A Internet e as novas perspectivas da cibercultura
Luciana Mendon?a
01/09/2000
Refer?ncia para a an?lise do momento atual, chamado, por diversos te?ricos, de p?s-modernidade, os estudos de Andr? Lemos sobre a cibercultura, desenvolvidos na Faculdade de Comunica??o da Universidade Federal da Bahia (www.facom.ufba.br), discutem as particularidades da cultura brasileira face ? cultura eletr?nica emergente.
Na ?ltima semana, Andr? Lemos esteve na Universidade Federal de Juiz de Fora, para uma palestra sobre seu trabalho, quando conversou com a reportagem do JFService.
- JFService: O professor coordena uma lista de discuss?o, via Internet,
chamada Cibercultura, que re?ne desde internautas e webmasters at? fan?ticos pela
multim?dia, hackers e cyberpunks. Conte um pouco da sua experi?ncia nesse
ambiente.
Lemos: A Cibercultura foi criada em 1996, dentro de um projeto de pesquisa sobre a cibercultura no Brasil, para ter contato com pessoas que tivessem afinidade com o tema. Acho que hoje a lista ? um dos f?runs mais interessantes de discuss?o sobre isso no Brasil. Quase 300 pessoas est?o inscritas. ? um meio de aprendizado muito grande. ? um lugar onde voc? pode exercitar uma coisa coletiva, em que as pessoas podem colaborar entre si, com o que sabem. - JFService: Como voc? analisa o momento atual, em que temos a iminente
converg?ncia dos meios de comunica??o?
Lemos: A converg?ncia ? o que est? acontecendo hoje no mundo. Grandes fus?es, de grandes empresas, acontecem a partir da converg?ncia da inform?tica com as telecomunica?es.Fazendo um pouco de futurologismo, acho que estamos caminhando para uma interface zero, com o desaparecimento do computador. Se o computador est? em tudo quanto ? lugar, ent?o ele sumiu. A gente j? tem celular que d? acesso ? Internet com WAP, rel?gio que toca MP3, etc. A converg?ncia vai fazer com que a inform?tica se dissemine em todos os objetos. Caminhamos para o desaparecimento do hardware ?nico, em fun??o do fluxo da informa??o. A pr?pria evolu??o do computador mostra isso: era uma grande m?quina de calcular, passou a ser uma m?quina pessoal e agora ? uma m?quina convivial, em que as pessoas trocam informa??o, conversam entre si. A interface vai ser cada vez menos percept?vel. - JFService: E como voc? pensa a evolu??o da Internet, com rela??o ?
linguagem?
Lemos: A Internet hoje j? ? multimidi?tica. Cada vez teremos acesso de melhor qualidade, com a banda larga. Todos v?o usar, assim como usam ?gua, energia el?trica. A tend?ncia, com rela??o ? linguagem, ? a maior explora??o do som. J? temos uma cultura oral, mesmo sendo escrita, com o e-mail, em que as mensagens est?o muito pr?ximas da fala. - JFService: Um dos seus projetos na UFBA analisa o mundo cyborg (no endere?o
www.facom.ufba.br/pesq/cyber/lemos/cyborgs.php). Como voc? v? essa
fus?o homem-m?quina?
Lemos: Isso ? uma coisa ancestral; n?o come?ou agora. A cultura j? ? a artificializa??o da natureza e a cria??o de mecanismos para que a gente possa ter conforto. Essa fus?o do corpo com o artefato ? ancestral. Hoje, talvez, estejamos vivendo uma radicaliza??o disso, com nanom?quinas que podem entrar no corpo humano para limpar art?rias (e isso n?o ? fic??o cient?fica; j? existe), chip que pode permitir ao cego enxergar texturas, quando implantado no nervo ?tico, etc. Esse ? o caminho da humanidade. ? um pouco chocante, porque ?s vezes temos uma imagem meio monstruosa do cyborg, do rob?, mas acho que de alguma forma, somos todos cyborgs. Usamos pr?teses, roupas, ?culos, pr?teses dent?rias, ortop?dicas, vacinas. Tudo isso ? uma maneira artificial de modificar o corpo. Temos que ter cuidado com algumas derrapagens, mas eu encaro isso com uma vis?o n?o muito negativa das coisas, mas positiva tamb?m n?o ?. ? fruto do processo da pr?pria persegui??o da humanidade. - JFService: Voc? acredita que a rede tenha poderes de mudan?a social? Voc?
acha que a rede, por suas caracter?sticas, poderia nos ajudar a pensar uma
sociedade melhor?
Lemos: Temos uma estrutura tecnol?gica ?mpar na hist?ria da humanidade. Nunca antes havia sido dada a possibilidade de enviar informa??o para qualquer pessoa, sobre qualquer forma, e de forma imediata. Primeiramente, a Rede ? muito mais um fen?meno social do que t?cnico. ? um mecanismo cognitivo, uma forma de organizar e processar a informa??o que nos coloca no que o McLuhan (te?rico da comunica??o) falava sobre um meio simult?neo: a gente tem tudo ao mesmo tempo. A Rede permite a forma??o de agrega?es, em que as pessoas batem papo, podem criar movimentos sociais. Existe essa possibilidade. Contudo, no que eu n?o acredito muito - e ? uma vis?o pessoal - ? na pr?pria humanidade. O meio est? a?, mas dizer que, por isso, as pessoas v?o fazer coisas coletivas, v?o passar a gostar mais umas das outras, v?o fazer mobiliza?es, etc, eu tenho minhas d?vidas. O que o meio permite ? essa forma de contato social intenso. A Rede para mim ? um vetor de sociabilidade muito forte, mas da? a dizer que ele vai melhorar a vida, n?o sei. J? n?o arriscaria dizer isso n?o. - JFService: Com o portal JFService, os juizforanos internautas convivem com
uma conex?o entre o global e o local. O projeto procura valorizar as
identidades culturais locais, mas est? na Rede, que ? global. Como voc?
avalia projetos como esse?
Lemos: Acho que a tend?ncia da Rede ? essa. A Rede n?o ? o global entrando no local, destruindo o local, como muitos dizem. N?o existe isso. Acho que a influ?ncia das culturas ? uma coisa positiva. Quando voc? se fecha muito na sua cultura, isso pode virar um movimento xen?fobo, nazista, etc. O fechamento ? que ? perigoso. Acho tamb?m que o local deve preservar suas caracter?sticas, para se desenvolver no global. O que a Internet est? permitindo ? justamente a valoriza??o do local, com uma visibilidade planet?ria. ? uma rela??o interessante.
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