A cidade e a busca da felicidade
Eis que chegamos à época das eleições municipais. Os partidos políticos se organizam, os correligionários dos candidatos acirram os ânimos, a imprensa se mobiliza, a internet se transforma em um verdadeiro campo de batalha. A discussão sobre o perfil dos candidatos a prefeito e a vereador ganha espaço nos bares, praças e pontos de ônibus. Os santinhos dos pretendentes aos cargos executivo e legislativo inundam as calçadas e a televisão é tomada pela propaganda política. Para alguns, este período é desejado e esperado. Gostam da agitação, dos debates e da ansiedade que toma conta do período eleitoral. Outros o detestam, pois estão, na maior parte das vezes, cansados da política, de maneira geral, enxergando nela apenas um trampolim para pessoas mal intencionadas ganharem dinheiro ou, quando muito, um instrumento inócuo para a transformação de suas vidas.
Poucas vezes, contudo, damos a devida importância para as eleições municipais, cuja relevância transcende a mera disputa entre os melhores nomes para os cargos de prefeito e vereador. Ainda que não tenham o mesmo glamour das disputas para os governos e legislativos estaduais e nacional, as eleições municipais talvez sejam ainda mais importantes, pois é justamente nelas que a discussão acerca de questões mais concretas e palpáveis se fazem mais presentes. Apesar de vivermos em um país e em um estado, vivemos concretamente nossas vidas nas cidades. Valemo-nos da estrutura das nossas cidades para nos locomovermos, para acessarmos o sistema de saúde, para irmos à escola, à universidade e aos espaços religiosos, para desfrutarmos dos nossos momentos de lazer. Daí a importância das eleições municipais, na medida em que elas nos permitem um exercício de discussão e imaginação sobre a cidade em que vivemos e desejamos, sobre suas qualidades, defeitos e possibilidades.
A cidade, poderíamos dizer, é o espaço concreto no qual buscamos a nossa felicidade. Ainda que a ideia de felicidade pareça abstrata e distante da realidade, este não é o caso. A noção de felicidade vem assumindo cada vez maior importância, levando, inclusive, ao desenvolvimento, por parte de alguns especialistas, de um índice capaz de medir aquilo que denominaram de "Felicidade Interna Bruta" (FIB). Este índice substituiria o Produto Interno Bruto (PIB) na medição do desenvolvimento de um determinado país, haja vista que este, de acordo com seus críticos, por estar focado excessivamente em variáveis econômicas, não daria conta de abarcar os verdadeiros fatores que podem conduzir a uma vida feliz, como, por exemplo, ter tempo para o lazer, desfrutar de boa educação, possuir saúde, ter acesso a meios de transporte de qualidade e viver em locais com o meio ambiente preservado. Os critérios do FIB seriam muito mais interessantes para julgar se um país possui pessoas que vivem bem do que aqueles fornecidos pelo PIB, focado somente em aspectos econômicos.
Conectando este debate sobre a "Felicidade Interna Bruta" com o tema das eleições municipais, seria interessante que pensássemos e cobrássemos dos candidatos uma postura sobre quais as medidas poderiam ser tomadas para adequar as cidades de modo a que estas sejam espaços para os cidadãos desfrutarem de uma vida feliz. Obviamente que a questão econômica importa e muito, sendo ela, em muitos casos, a garantia de recursos para os investimentos necessários capazes de possibilitar uma vida feliz. Contudo, para além dos recursos, temos que ter claras quais são as ações que poderão proporcionar uma melhoria da qualidade de vida e do bem-estar do cidadão comum.
Pauta dos candidatos
Penso que, dentre tantos temas, dois poderiam figurar com especial atenção na pauta dos candidatos, na medida em que eles ampliam as possibilidades de uma vida feliz na cidade. Em primeiro lugar, fazem-se necessárias propostas consistentes sobre como melhorar o trânsito de uma cidade como Juiz de Fora. A questão do trânsito é fundamental, pois a ela está ligado o tema da locomoção e do tempo que as pessoas despendem para irem e retornarem de suas casas até o trabalho. Quanto menos tempo no trânsito, maior será o tempo disponível para o lazer, para participar da vida associativa e para estar na companhia de amigos e familiares. O debate em torno do trânsito também permite conectar com aquele em torno do meio ambiente e da saúde. Uma cidade com menos carros, com transporte público acessível, barato e de boa qualidade, bem como com ciclovias espalhadas por diversas regiões, reduz sobremaneira os riscos de poluição e aumenta o bem-estar das pessoas, reduzindo o estresse causado pelos enormes engarrafamentos.
Além da questão do trânsito, outro tema que abre possibilidade para conexões com o debate sobre a felicidade diz respeito à valorização dos espaços públicos da cidade. Uma cidade que se quer feliz deve proporcionar aos seus cidadãos praças e parques seguros, com acesso gratuito e com muitas árvores, providos de equipamentos para a prática de exercícios, para alimentação e para o lazer das crianças e adolescentes. Uma cidade feliz é uma cidade pública, pois é nos espaços públicos que os cidadãos podem aprender a desfrutar da experiência de viver coletivamente e respeitar as diferenças em um espaço compartilhado.
Estas questões – melhoria do trânsito e valorização dos espaços públicos – são apenas duas dentre tantas outras às quais os pretendentes aos cargos eletivos poderiam se dedicar a responder e oferecer soluções factíveis. Após as eleições, cabe-nos fiscalizar e cobrar para que as propostas apresentadas sejam, de fato, concretizadas.
Fernando Perlatto é professor do Departamento de Ciências Sociais da UFJF, doutorando no Instituto de Estudos Sociais e Políticos (IESP-UERJ) e pesquisador visitante no Institute for Public Knowledge da New York University (NYU).
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