Magazine Luiza identifica 'incorreções' que reduzem seu patrimônio e reapresenta balanços
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O Magazine Luiza reapresentou os números de seus balanços após uma investigação apontar erros na contabilização de bonificações a fornecedores, prática comum no setor do varejo. A empresa informou "incorreções contábeis" no contexto da divulgação de seu balanço do terceiro trimestre.
A gerente de Relações com Investidores do Magalu, Vanessa Rossini, disse à Folha que esse erro contábil se deu no tempo em que essas bonificações foram registradas, sendo contabilizadas antes de a varejista observar atentamente se já foram cumpridas.
Isso gerou uma distorção nos balanços da empresa, o que fez com que a companhia ajustasse o seu patrimônio líquido em R$ 829,5 milhões sobre o valor do fim de junho deste ano, conforme fato relevante divulgado na última segunda-feira (14), "líquido de impostos e sem impacto no seu fluxo de caixa".
As bonificações de fornecedores consistem em descontos que as empresas oferecem a varejistas no preço total de produtos fornecidos em troca de alguma condição especial, como publicidade da marca na loja ou exposição de suas mercadorias em locais privilegiados.
"Essas bonificações foram contabilizadas antes do momento em que deveriam ter sido feitas", diz Rossini.
A investigação nos números do Magalu, encabeçadas pelo TozziniFreire Advogados e pela PwC, aconteceu após uma denúncia anônima feita em março deste ano, na esteira do escândalo de fraude contábil da Americanas.
Apesar dos erros revelados, o Magazine Luiza destacou no fato relevante que a denúncia se mostrou improcedente. "Ficou comprovada a boa-fé dos envolvidos", destaca Rossini à Folha de S.Paulo.
Mais de um milhão de documentos digitalizados e cerca de 20 mil registros manuais foram analisados na investigação. Segundo a gerente de Relações com Investidores da empresa, esse volume alto reflete o forte aumento das bonificações de fornecedores que aconteceram no pós-pandemia, consequência do movimento de expansão da companhia no período anterior.
Rossini afirmou que a empresa está implementando agora uma automatização da apuração das verbas de fornecedores, o que dará mais segurança sobre os números da empresa.
Segundo o fato relevante, o ajuste de R$ 829,5 milhões sobre o patrimônio líquido da empresa foi parcialmente compensado pela entrada de R$ 688,7 milhões (R$ 507,4 milhões líquidos) em créditos fiscais referentes a uma decisão judicial do STJ (Superior Tribunal de Justiça), que fixou entendimento no sentido da não incidência de PIS/Cofins sobre bonificações recebidas de fornecedores.
Considerando esse fator, ao final, a redução no patrimônio líquido da companhia foi de R$ 322,1 milhões, segundo a varejista. Isso levou a um ajuste em balanços anteriores. O prejuízo líquido do terceiro trimestre do ano passado, por exemplo, foi de R$ 190,9 milhões. Anteriormente, o prejuízo contabilizado havia sido de R$ 166,8 milhões.
RESULTADO FRACO NO TERCEIRO TRIMESTRE
A empresa divulgou que obteve lucro líquido de R$ 331,2 milhões no terceiro trimestre deste ano, revertendo prejuízo de R$ 190,9 milhões no mesmo período do ano anterior, em resultado impulsionado pelo reconhecimento de créditos tributários.
O mercado, em média, esperava prejuízo líquido de R$ 154,1 milhões, com base em dados da LSEG.
Analistas, contudo, destacam que o lucro foi fruto do efeito contábil da decisão do STJ sobre impostos, e que esse fator tem repercussão apenas imediata nos números da empresa.
Na versão ajustada, que desconsidera eventos não recorrentes como os créditos tributários, a empresa teve prejuízo líquido de R$ 143,4 milhões, uma perda 15,7% menor do que a vista um ano antes.
"Para mim, o balanço do terceiro trimestre foi fraco e veio bem em linha com o que eu esperava", diz o analista José Eduardo Daronco, da Suno Research.
Daronco lembra que, antes, havia uma expectativa de migração de clientes da Americanas para concorrentes como a Magalu, o que não se confirmou. Ao contrário, houve queda generalizada nas vendas.
Gabriel Costa, analista da Toro Investimento, concorda que, apesar da surpresa do erro contábil, os resultados operacionais do trimestre estavam dentro do esperado.
"Esperávamos queda de receitas líquidas na casa de 3% na comparação anual, que se confirmou. Do lado do Ebitda [lucro operacional, sem descontar impostos], nossa expectativa era de uma redução, na casa de 8% na base anual, mas vimos a adição de créditos tributários que reverteram a queda do número", afirma.
O Magazine Luiza reportou no terceiro trimestre Ebitda ajustado de R$ 487,5 milhões, uma redução de 0,7% frente ao mesmo período do ano passado.
A receita líquida do Magazine Luiza foi de R$ 8,6 bilhões no terceiro trimestre, queda de 2,6% no comparativo anual.
As vendas em lojas físicas aumentaram 2,3%, enquanto as vendas diretas via comércio eletrônico caíram 4,3%, e o marketplace viu crescimento de 24,8%.
As despesas com vendas subiram 11,4%, para R$ 1,7 bilhão. Pelo lado da despesa financeira, por sua vez, a empresa já conseguiu sentir o efeito da queda da taxa básica de juros Selic, registrando redução de R$ 100 milhões em relação ao ano passado.
"Eventos não recorrentes e erros contábeis mexem com as expectativas dos investidores e com a confiança do mercado. Acredito que o evento da Americanas no início do ano adiciona ainda mais receio sobre esse ambiente. Mas, diferentemente do que observamos na ocasião, vimos que o Magazine Luiza já propôs uma série de ações para correções e reforço das estruturas de governança", afirma Costa.
As ações do Magazine Luiza abriram a sessão desta terça-feira (14) na Bolsa caindo 8%. O movimento, contudo, mudou ao longo do pregão, e o papel fechou o mercado em alta.
"Há um sentimento generalizado positivo no dia de hoje que ajuda o movimento do papel", diz Costa. "Além disso, passada a conferência de resultados do Magazine Luiza e com o mercado digerindo mais os dados da empresa, os investidores conseguem analisar com mais calma os números e recalcularem as expectativas", diz.
Apenas seis ações que compõem o Ibovespa caíram nesta sessão. O principal índice da Bolsa de Valores de São Paulo subiu 2,29%, em meio a um clima positivo no Brasil e no exterior, após a divulgação de dados de inflação ao consumidor nos Estados Unidos mais fracos do que o esperado pelo mercado.
Esse fator reforça o otimismo do mercado de que o Federal Reserve, banco central americano, deve encerrar já o ciclo de elevação dos juros básicos do país.
Com isso, os juros futuros brasileiros registraram forte queda, apoiando setores da economia que dependem de taxas mais baixas para crescer. O Índice de Consumo, que engloba ações de empresas do varejo, como o Magazine Luiza, foi o que mais subiu (3,4%) entre os índices da B3.