Preço da energia dispara com calor e parada para manutenção em Angra 2

Por NICOLA PAMPLONA E ALEXA SALOMÃO

RIO DE JANEIRO, RJ E BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - A elevação do consumo de energia para enfrentar a onda de calor ao mesmo tempo em que a usina nuclear Angra 2 parou para troca de combustível já começam a impactar o custo da energia no mercado livre, espécie de bolsa de negociações entre produtores e grandes consumidores.

O valor de liquidação de contratos nesse mercado, chamado de PLD (Preço de Liquidação de Diferenças), quase triplicou nos últimos dois dias, passando dos R$ 69,04 por MWh (megawatt-hora) vigentes na segunda-feira (25) para R$ 185,18 nesta quarta (27).

Os impactos de curto prazo ainda são vistos como limitados e concentrados na indústria, mas o setor avalia que a alta é um sinal importante num cenário em que o fenômeno El Niño pode provocar seca nos rios da Amazônia e que, eventualmente, vai bater nos contratos de negociação de energia por indústrias.

É a primeira vez desde setembro de 2022 que o PLD deixa o preço mínimo previsto, patamar em que vinha estacionado diante do elevado nível dos reservatórios das hidrelétricas no país.

Nos últimos dias, o consumo de energia tem apresentado níveis recordes para essa época do ano, diante da onda de calor que afeta a maior parte do território nacional. Na sexta (22), o ONS (Operador Nacional do Sistema Elétrico) previu que 2023 terá recorde de consumo para o mês de setembro.

Por volta das 17h desta quarta, por exemplo, a carga injetada no sistema elétrico para abastecer o país estava perto de 89 mil MW), patamar visto normalmente apenas durante o verão, quando o consumo costuma bater recordes no país.

Em seu boletim de programação semanal de operação divulgado na sexta, o ONS disse que o sistema é robusto e suportará a alta do consumo provocada pelas elevadas temperaturas.

Mas segundo especialistas, picos de consumo durante a onda de calor levam o modelo que define o PLD a enxergar maior necessidade de térmicas e de despacho de usinas hidrelétricas, acelerando a redução do volume de água nos reservatórios, natural nesta época do ano.

Na terça, usinas térmicas responderam por 8,87% de toda a energia injetada no sistema. Até as 17h desta quarta, já respondiam por 10%. Restrições operativas impostas após o apagão de agosto também levaram o ONS a usar mais as hidrelétricas das regiões Sudeste e Centro-Oeste.

Com a saída de Angra 2, na semana passada, térmicas e hidrelétricas são as principais alternativas para substituir os cerca de 1,3 MW que a central nuclear de Angra dos Reis deixa de gerar.

Todos esses fatores são considerados pelo sistema que calcula o preço da negociação de excedentes no mercado livre. Ele não define o preço final ao consumidor, mas é um indicativo da direção do preço da energia no país.

O PLD regula a negociação de sobras ou déficits contratuais no mercado livre. Se uma empresa usou mais energia do que o volume que tem sob contrato, ela paga o volume restante com esse preço.

O cenário atual beneficia a Eletrobras, por exemplo, que passará a receber mais pela sobra de energia em suas hidrelétricas. As distribuidoras de eletricidade vivem situação semelhante e vinham reclamando de prejuízos com a venda das sobras pelo PLD.

Mesmo com a alta dos últimos dias, porém, o preço atual de negociações no mercado livre está bem abaixo do teto previsto, de R$ 678,29 por MWh.

Especialistas dizem que a duração do cenário de alta depende da duração da onda de calor, que vem gerando picos de consumo incomuns para essa época, com impactos principalmente após às 16h, quando o consumo ainda está alto e a geração de energia solar começa a cair.

Um programa de redução voluntária do consumo industrial em horários de pico, como o implantado sem muito sucesso pelo governo Jair Bolsonaro (PL), também poderia aliviar o problema, reduzindo a necessidade de geração adicional.