Evento brasileiro de energia só com homens revolta mulheres do setor
BERLIM, ALEMANHA (FOLHAPRESS) - Não faltam mulheres atuando no Brasil no setor de energia, com conhecimento nas mais diversas áreas e experiência em transição energética e descarbonização da produção industrial e do transporte. Nenhuma delas, no entanto, estava no evento que tratou desses temas em Brasília nesta terça-feira (19) e reuniu apenas homens.
As únicas mulheres estavam presentes como mediadoras e não eram do setor.
O cartaz do evento com as fotos de 17 palestrantes do sexo masculino circulou nos grupos de WhatsApp das especialista em energia com comentários que foram da indignação à decepção.
O seminário "Descarbonização e os desafios para a mobilidade de baixo carbono no Brasil" foi promovido em parceria por Esfera Brasil e MDCD (Mobilidade de Baixo Carbono para o Brasil).
No entanto, como reuniu pesos pesados do governo, ajudou a piorar a percepção de que, apesar de terem feito a defesa da diversidade durante a campanha eleitoral, os integrantes do terceiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ainda deixam em segundo plano a representatividade feminina.
Ou, ao menos, não se deram ao trabalho de avaliar a composição das mesas do evento em que marcariam presença.
Pelo governo estavam no seminário o vice-presidente e ministro de Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin, os ministros Fernando Haddad (Fazenda) e Renan Filho (Transportes), o secretário do Mdic Márcio Elias Rosa, o secretário de comunicação, Paulo Pimenta, além do presidente do BNDES, Aloizio Mercadante.
Os presidentes do Senado e da Câmara, Rodrigo Pacheco (PSD-MG) e Arthur Lira (PP-AL), também participaram.
Nesta mesma terça-feira ocorreu em Berlim, na Alemanha, outro evento da área de energia que serve de contraponto para o brasileiro.
O BETD24 (10º Diálogos da Transição Energética) teve início reunindo mais de 2.000 especialistas de 90 países para discutir alternativas de descarbonização. É um dos principais debates internacionais nessa área.
Entre os palestrantes há mulheres das mais diversas nacionalidades, raças, idades e profissões. Ministras de Estado, secretarias de governo, parlamentares, cientistas, executivas, empresárias. Das 94 pessoas que fazem apresentações, como moderadores e conferencistas, 56 são mulheres, ou seja, 59%.
Ao final de sua apresentação, na abertura do evento, o ministro das Finanças e Proteção Climática da Alemanha, Robert Habeck, fez questão de cumprimentar as representantes da GWNET (Global Women's Network for the Energy Transition).
O grupo combate os desequilíbrios de gênero no setor e atua no treinamento e mentoria no mundo todo para elevar a atuação das mulheres na transição energética global
O representante do Brasil no evento, Rodrigo Rollemberg, secretário de Economia Verde, Descarbonização e Bioindústria do Mdic, falou à tarde num painel com forte representatividade feminina: havia 4 mulheres entre os 7 participantes do painel que tratou das iniciativas na América Latina e Caribe.
Além da jornalista Melinda Crane, mestre de cerimônia do evento, que conduziu a discussões no painel, estavam a ex-presidente do Chile, Michelle Bachelet, que faz parte do comitê de desenvolvimento do hidrogênio verde no país, a ministra de Indústria, Energia e Mineração do Uruguai, Elisa Facio, e a CEO da Neo Energy, Mónica Scalante.
Na ala masculina também estavam o diretor da área de energia do BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento), Marcelino Madrigal, e Gianni Chianetta, que atua em diferentes empresas no setor de energia há 20 anos e foi um dos fundadores do Conselho Solar Global.
Procurada pela reportagem para explicar por que não havia mulheres entre os palestrantes, o MDCD não explicou.
A assessoria de imprensa da Esfera disse que houve um problema de agenda, mas não deu detalhes se convidou mulheres, nem quais teriam sido ou por que motivo elas não fariam parte do elenco de palestrantes.
"Os organizadores informam que, em todos os debates e atividades que promovem, sempre buscam levar em conta a diversidade de painelistas. Infelizmente, no evento específico desta terça-feira, por questões principalmente de agenda, não foi possível escalar a composição ideal em termos de diversidade."
A Secom não expressou comentário sobre a falta de diversidade do evento e disse que não tem ingerência em iniciativas privados.
"O evento não foi organizado pelo Governo Federal. A Secom não pode censurar nomes ou intervir na composição de mesas de entidades privadas ou da sociedade civil."