'Caminhoneiro não tem tempo nem para almoçar, quanto mais para fazer greve', diz liderança
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Representantes de caminhoneiros autônomos dizem que a categoria não aderiu à "greve geral" que estava sendo convocada por bolsonaristas para esta segunda-feira (7) e afirmam que o fluxo nas rodovias ao longo do dia foi normal, sem bloqueios ou manifestações que atrapalhassem as entregas.
Daniel Reis de Paula, conhecido como Queixada, é presidente da associação de caminhoneiros em Oliveira (MG) e diz não ter tomado conhecimento de nenhum movimento de paralisação ou greve. "Estou em Belo Horizonte e, pelo menos aqui, não está tendo nada", afirmou no começo da noite desta segunda.
Segundo ele, os caminhoneiros autônomos não estão envolvidos nos atos antidemocráticos realizados por apoiadores do presidente Jair Bolsonaro (PL) que ocuparam rodovias em diversos estados do Brasil em protesto contra a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no segundo turno das eleições.
"Quem está fazendo greve são grandes empresários, inclusive do ramo de transporte", diz. "Autônomo não está tendo tempo nem de parar para almoçar, quanto mais para fazer greve", diz.
Os atos antidemocráticos vêm perdendo força desde o fim da última semana, mas ainda há registros de bloqueios pontuais pelo país. Na noite desta segunda-feira, havia obstruções em rodovias federais de quatro estados: Rondônia, Mato Grosso, Pará e Paraná.
Já a greve geral convocada por bolsonaristas teve paralisações localizadas no Sul e Centro-Oeste do país, além de fake news sobre empresa que teria aderido e uso de vídeos de atos de 7 de Setembro. Um convite para o movimento com ares de locaute (greve de empresas, hoje proibida pela legislação) circulou em redes sociais e nos grupos de WhatsApp e de Telegram, pedindo a adesão de empresários.
"Feche sua empresa, indústria, fábrica e comércio e vamos lutar contra a instalação do comunismo", dizia a convocação distribuída na última sexta (4).
Carlos Alberto Litti Dahmer, diretor da CNTTL (Confederação Nacional dos Trabalhadores em Transporte e Logística), disse não ter ficado sabendo de movimentos de paralisação. Assim como Queixada, ele ressalta que não há envolvimento de caminhoneiros autônomos nos recentes atos antidemocráticos.
"Dentro da categoria dos caminhoneiros, foram as grandes empresas que estiveram presentes [nos atos iniciados após o resultado das eleições presidenciais]. Transportadoras e grandes empresários. O caminhoneiro autônomo que estava nas rodovias ficou preso [nos bloqueios]", afirma.
Na visão dele, os movimentos antidemocráticos não são pauta de uma categoria econômica, mas de cidadãos que não aceitam o resultado do pleito. "Tendo acabado a eleição e determinado candidato ganhado a maioria dos votos, tem que aceitar. Isso se chama democracia", diz.
Plínio Dias, presidente do CNTRC (Conselho Nacional do Transporte Rodoviário de Cargas), também diz não saber sobre lideranças da categoria que estejam participando dos bloqueios ou da greve geral. "No dia de hoje [segunda], que era para fechar tudo, não vi nenhuma manifestação de caminhoneiro. Eu saí com meu caminhão de Curitiba, fui até Paranaguá [ambos no PR], carreguei o caminhão e estou chegando de volta. Não vi nada de manifestação", comenta.
Relato semelhante é feito por Marcelo da Paz, caminhoneiro que atua na região do Porto de Santos (SP). Segundo ele, houve motorista que saiu de Santos nesta segunda, atravessou o estado de São Paulo até chegar em Mato Grosso, e já está retornando sem relatos de intervenções nas pistas.
Ele destaca que a categoria não tem nenhum envolvimento com os bloqueios nas rodovia, tampouco compactua com manifestações antidemocráticas. "Nosso entendimento é de que o voto do povo é soberano", diz. "Respeitamos a democracia, o presidente Lula ganhou porque teve o maior número de votos."
Os atos contra a democracia tiveram início porque bolsonaristas não aceitam o resultado das eleições que deram vitória a Lula e pedem uma intervenção militar. Na noite da última quarta (2), Bolsonaro publicou um vídeo em suas redes sociais em que pede a seus apoiadores para liberarem as rodovias que estão obstruídas.
"Quero fazer um apelo a você: desobstrua as rodovias, isso daí não faz parte, no meu entender, dessas manifestações legítimas. Não vamos perder, nós aqui, essa nossa legitimidade", afirma. "Proteste de outra forma, em outros locais, que isso é muito bem-vindo, faz parte da nossa democracia."
A ação de bolsonaristas provocou transtornos por todo o país e chegou a trazer desabastecimento de produtos --especialmente alimentos-- em algumas localidades.