carisma e a sensibilidade. Porém, o filme é de Jean Dujardin, o francês é gigante em cena. É brilhante como o exagerado e galanteador no auge da carreira, e mais ainda como o melancólico decadente, que sente na pele o ostracismo de sua era. Para completar, os números de sapateado com sua parceira de cena tornam sua interpretação uma das mais completas que o cinema já viu, devidamente premiado com o Oscar.
Uma obra completa e nostálgica, um estudo meticuloso da arte cinematográfica e mostra que há muito o que se explorar das técnicas atuais, além de seu potencial para pirotecnias. Ousado na forma da concepção e brilhante no roteiro, venceu, com mérito, cinco categorias do Oscar (filme, diretor, ator, direção de arte e trilha sonora) das dez que disputou. Talvez seja apreciado por poucos, mas será cultuado por quem sonha um dia ver nas telas uma presença maior do cinema artístico.
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Paulo César da Silva é estudante de Jornalismo e autodidata em Cinema.
Escreveu e dirigiu um curta-metragem em 2010, Nicotina 2mg.
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