Catorze passos da via sacra superando a violência

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Catorze passos da via sacra superando a viol?ncia

Catorze passos da via sacra superando a violência

 Dom Gil 23/03/2018

Celebrando a Campanha da Fraternidade do corrente ano, cujo tema é “Fraternidade e superação da violência”, com o lema “Vós Sois todos irmãos” (Mt 23,8), proponho seguirmos os passos de Jesus no caminho do Calvário do seguinte modo:

1ª Estação: Jesus é condenado à morte. Pilatos lava suas mãos.
A corrupção política que o Brasil e outros países vivem é assustadora. Não se pode mais confiar nem na esquerda, nem no centro e nem na direita. Da mesma forma que o inocente Jesus ficou sem chão, sem ter onde recorrer, mesmo sendo inocente, nosso povo se encontra à deriva. Está, como Cristo, de mãos atadas, sem voz e sem vez.

2ª Estação: Jesus recebe a cruz. Terá que carregar seu patíbulo como se fosse um criminoso.
Pesada cruz pesa sobre nós com ideologias políticas destruidoras das forças morais e sociais. Na Venezuela, o povo que, até há pouco, vivia de forma confortável em geral, hoje não tem comida, nem remédio, nem casa nem nada do necessário. Só tem o direito de pôr sua pesada cruz às costas e pôr-se a caminho na fé e na esperança, migrando para países vizinhos.

3ª Estação: Jesus cai pela primeira vez.
O hediondo crime do tráfego de drogas derruba no abismo da destruição moral e física grande parte dos jovens, com consequências drásticas nas famílias. Estão no chão. Com a cara no chão. Com o corpo cada vez mais debilitado caído por terra. O peso da iniquidade dos produtores de cocaína, crack, êxtase, maconha e outros narcóticos derruba por terra quem já se cansou da vida.

4ª Estação: Jesus encontra sua mãe. Seu olhar materno e seu rosto em lágrimas, o comovem e o auxiliam a prosseguir a via do calvário.
Quantas famílias estão desamparadas? Quantos jovens precisam ser reerguidos pelo amor materno? Assim como os guardas naturalmente queriam afastar Maria, muitas seitas proselitistas, muitas ideologias falaciosas, como a Ideologia de Gênero, funcionam hoje como ações destruidoras dos valores inalienáveis da família, menosprezadoras da dignidade própria das mães. Obrigado, Senhor, pela presença de minha mãe, Maria Teresa, no meu caminhar vocacional, sem interferir, mas sempre orando na força da esperança.

5ª Estação: Simão Cirineu ajuda Jesus a carregar a cruz.
Neste mundo de indiferentes, de individualistas, de ganância e de egoísmo, a figura do Cirineu nos ajuda a vencer a violência branca do descuido dos irmãos, da falta de sensibilidade para com os que sofrem. É necessário criar a cultura da solidariedade, da cordialidade, da capacidade de ajudar o irmão que padece fome, sede ou que esteja desempregado. Deus nos liberte do comodismo.

6ª Estação: Verônica enxuga o rosto de Cristo.
O mundo de hoje tem que pedir perdão pelo ausentíssimo de socorro nos momentos difíceis dos vizinhos, e dos que estão longe. Para ver o rosto de Cristo estampado em nossa toalha, é necessário que antes nos disponhamos a oferecer de nossos panos para enxugar o suor e as lágrimas dos irmãos sofredores, por exemplo, nos corredores superlotados de nossos hospitais.

7ª Estação:  Segunda queda de Jesus.
Vendo o Senhor da bondade e da esperança, das dores e das angústias prostrado ao chão, não deixemos de visualizar tantas pessoas caídas nas prisões superlotadas, inóspitas e desumanas.

8ª Estação: Jesus consola as filhas de Jerusalém. “Não choreis sobre mim. Chorai sobre vós mesmos e sobre vossos filhos”.
Não há como não recordar, nesta estação, da violência do aborto. Quantos abortos clandestinos ou não acontecem todos os dias em nosso país! A desculpa da clandestinidade não pode ser argumento para a legalização do assassinato de crianças indefesas ainda no ventre de suas mães. Seria perigoso usar deste critério simplista e cruel, pois poderia justificar a prática de outros crimes nas caladas da noite, no oculto das estratégias, no anonimato das espertezas, na ineficácia da lei. As lágrimas das mães que perdem seus filhos não podem ser secadas pelo incompreensível lobby abortista. A vida é sagrada. A vocação da mulher para a maternidade não é uma simples e fria ação reprodutora.

9ª Estação: Jesus cai pela terceira vez.
Mais uma queda! Quase dá para desistir. Quantas vezes se cai na violência das palavras, por descontrole, ou na violência da própria consciência por força do hábito ou outros motivos psicológicos ou situações quase inexplicáveis. A repetição das quedas é terrível. Mesmo quando não se quer cair, quando se pensa que não mais cairá, quando se tomou todas as precauções para não tombar, mesmo quando se buscou os meios naturais e sobrenaturais para se evitar a queda, ela, às vezes, acontece. Quanta dor! Quanto sofrimento! Cristo com o rosto ensanguentado, com o ombro já ferido pelo peso da cruz, com os olhos ensopados de suor, sangue e lágrimas, olha, contudo, meigamente, para o alto. Não perdeu a esperança. No caminho da superação da violência, é preciso ser forte e deixar-se robustecer pela confiança no Pai, pois é misericórdia. São Paulo ensinou aos Coríntios: “Pois em Cristo, Deus estava reconciliando o mundo consigo, não levando em conta as faltas das pessoas e pondo em nós a palavra da reconciliação. Somos embaixadores de Cristo e é como se Deus exortasse por meio de nós. Em nome de Cristo, pedimos: reconciliai-vos com Deus” (2 Cor 5, 19-21). Levantemo-nos do chão da violência, recomeçando, humildemente, o caminho da paz com Deus, com o próximo e conosco mesmo, sem nunca desistir.

10ª Estação: Jesus é despojado de suas vestes.
A violência que provoca vergonha, acanhamento e humilhação é tão cruel ou pior que a física. É martírio moral. Deixar nua uma pessoa diante de sua mãe, de seus parentes, de seus amigos e de desconhecidos é violentar de forma terrível a dignidade dos seres humanos e desprezá-los como lixo. As calúnias, as difamações, as injúrias praticadas às escondidas, através de cartas anônimas, através de Fake News e outros meios sórdidos são formas de matar pessoas.

11ª Estação: Jesus é pregado na cruz.
Quantas pessoas são pregadas violentamente nas cruzes de hoje em dia! Recordemo-nos dos corredores dos hospitais cheios de macas, camas e cadeiras como se fossem enfermarias. A falta de medicamentos, de assistência médica, de socorros, de políticas públicas para gente que paga impostos e estão sujeitas a morrer sem a assistência necessária! Recordemo-nos dos que estão pregados na cruz pela violência das facções criminosas, pessoas executadas com requinte de crueldade inadmissível como o chamado “micro-ondas” das favelas do Rio, São Paulo e outros lugares, que consiste em ajuntar pneus como um túnel, prendendo rivais dentro e ateando fogo. Pensemos em tantas cruzes ocultas no tráfico de drogas que causam morte física e moral de tantos seres humanos e destroem famílias inteiras.

12ª Estação: Jesus morre na cruz.
A morte ignominiosa é o resultado cruel da violência estabelecida. É o gosto do sádico e a pseudovitória do vingativo, o riso do maligno, o desejo do insensível, a aparente derrota do amor e do perdão. “Tudo está consumado” (Jo 19,30), exclama o Mestre. “Em tuas mãos entrego o meu espírito!” (Lc 23, 46). Na morte de Cristo estampa-se a intolerância religiosa de Anás e Caifás, a corrupção política e a irresponsabilidade social de Pilatos e de Herodes.  Estas são formas de violência que resultam na destruição de pessoas e de povos.

Como não nos lembrarmos dos mártires de hoje, sobretudo os cristãos trucidados pela intolerância religiosa do Estado Islâmico? Dos mártires vítimas de leis antirreligiosas que, em nome do Estado Laico, desejam na verdade eliminar a fé e o direito das pessoas de serem fiéis à sua opção religiosa e à sua consciência. O Estado deve ser laico, mas nunca laicista. O ateu escreveu: “A religião é engano de que tem medo do escuro”; ao que o fiel respondeu: “O ateísmo é o engano de quem tem medo da luz”.

13ª Estação: Jesus é descido da cruz.
O corpo físico com as marcas da terrível violência é despregado do madeiro e entregue às pessoas que assistiram o mais terrível e cruel dos suplícios. Não seria racional que imaginássemos a ausência da mãe neste momento, já que os santos evangelhos narram a sua presença (cf. Jo 19, 25). Ao receber o corpo frio de seu filho, ela o abraça em lágrimas e transpassada pela espada de dor profetizada por Simeão (cf. Lc 2, 35). Entre todos os que o conheciam, alguém não falhou na solidariedade e no amor! As mães, em geral, não falham. Muito menos as que tem Deus no coração e na vida.

Para a violência há remédio. O mal não vencerá. Ainda que tudo pareça trevas, para quem crê, um lume fica aceso ao final do túnel. “Eis aqui a Serva do Senhor, cumpra-se em mim a tua vontade” (Lc 1, 38).

14ª Estação: Jesus é sepultado.
A sepultura é o silêncio da ação violenta.  Embora há requintes de crueldade quando se assassina e se desrespeite ainda o corpo do morto, a sepultura é o fim não para a vítima, mas para o violento ganancioso, sedento de sangue e de morte. Oferecer sepultamento digno para os mortos é um ato de fé e um protesto contra toda atitude que provoque a morte não natural, um clamor sobretudo contra a violência praticada. É ato de caridade rezar pelos que não têm a dignidade dos velórios e dos ritos cristãos das exéquias; dos que são depositados em valas comuns por não terem onde caírem mortos. É ato de solidariedade humana respeitar os corpos dos falecidos.

15ª Estação: Jesus Ressuscita.
Vitória! Alegria! Paz! A violência foi vencida, o rancor derrotado, a morte perdeu sua força. O alívio penetrou o coração daquele que creu e não se desesperou. “Se o grão de trigo que cai na terra não morre, será apenas uma semente, mas, se morre, brotará e produzirá frutos” (Jo 12, 24). Isto garante a força bendita da vida que continua. Fomos criados para a vida eterna. A morte de Cristo nos purificou e podemos respirar seguros e tranquilos. A sepultura para quem crê em Cristo é como Sacrário que encerra as hóstias consagradas, mas que se abre de par em par para alimentar com o Corpo Eucarístico de Cristo, o coração do caminheiro da fé, da esperança e do amor.

Vale a pena construir a cultura da paz, da concórdia, do perdão, da ternura, da fraternidade. Assim será o futuro no lar de Deus, pois, se com Cristo morremos, com Cristo ressuscitaremos para a vida eterna. Amém.

Deus lhe conceda viver santamente esta semana e lhe proporcione uma feliz Páscoa! Somos todos irmãos na busca da superação da violência, a caminho do céu que Deus nos dará.