Acionistas sinalizam aporte de R$ 7 bi na Americanas e reunião com bancos termina sem acordo

Por DANIELE MADUREIRA

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - A reunião dos bancos credores com a Americanas, na manhã desta quinta-feira (16) em São Paulo, terminou sem acordo. Antes mesmo das 11h da manhã, as instituições financeiras deram sinal negativo para as conversas, diante do impasse no valor a ser aportado pelos acionistas de referência -os bilionários Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Beto Sicupira.

Donos de 31% do capital da varejista, os fundadores da empresa de private equity 3G Capital sinalizaram que iriam aportar R$ 7 bilhões -R$ 1 bilhão a mais do que havia sido indicado por Sergio Rial, ex-presidente da Americanas, na reunião que conduziu com os bancos em 13 de janeiro, representando o trio de bilionários.

O valor, contudo, é considerado insuficiente pelos bancos para tapar o rombo contábil de R$ 20 bilhões nos balanços da Americanas, que entrou em recuperação judicial em 19 de janeiro com dívidas declaradas de R$ 43 bilhões. As instituições financeiras acreditam que um aporte de R$ 15 bilhões por parte do trio, que até o final de 2021 controlava a Americanas, seria suficiente.

Havia uma expectativa de avanço nas negociações desta quinta-feira, já que, pela primeira vez, um representante dos bilionários participaria da reunião -Roberto Thompson Motta, sócio do trio na empresa de private equity 3G Capital. Mas a única mudança foi um incremento de R$ 1 bilhão sobre a proposta trazida por Rial.

Além de próximo dos maiores acionistas, os quais conhece desde 1986, quando foi trabalhar no banco Garantia (que pertencia a Lemann), Thompson também teve posição relevante na Americanas, onde dava a última palavra na área financeira, e participou por décadas do conselho de administração e de comitês internos.

Segundo uma fonte que trabalhou próxima ao executivo nesta época, Thompson respondia por todas as operações que envolviam bancos -contratação, definição das taxas etc. Partiu dele o desenho das operações de risco sacado fechadas com os atuais bancos credores.

Também chamadas de "adiantamento a fornecedores", ou "forfait", uma prática comum no varejo, as operações de risco sacado estão no cerne do escândalo contábil da Americanas.

Para as instituições financeiras, não há dúvidas que houve fraude contábil para inflar os balanços da varejista e, consequentemente, o valor das ações da empresa -o que beneficiou diretamente acionistas e diretores cuja remuneração variável estava atrelada a ações, uma prática muito comum nas empresas administradas pelo trio de bilionários.

A maior dívida da varejista está nas mãos dos bancos privados. Os débitos com as instituições financeiras somam quase R$ 19,5 bilhões, sendo o Bradesco o maior credor (R$ 5,1 bilhões), seguido por Santander (R$ 3,6 bilhões), BTG (R$ 3,5 bilhões), Itaú Unibanco (R$ 2,7 bilhões) e Safra (R$ 2,5 bilhões). Também estão na lista os bancos públicos Banco do Brasil (R$ 1,6 bilhão) e Caixa (R$ 500 milhões).

Para que o plano de recuperação judicial seja apresentado à Justiça em 20 de março, a Americanas precisa entrar em acordo com os grandes credores, que se mostram extremamente insatisfeitos com as soluções "paliativas" que o trio de bilionários têm apresentado -como o financiamento DIP (do inglês debtor-in-possesion financing, ou "financiamento do devedor em posse"), aprovado pela Justiça no último dia 9, no valor de até R$ 2 bilhões.

Segundo uma fonte que acompanha a negociação, os bancos consideraram o valor proposto "risível", diante do montante da dívida. E também uma "aberração", uma vez que o DIP foi apresentado e diferido em segredo de justiça, sem que ninguém tivesse acesso às condições.

Para as instituições financeiras, da forma como foi proposto, o financiamento parece uma forma de os acionistas aportarem dinheiro às custas dos credores. Neste tipo de empréstimo, só concedido em recuperações judiciais, a empresa costuma dar garantia para atrair investidores. Mas, no caso da Americanas, foi proposta apenas uma remuneração de 128% do CDI, sem garantias.

Na visão dos bancos, os acionistas devem injetar capital na Americanas e não propor um empréstimo.

Por meio do DIP, a dívida bilionária que a varejista tem com os bancos pode ser transformada, por exemplo, em participação societária, a fim de aliviar o caixa da Americanas e permitir o cumprimento do plano de recuperação judicial sem grandes sobressaltos, informou uma fonte que acompanha a negociação.

Se os bancos não aprovarem o plano, o caminho que resta à Americanas é a falência -uma solução que não é boa para ninguém, incluindo as instituições financeiras.