BC cortar juro para se antecipar a crise externa pode dar errado, como em 2011, diz Itaú
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Os problemas no sistema bancário americano e a possibilidade de o banco central dos EUA suspender o processo de alta de juros por lá ainda não justificam um corte na taxa básica no Brasil. Essa é a avaliação do economista-chefe do Itaú Unibanco, Mario Mesquita.
Ele lembra que em 2011 o Banco Central do Brasil tentou se antecipar a um suposto problema no sistema financeiro na Europa e deu um cavalo de pau na política monetária: cortou os juros cerca de 45 dias após anunciar um aumento da taxa básica.
O resultado, no entanto, foi o aumento da inflação, o que fez com o BC tivesse de subir a taxa a níveis ainda mais elevados posteriormente.
"A gente ainda tem inflação elevada, expectativas bem distantes da meta. Cortar os juros agora no curto prazo seria arriscado, com bastante chance de dar errado. Quando em 2011 o Banco Central buscou se antecipar ao choque negativo colocando em segundo plano a meta de inflação, deu bastante errado", afirmou Mesquita.
Ele diz que uma parada no processo de alta de juros nos EUA, ou um aumento menor que o projetado anteriormente, não são suficientes para mudar o cenário da política monetária no Brasil, embora sejam fatores que devem entrar no modelo de projeção do BC, para avaliação do impacto para a inflação.
O Itaú avalia que o cenário mais provável é um aumento de 0,25 ponto percentual nos juros dos EUA na próxima semana, embora não esteja descartada a possibilidade de uma pausa no aperto monetário caso a crise bancária se mostre mais grave nos próximos dias. O banco projeta que a taxa passe do teto de 4,75% para 5,75% neste ano, sem cortes antes de 2024.
O cenário de crédito no Brasil também não justificaria um corte de juros por aqui neste momento. Mesquita disse não ver um cenário de crise de crédito aqui, mas uma desaceleração dos empréstimos normal em momentos de alta de juros. A inadimplência das pessoas físicas também dá sinais de melhora.
Somente se episódios recentes, como a crise da Lojas Americanas, intensificarem a desaceleração do crédito, pode haver alguma mudança na perspectiva para a inflação e para a política monetária. Em sua avaliação, isso é mais um risco do que algo concreto neste momento.
O economista fez uma avaliação positiva da gestão Fernando Haddad nestes quase 90 dias à frente do Ministério da Fazenda.
Disse que o ministro é muito aberto ao diálogo com a sociedade, teve uma vitória importante na discussão que resultou na reoneração parcial dos combustíveis e agora vai travar uma ofensiva de convencimento quando anunciar o novo arcabouço fiscal.
Afirmou, no entanto, que os clientes corporativos do banco estão com atitude de espera em relação a novos investimentos, enquanto não há definição sobre a mudança no teto de gastos em estudo e em relação à reforma tributária.
Mesquita diz esperar uma regra que permita o crescimento da despesa um pouco acima da inflação, mas que não irá frear a trajetória de crescimento da dívida pública, embora não veja um problema que leve a uma crise de fuga de capitais ou calote. "Não tem sintomas de que nosso problema fiscal crônico esteja virando agudo."