Lula veta mudança no Sistema S e reduz imposto para setor aéreo

Por EDUARDO CUCOLO

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sancionou nesta terça-feira (30) a Lei 14.592/2023, que trata de benefícios a diversos setores, como entretenimento, combustíveis e empresas aéreas.

Seguindo acordo fechado com congressistas para aprovação do texto no Legislativo, o presidente vetou os artigos que previam a destinação de 5% da contribuição ao Sesc e ao Senac para a Embratur (Agência Brasileira de Promoção Internacional do Turismo).

Na mensagem de veto, Lula afirma que, "em que pese a boa intenção" da medida, ela "retira valores consideráveis do orçamento" do Sesc e do Senac "de forma imediata, o que pode acarretar em prejuízos para alguns serviços sociais relevantes prestados pelas entidades do Sistema S."

A possibilidade de destinação de recursos do Sistema S para a Embratur foi alvo de uma forte campanha contrária.

A lei sancionada tem como origem uma medida provisória editada no governo Jair Bolsonaro (PL), que incorpora também propostas enviadas pelo atual governo. O texto gera uma renúncia fiscal de R$ 4,3 bilhões ao ano para a União.

A nova lei prevê a manutenção do Perse (Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos) nos mesmos moldes adotados durante a pandemia por mais cinco anos -embora com mais restrições quanto aos setores que podem ser beneficiados.

A lista contempla hotéis, albergues, campings, pensões, serviços de alimentação para eventos e recepções, produtoras de filmes para publicidade, atividades de exibição cinematográfica, produção e promoção de eventos esportivos, em um total de 44 segmentos beneficiados.

Somente pessoas jurídicas que já exerciam essas atividades em 18 de março de 2022 poderão usufruir dos benefícios tributários previstos.

A lei também estende até o fim do ano a desoneração de PIS/Cofins (tributos federais) sobre diesel, biodiesel e gás de cozinha.

Estabelece ainda alíquota zero desses tributos para o setor de transporte aéreo para passageiros de 1º de janeiro de 2023 até 31 de dezembro de 2026. A medida deve representar uma redução de R$ 500 milhões nos custos da aviação civil brasileira, segundo o Ministério do Turismo.

O recolhimento dos mesmos tributos fica suspenso até 31 de dezembro de 2023 nas aquisições no mercado interno e nas importações de petróleo para produção de combustíveis.

A lei também incluiu a MP 1.159, que trata da exclusão do ICMS da base de cálculo de créditos do PIS/Cofins, e a reedição por 90 dias do programa especial de regularização tributária para Santas Casas.

Altera ainda a taxa de remuneração dos recursos do FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador) ao BNDES para financiamento à inovação e digitalização.

Em nota, a CNC (Confederação Nacional do Comércio) lembra que o governo havia se comprometido a vetar os artigos sobre o Sistema S para que a MP pudesse ser aprovada antes de perder seu prazo de validade.

O QUE É O SISTEMA S?

Conjunto de entidades gerenciadas por federações e confederações empresariais, segmentadas por tipo de setor econômico. São classificadas como privadas e não têm vínculo administrativo com o governo. Oferecem serviços de ensino, treinamento, pesquisa e lazer.

DE ONDE VEM O DINHEIRO?

Da contribuição compulsória das empresas, que é recolhida da folha de pagamento dos trabalhadores. Alguns serviços e atividades são pagos pelos usuários.

QUAIS AS ALÍQUOTAS DA CONTRIBUIÇÃO SOBRE A FOLHA?

Variam a depender do setor: 1% para Senai, Senat e Senac; 1,5% para Sesc, Sesi e Sest; 2,5% para Sescoop; de 0,3% a 0,6% para o Sebrae e de 0,2% a 2,5% para o Senar.

QUAL O VALOR ARRECADADO?

Em 2022, as contribuições para o Sistema S somaram R$ 27,3 bilhões, o equivalente a 1,2% da carga tributária federal e 0,28% do PIB.

COMO O DINHEIRO É REPARTIDO?

As contribuições são recolhidas pela Receita Federal, que repassa para as entidades.

QUAIS AS ENTIDADES QUE INTEGRAM O SISTEMA?

Sesi (Serviço Social da Indústria)

Senai (Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial)

Senac (Serviço Nacional de Aprendizagem do Comércio)

Sesc (Serviço Social do Comércio)

Senar (Serviço Nacional de Aprendizagem Rural)

Sescoop (Serviço Nacional de Aprendizagem do Cooperativismo)

Senat (Serviço Nacional de Aprendizagem do Transporte)

Sest (Serviço Social de Transporte)

Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas)

PARA ONDE VAI O DINHEIRO?

Os serviços sociais (Sesi/Sesc/Sest) desenvolvem atividades ligadas ao bem-estar e qualidade de vida aos trabalhadores, com centros destinados a esporte, cultura, saúde, alimentação e turismo, por exemplo.

Serviços de aprendizagem e apoio (Senai/Senac/Senat) oferecem cursos de qualificação (básica até pós-graduação) para trabalhadores desses setores, desenvolvem soluções de inovação e tecnologia para empresas e possuem programas de aceleração de startups, entre outras atividades.

Senar e Sescoop atuam nas duas funções (sociais e de aprendizagem).

O Sebrae é a única entidade que não está ligada a uma confederação e tem como objetivo auxiliar micro e pequenas empresas e microempreendedores individuais, por meio de cursos, consultoria, por exemplo.

COMO SURGIU O SISTEMA S?

Sesi, Senai, Senac e Sesc surgiram na década de 1940. A partir de 1990, o sistema ganharia mais cinco serviços autônomos.

O Senai foi criado por Getúlio Vargas em 1942 e é administrado pela CNI (Confederação Nacional da Indústria). Surgiu com a missão de organizar e administrar escolas de aprendizagem para os trabalhadores do setor.

Em 1946, foi criado o Senac, ligado ao setor de comércio, serviços e turismo. No mesmo ano vieram o Sesi e o Sesc, para executar medidas que contribuíssem para o bem-estar social dos trabalhadores dos dois setores.

O Sebrae surgiu na década de 1970, mas só entrou no sistema S como entidade autônoma do governo em 1990. As demais entidades surgiram no período 1991-2001.

QUAIS FORAM AS TENTATIVAS DE MUDANÇAS DO SISTEMA?

Diversos governos, entre eles Dilma Rousseff (2011-2016) e Jair Bolsonaro (2019-2022), já tentaram mexer na destinação dos recursos do Sistema S, mas fracassaram diante da pressão das lideranças empresariais, que barraram essas propostas no Congresso.

O ex-ministro da Economia Paulo Guedes, por exemplo, assumiu o cargo defendendo cortes em recursos para grupos de interesse, prometendo dar uma "facada" no Sistema S, mas não conseguiu fazer suas iniciativas prosperarem no Congresso.

Em 2019, Bolsonaro enquadrou as organizações nas regras da LAI (Lei de Acesso à Informação) e obrigou as entidades a detalhar gastos com salários e serviços.

Quando comandava o Ministério da Educação, em 2008, o atual ministro da Fazenda, Fernando Haddad, conseguiu fazer mudanças no sistema para ampliar a gratuidade e o número de vagas em cursos técnicos de formação inicial e continuada de quatro entidades.

Também já houve tentativas de limitar as remunerações das entidades ao teto do funcionalismo federal (R$ 41.650,92). No Sesi-SP, por exemplo, os valores divulgados chegam a R$ 62.143.

QUAIS SÃO AS CRÍTICAS?

O ex-senador Ataídes Oliveira (PSDB-TO) escreveu na década passada o livro "A Caixa Preta do Sistema S", com críticas ao modelo, como existência de cursos de valores elevados, sobra de recursos investidos no mercado financeiro, desvios cometidos por gestores e alta remuneração dos dirigentes, entre outras questões. Uma proposta de reforma elaborada pelo parlamentar também foi barrada no Congresso.

Em 2019, a Procuradoria-Geral da República cobrou transparência no uso do dinheiro repassado às entidades.

Líderes sindicais têm apresentado ao governo o pleito de aumentar a representatividade dos trabalhadores no Sistema S, para que eles participem da definição das estratégias das entidades, especialmente na área de formação profissional.