Comércio global desacelera, e inflação retrocede no mundo, diz FMI

Por THIAGO AMÂNCIO

Inflação

WASHINGTON, EUA (FOLHAPRESS) - Após dois anos de demanda elevada depois da pandemia da Covid-19, o volume do comércio global deve desacelerar de um crescimento de 5,1% em 2022 para 2,4% neste ano, segundo projeção do Fundo Monetário Internacional, com a valorização do dólar e o aumento das barreiras comerciais.

Em meio à Guerra da Ucrânia e às sanções impostas à Rússia, isso fará o comércio global ficar bem abaixo da média de 4,9% que o planeta viu entre os anos 2000 e 2019. É o que os economistas chamam de fragmentação geoeconômica, causada, além da guerra, pela disputa comercial entre Estados Unidos e China, com o chamado reshoring e friend-shoring, a reformulação das cadeias de produção em território nacional ou países aliados.

O resultado está no relatório "World Economic Outlook" (panorama econômico mundial), divulgado nesta terça pelo FMI, que mostra também a desaceleração da inflação mundial em meio a medidas de aperto monetário.

O estudo do órgão projeta que o planeta deve ver um crescimento econômico de 2,8% neste ano e 3% no ano que vem. Para o Brasil, as projeções são bem mais modestas, de 0,9% neste ano e 1,5% no próximo, abaixo da média de países emergentes.

"Um retorno da economia mundial ao ritmo de crescimento econômico que prevalecia antes dos choques de 2022 e da recente turbulência do setor financeiro é cada vez mais difícil", diz o relatório, que cita que muitas economias ainda estão absorvendo os choques da pandemia da Covid-19 e da Guerra da Ucrânia.

"O recente aperto nas condições financeiras globais também está dificultando a recuperação. Como resultado, é provável que muitas economias experimentem um crescimento mais lento da renda em 2023, em meio ao aumento do desemprego. Além disso, mesmo com os bancos centrais elevando as taxas de juros para reduzir a inflação, o caminho de volta à estabilidade de preços pode ser longo. No médio prazo, as perspectivas de crescimento agora parecem mais sombrias do que em décadas", resume.

O FMi prevê queda na inflação global, que foi de 8,7% em 2022 e deve retroceder a 7% em 2023, principalmente pela queda nos preços de energia e alimentos após atingirem picos no ano passado com o início da guerra. No ano que vem, a projeção é que caia ainda mais, para 4,9%.

Essa queda é puxada sobretudo pelas economias avançadas, que devem ter inflação de 4,3% neste ano e 2,6% no ano que vem. Entre os mercados emergentes e economias em desenvolvimento, a inflação em 2023 deve chegar a 8,6%, e cair para 6,5% no próximo ano.

No Brasil, a projeção é de aumento de 5% nos preços ao consumidor neste ano e 4,8% no ano que vem.

Cerca de três quartos das economias globais devem ter desinflação neste ano, segundo o banco, com "os esperados efeitos de arrefecimento do aperto monetário sobre a atividade econômica", diz o estudo.

Apesar do desaquecimento, a inflação permanecerá acima da meta dos países. Projeções para 72 economias com metas (34 economias avançadas e 38 grandes mercados emergentes e em desenvolvimento) apontam que o aumento dos preços será maior que o esperado em quase todas elas, com desvio médio de 3,3 pontos percentuais. No ano que vem, também será superior às metas em 91% dos casos, com desvio médio de 1 ponto, segundo projeções. Só em 2025 a inflação deve corresponder à meta na maioria dos casos.

A estimativa de inflação foi revisada para cima nos últimos dois trimestres, justifica o FMI, porque há sinais de demanda agregada mais forte do que o esperado, em meio ao mercado de trabalho ainda muito forte na maioria das economias avançadas. Com isso, a política monetária pode ter que permanecer mais tempo apertada do que o previsto antes, diz o órgão.

Enquanto o desemprego no Brasil deve permanecer na casa dos 8% em 2023 e 2024, em economias ricas como os EUA e Alemanha o índice será muito menor. Nos EUA, onde o país viveu baixas históricas no nível de desemprego em 2022, a taxa deve ser de 3,8% neste ano, e subir para 4,9% no ano que vem. Na Alemanha, a previsão é de 3,3%.

No entanto, para o economista Pierre-Olivier Gourinchas, economista-chefe do FMI, não deve haver espiral descontrolada de preços e salários porque os salários reais estão em queda, uma vez que os ganhos reais estão abaixo do aumento de preços.

Mais preocupante, argumenta ele, são os efeitos do aperto da política monetária no setor financeiro, "como repetidamente alertamos que poderia acontecer, a surpresa é que demorou tanto", citando que o rápido aperto da política monetária no ano passado provocou perdas consideráveis em ativos de renda fixa de longo prazo e elevou os custos de financiamento. Resultado concreto disso foi a falência do Silicon Valley Bank em março.

Segundo o relatório, diante do aumento dos custos e da necessidade de agir com mais prudência, os bancos devem reduzir empréstimos, o que provocará uma redução de 0,3% na produção deste ano.

Depois que a estabilidade financeira for contida, foco da política monetária deve ser reduzir a inflação, e um alívio nas condições monetárias antes da hora pode ter efeitos negativos, diz o documento.

FMI