Responsabilidades fiscal e social andam juntas, diz Persio, cotado para Fazenda de Lula

Por IGOR GIELOW

NOVA YORK, EUA (FOLHAPRESS) - O economista Persio Arida, um dos pais do Plano Real e integrante da equipe de transição de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), afirmou nesta terça (15) que "responsabilidades fiscal e social andam juntas, não são opostas".

Arida respondia a perguntas após palestra durante uma conferência realizada em Nova York pelo Lide, grupo empresarial fundado pelo ex-governador paulista João Doria.

Ele foi questionado acerca do debate iniciado por Lula no discurso em que opôs a ideia de prioridade social à responsabilidade fiscal, que gerou alarido no mercado financeiro. "Políticas sociais sem responsabilidade fiscal geram uma crise econômica que acaba por inviabilizá-las. Temos exemplos opostos também", afirmou.

"Se você avançar num front e não no outro, mais cedo ou mais tarde não conseguirá fazer nenhuma avanço", disse, limitando sua resposta por questões de sigilo impostas aos integrantes da equipe de transição. "Devemos ambicionar um crescimento maior, mas a inclusão social depende da educação. No curto prazo, no entanto, temos de atender essa massa marginalizada, que está passando fome", disse.

Ele vê um cenário adverso para o ano que vem, com a queda do crescimento americano e as dificuldades chinesas. Arida, cotado para algum posto de destaque no equipe econômica do novo governo, fez uma defesa de três pontos de reforma.

"Primeiro, abertura e integração ao mundo. O Brasil tem uma economia fechada. Veja o caso do Chile, a vantagem de crescer com uma economia aberta. Temos de firmar o acordo Mercosul-União Europeia, entrar na OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico), nos integrarmos ao máximo à economia mundial", afirmou.

Também defendeu a reforma do Estado, passando pela administrativa, com unificação de carreiras e bônus de estímulo a servidores públicos com bom desempenho. "É necessário revisar os gastos. Vemos camadas e camadas de gastos que perderam o sentido", afirmou.

Por fim, voltou a defender a reforma tributária, prevendo que seja possível "avançar nas duas PECs do IVA", as propostas de unificação de impostos federais e estaduais. "É factível conseguir isso em seis ou oito meses", afirmou.

Também presente, o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, fez uma defesa do primeiro item como vital para garantir o segundo.

"Temos de mostrar disciplina fiscal. Existe um ponto de inflexão em que apoiar os mais necessitados coloca em risco a estabilidade", afirmou. "Precisamos de um conjunto de políticas que olhe o social, mas que atraia investimento."

Em sua fala, Campos Neto previu um crescimento menor no ano que vem, dada a desaceleração mundial puxada pelos Estados Unidos. "Mas o Brasil é um sério candidato a ser beneficiado pela nova realidade global. Tem energia renovável em quantidade grande. Devemos evitar o aumento de impostos", afirmou.

O ex-ministro da Fazenda Henrique Meirelles, que foi presidente do Banco Central durante os oito anos do governo Lula, disse que é possível "crescer mais e melhor" com responsabilidade fiscal, mas levando em conta a realidade.

"É irrealista achar que o governo novo vai dizer para a família que ganha R$ 600 de auxílio para receber menos. Aí temos um problema de orçamento, uma negociação complicada", disse Meirelles. Ele defendeu o "waiver", o gasto excepcional acima do teto. "A licença para gastar precisa ter limite", afirmou, afirmando que um caminho é o corte dos benefícios tributários.

Fez piada com a despesa na Empresa de Planejamento e Logística, criada no governo de Dilma Rousseff (PT) para implantar o trem-bala --que nunca se materializou. Também na mesa de debatedores, o ex-ministro da Fazenda de Dilma Joaquim Levy, hoje no Banco Safra, sorriu amarelo.

"A maior política social não é chamar um benefício de auxílio emergencial ou de Bolsa Família. A política social sustentável é a retomada do crescimento econômico, com geração de emprego e renda. Não há política social que se sustente, sem crescer em níveis elevados e por períodos prolongados. O setor bancário está convicto de que o Brasil deve e pode crescer a taxas mais promissoras", afirmou Isaac Sidney, presidente da Febraban (Federação Brasileira de Bancos).

"O Brasil investe cerca de 15% do seu PIB, muito menos que a maioria dos países emergentes e longe do que necessitamos para crescer. E qual a razão de ainda estarmos investindo pouco? Está no modelo. O investimento público se exauriu, colapsou. Temos de reconhecer que o novo modelo de investimentos a ser, incessantemente, perseguido deve buscar a liderança e o protagonismo do capital privado", disse.

Sidney defendeu também a responsabilidade fiscal, além de criticar indiretamente a balbúrdia política do governo de Jair Bolsonaro (PL). "O país precisa voltar a ter estabilidade", disse, elogiando o trabalho do BC na trajetória da inflação.

"Confiamos nas nossas instituições, que não fraquejaram. Muito menos deveríamos gastar nossa energia em discussões inúteis, polêmicas rasas e debates enviesados. O Brasil precisa de uma grande conjunção de forças, de um pacto, de debates de ideias, e não de retóricas, ataques e bravatas."

O empresário Rubens Ometto, do grupo Cosan, disse esperar previsibilidade do governo Lula. "Queremos que os nomes da economia sejam anunciados logo", disse. "É importante o governo não recorrer a soluções simples. O que aconteceu com o preço dos combustíveis [no governo Dilma] quase destruiu o mercado de etanol", afirmou, defendendo o seu negócio principal -energia renovável.

"O Brasil pode gerar mais crédito de carbono no mundo e atingir as metas de emissão zero em 2050. O mercado internacional ainda não paga o sequestro de carbono [da floresta amazônica] no Brasil como paga na Europa", afirmou.

O jornalista Igor Gielow viaja a convite do Lide