Vida a dois
A pílula contra a impotência masculina abre novos horizontes para os relacionamentos estáveis, mas também pode abalar alguns
O uso do Viagra, pílula contra a impotência sexual, ainda está em fase inicial, e afirmar qualquer tendência de comportamento seria precipitado. Mas provavelmente muitos relacionamentos estabilizados há anos terão que ser revistos. E o sexo, assunto que poderia estar enterrado para muitos casais, poderá ressurgir colocando relações em xeque. Os homens estão maravilhados com a possibilidade de vencer um dos seus maiores medos: a impotência. Mas e as mulheres, como ficam nessa nova realidade? As emoções femininas poderão se dividir entre o medo, de ser traída ou trocada, e a alegria de uma redescoberta da vida sexual.
Nos Estados Unidos houve o caso extremo de Roberta Burke, 63 anos, que está processando a Pfizer, empresa que lançou o Viagra, porque seu marido de 70 anos a trocou por outra mulher, dois dias após ter experimentado a pílula contra impotência. "Esse foi um caso específico e não significa que o mesmo vá acontecer com todos os casais. As mulheres não devem ter medo do Viagra, mas sim das más relações", afirma a psicóloga especialista em terapia de casais, Lia Carvalho. "O casal poderá ficar mais unido com o uso do Viagra, pois estarão vivendo uma nova experiência juntos, crescendo juntos", diz.
Mudanças - Se separações ocorrerem, será porque as relações não eram tão estáveis assim. Essa é a opinião de sexólogos e terapeutas de família, que vêem no Viagra uma possibilidade de mudança no ideal masculino e nos comportamentos sexuais. "As mulheres ficarão mais exigentes. Afinal, ereção não significa necessariamente uma boa relação sexual. A impotência não um vilão nas relações amorosas, que podem ser baseadas em sentimentos diversos, e o Viagra não é a solução para todos os problemas sexuais", afirma Lia.
Homens mais velhos trocarem suas esposas por meninas mais novas não é novidade. "Isso sempre aconteceu, com ou sem Viagra", afirma o presidente da Sociedade Brasileira de Sexologia, Isaac Charan. "Alguns homens ficam com mulheres mais novas porque as próprias esposas não queriam mais ter relações sexuais. As mulheres mais velhas não vão perder seus maridos por culpa do Viagra. Esse remédio abre um novo caminho para o casal. E algumas pessoas vão perceber que a ereção não é o mais importante na relação", afirma o psicólogo e médico em sexologia, Arnaldo Risman, que dá aula na Universidade Aberta da Terceira Idade (Unati), que funciona na Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj).
A sexóloga Regina Navarro Lins, que assina no JB a coluna dominical Conversa na varanda, compartilha a idéia de que, se uma relação acaba quando o homem toma Viagra e tem bons resultados, é porque ela não era tão boa assim. "Já ouvi mulheres dizerem que sentiram alívio com a chegada da impotência do marido. Elas agora terão que questionar a relação. O Viagra vai mexer em casamentos estabelecidos há anos e os parceiros terão que conversar sobre um assunto que havia sido deixado de lado", diz.
Segundo Regina, só o fato de saber que pode recorrer ao Viagra deixará o homem mais relaxado, melhorando seu desempenho sexual. "Arrisco até dizer que, em alguns casos, o homem nem vai precisar tomar o remédio, basta saber que ele está a mão."
Mas ao mesmo tempo que muitas mulheres poderão ficar assustadas ao verem seus maridos sexualmente ativos, outras ficarão satisfeitas e felizes em poder viver uma nova fase. Até porque muitas se sentem culpadas quando seus parceiros não conseguem ter uma ereção. "Tive casos de mulheres que reclamaram quando o marido decidiu procurar algum tratamento contra impotência, mas esse grupo é minoria. A maioria das mulheres gosta da idéia de combater a impotência e acompanha o ritmo de seus parceiros. Além disso, ficam contentes de estarem provocando novamente o desejo sexual do marido", afirma Isaac Charan.
A dois - "A vida sexual é muito importante, e todas as tentativas para mantê-la acesa são válidas. O resultado da experiência vai depender de cada casal", afirma a professora aposentada Alda Santos, 53 anos. Alda freqüenta o Centro de Atualização da Mulher (CAM) e diz que, quando for a hora, ela e o marido vão decidir juntos se devem optar ou não pelo Viagra. "É bom que a mulher participe da decisão de tomar o remédio, podendo até estar presente na consulta médica do marido para poder tirar suas dúvidas", afirma Isaac Charan.
O diretor da Unati, Renato Veras, que está escrevendo com Arnaldo Risman um livro sobre a sexualidade na terceira idade, acredita que o Viagra fará parte de um movimento que acompanha o aumento da expectativa de vida. "Esse remédio faz parte de um processo histórico natural. A atividade sexual cresceu como a expectativa de vida. O espanto é porque o remédio ainda não faz parte do dia-a-dia da população. O Viagra faz parte de um processo de extensão da vida", afirma. Da mesma forma que antes as mulheres tinham que casar antes dos 20, se não já eram consideradas velhas demais, e se adaptaram a uma nova realidade, elas saberão, segundo Renato, acompanhar o crescimento da vida sexual ativa dos homens.
"As mulheres são capazes e têm informação suficiente para acompanhar o ritmo sexual de seus parceiros, independente da idade. Não é difícil para elas retomar sua sexualidade, basta querer", afirma uma das diretoras do CAM, Ana Maria Medrado Dias. "A chegada do Viagra é um estímulo também para as mulheres que tinham deixado o sexo adormecido. Mas tudo vai depender da estabilidade do casal", afirma a terapeuta de família Eloisa Vidal.
Fonte: JB Online, em http://www.jb.com.br/