Convocar agora Lemann, Telles e Sicupira seria começar pelo fim, diz presidente da CPI da Americanas
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - Os próximos passos da CPI da Americanas são a convocação e a quebra de sigilo de ex-executivos da varejista. Uma eventual ida dos empresários Jorge Paulo Lemann, Marcel Herrmann Telles e Carlos Alberto Sicupira à comissão ficaria para um segundo momento.
Convocá-los agora seria "começar pelo fim", disse à Folha o presidente da comissão, o deputado federal Gustinho Ribeiro (Republicanos-SE).
"Nenhuma investigação pode começar pelo fim. Há uma certa ansiedade de alguns membros [da CPI], mas a gente tem procurado conduzir os trabalhos dessa CPI de forma muito serena, a nossa ideia não é tumultuar o ambiente de negócios", afirmou.
"Caso seja necessário, não teremos problema nenhum em convocar quem quer que seja, mas nesse momento a gente tem visto um sentimento majoritário de que não há necessidade agora da convocação [dos acionistas de referência]", acrescentou.
Por enquanto, a linha que seguirá norteando os trabalhos da CPI foi aquela apresentada pelo CEO da varejista, Leonardo Coelho, de atribuir as fraudes na companhia à antiga diretoria, com o possível conluio das empresas de auditoria.
Na sua fala na comissão, Coelho trouxe um relatório feito pela empresa com mensagens dos antigos executivos discutindo a fraude.
"O CEO da Americanas escancarou na verdade uma linha que precisa ser investigada, não tem como a gente fugir disso", apontou o presidente da CPI.
"Se o CEO da companhia afirma que foi praticada [uma fraude] pelos seus diretores é natural que a as investigações sigam nesse caminho, até porque essa afirmação foi pública."
A investigação incluirá também as mudanças patrimoniais dos ex-executivos da empresa. A Folha revelou que a ex-diretora Anna Christina Ramos Saicali transferiu para seu filho as quotas de uma empresa com patrimônio de R$ 13 milhões a menos de 20 dias do anúncio feito pela companhia, em 11 de janeiro, de que havia "inconsistências contábeis" da ordem de R$ 20 bilhões no balanço.
Em comunicado divulgado ao mercado pela nova gestão da companhia em 13 de junho, Saicali foi apontada como uma das participantes da fraude, ao lado de Miguel Gutierrez, ex-CEO da empresa, e dos ex-diretores José Timótheo de Barros e Márcio Cruz Meirelles, além de outros executivos.
A defesa de Saicali negou que a transferência dos bens tinha o objetivo de proteger o patrimônio dela de eventuais medidas decorrentes das investigações e "decorreu de planejamento sucessório motivado por questões de saúde".
Os primeiros ex-executivos que serão escutados pela CPI serão o antigo CEO, Miguel Gutierrez, e Fabio Abrate, o que deve acontecer em agosto, após o recesso parlamentar. Além disso, devem participar representantes da KPMG e PwC, empresas que auditaram os balanços da Americanas no período da fraude.
Os demais executivos serão ouvidos na sequência, assim como representantes dos bancos.
Sobre as instituições financeiras, Ribeiro pontuou que é necessário "muito cuidado para não transformar vítimas em culpados". "Logicamente que nós iremos ouvir os bancos também, para ver qual a versão dos bancos em toda em todo esse episódio".
Cinco meses depois da Americanas soltar o fato relevante falando em inconsistências contábeis, a companhia divulgou um relatório admitindo a fraude.
De acordo com o relatório, a fraude ocorria na contratação de bônus junto à indústria -uma prática comum no varejo, quando fabricantes dão descontos para grandes encomendas, que o relatório apontou como "contratos de verba de propaganda cooperada e instrumentos similares (VPC)".
Os descontos nunca teriam acontecido e mesmo assim apareciam melhorando o balanço da varejista. Além disso, para cumprir o pagamento aos fornecedores, a diretoria anterior contratou empréstimos sem o conhecimento do conselho de administração e os contabilizou irregularmente.
Os números preliminares e não auditados apontam uma fraude de R$ 25 bilhões.
Desde que a fraude foi revelada até maio de 2023, a Americanas teve uma queda de cerca de 9,9% na base de clientes ativos, passando de 49,1 milhões para 44,2 milhões no intervalo. A varejista fechou 43 lojas de janeiro de 2023 até 18 de junho, chegando a 1.837 unidades no país, um recuo de 2,3% no período.