Terminei o texto do m?s passado, prometendo tratar mais da rela??o m?sica e texto e, aqui, come?o algumas dessas reflex?es.
Os versos
cl?ssicos subentendiam uma m?sica e a escolha de um deles por si j? definia
o car?ter da m?sica. M?sica e poesia estavam intrinsecamente ligados,
indissoci?veis. A poesia ent?o era sempre cantada e acompanhada por certos
instrumentos como o aulo, a c?tara, a lira, a flauta ou outros, de acordo
com seu ethos, quer dizer, de acordo com o que essa pretendia provocar
espiritualmente. ? uma teoria complexa que n?o vem ao caso aqui explic?-la
em pormenores.
Essa hist?ria de dizer que m?sica e letra n?o combinam ? algo meio
complicado de se defender. Vamos entender porqu?. Podemos pensar em tr?s
possibilidades, a saber, um poeta que n?o ? compositor, um compositor que
n?o ? poeta e um compositor-poeta na mesma pessoa.
Comecemos pelo ?ltimo. Um compositor-poeta trabalha a m?sica e a poesia
juntos. Ele sabe o que quer dizer e como diz?-lo. Ele pode compor seu
discurso po?tico-musical sem ter que sacrificar um ou outro. Na m?sica
popular brasileira temos excelentes exemplos disso e o que me vem
imediatamente ? mem?ria ? Chico Buarque. Poesia e m?sica s?o um ?nico em sua
produ??o. Tomemos como exemplo sua can??o Peda?o de Mim, parte da ?pera do
Malandro. O angustioso in?cio com a repeti??o da nota F? 15 vezes, sobre
acordes quase mon?tonos cantando, ? peda?o de mim, ? metade afastada de mim
se desenrola em um discurso harm?nico e mel?dico fluidos a partir de leva os
teus sinais... ? l?rica pura, musical e po?tica.
Vamos agora para uma outra possibilidade, um compositor que n?o ? poeta.
Este quando recebe um poema para musicar, est? recebendo um discurso j?
pronto e se ? perito na sua arte n?o far? uma m?sica com um discurso avesso
ao texto, vai apenas evidenci?-lo. O contr?rio se aplica quando se tem a
m?sica e a ela quer se acrescentar um texto. J? h? um discurso pronto a ser
seguido. Quando as coisas nao combinam, um dos dois nao ? bom. ? bom lembrar que quando dizemos de uma l?ngua algo como ser musical ou n?o
falamos do nosso ponto de vista, a partir da nossa experi?ncia e de nossa
l?ngua. N?o sei se um noruegu?s acha sua l?ngua pouco musical,
principalmente quando canta uma can??o de ninar para seu filho dormir. A
mesma can??o que ouviu de sua m?e quando tamb?m crian?a e que lhe ficou como
a melodia mais doce que jamais ouviu. Boas can?es de ninar!