A partir de vitória inexpressiva, Botafogo se tornou um fenômeno
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - A imagem era uma aula de semiótica, ciência que se dedica ao estudo dos signos. O capitão Marçal com um troféu nas mãos, mas expressão de quem queria estar em qualquer lugar, menos ali. O Botafogo havia acabado vencer a Taça Rio ao derrotar o Audax por 5 a 2.
Era um título, mas o rosto do jogador dizia tudo. No estádio Raulino de Oliveira semideserto, a equipe carioca havia ganhado a competição destinada a quem não havia obtido classificação para as semifinais do Campeonato Carioca. O Botafogo havia terminado em quinto e perdido a vaga para o Volta Redonda após ter sido batido por 1 a 0 pela Portuguesa.
O que ficou na memória de jogadores foi o que o técnico português Luís Castro disse no vestiário. Naquele momento, poderia não parecer, mas ele tinha certeza de que o time tinha condições de alçar grandes voos, chegar a grandes vitórias. Era a noite de 9 de abril de 2023.
Neste domingo (5) o Botafogo visita o Cruzeiro, às 18h30, no Mineirão. O time iniciou a rodada com 12 pontos de vantagem na liderança do Campeonato Brasileiro e a garantia de que vai terminar o primeiro turno na primeira posição.
Os muros pichados em General Severiano com mensagens que xingavam jogadores, Luís Castro e John Textor, dono de 90% da SAF (Sociedade Anônima do Futebol), ficaram no passado.
"A gente não está conseguindo fazer frente com Portuguesa, com Audax? É time que nem existe. E, ontem, aquilo lá, Deus me livre. Vergonha", disse um torcedor para o técnico, em vídeo que circulou na internet após empate com o Magallanes, do Chile, na primeira rodada da Copa Sul-Americana.
O protesto ocorreu após a queda no torneio estadual.
"A pré-temporada foi cheia de problemas, e começamos com a ideia de tentar uma vaga na Libertadores. Mas agora podemos brigar pelo título. A pontuação nos mostra isso", constata o diretor executivo de futebol, André Mazzuco, um dos responsáveis pela montagem do elenco.
O time ainda pode bater recorde da história do Brasileiro em pontos corridos com 20 clubes, número adotado em 2006. A maior pontuação já registrada no primeiro turno é do Corinthians, que em 2017 alcançou 47 pontos. Com 43, o alvinegro carioca tem mais duas rodadas para superar esse número. Além do Cruzeiro, terá como rival o Internacional em casa.
Não houve uma mudança significativa de jogadores entre o fiasco do Carioca e a fenomenal campanha no Nacional. Do time que entrou em campo diante do Audax, em abril, seis estavam em campo na semana passada, na goleada por 4 a 1 sobre o Coritiba: o goleiro Lucas Perri, o zagueiro Víctor Cuesta, os volantes Lucas Fernandes, Marlon Freitas e Tchê Tchê e o meia-atacante Segovia.
O atacante Tiquinho Soares, maior símbolo da disparada botafoguense, estava no clube, mas não atuou na conquista da Taça Rio.
"É difícil dizer o que mudou. As coisas começaram a dar certo", afirma o jogador. "Todo o mundo está correndo e se doando. A gente se fechou como uma família."
No Carioca, ele anotou quatro gols. No Brasileiro, já marcou 13. Artilheiro do torneio, tem cinco de vantagem sobre Vitor Roque, do Athletico.
Ao comentar sobre inclusão social e dizer que as pessoas precisam de mais um "pouquinho" de dinheiro, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) fez brincadeira com o atacante.
"Eu não vou falar ?tiquinho? porque Tiquinho é o centroavante do Botafogo. Está com muita sorte. Qualquer chute que ele dá entra no gol."
É um momento histórico para um time que não conquista um título de expressão desde o Carioca de 2018. O último troféu nacional foi o do Brasileiro de 1995.
"Queremos criar processos que não dependam de pessoas, que sejam do clube. É um legado", defende Mazzuco.
Dentro de campo, isso tem dado certo. Seduzido por proposta do Al Nassr, Luís Castro trocou o Rio de Janeiro pela Arábia Saudita. Cláudio Caçapa ocupou o cargo de forma interina até a chegada do português Bruno Lage. Em nenhum momento a equipe baixou a guarda. Continuou ganhando. Em 17 rodadas, são 14 vitórias e apenas uma derrota.
A campanha foi a redenção também para John Textor. Quase 17 meses depois de se tornar acionista majoritário da SAF, ele pode levar o clube ao primeiro título. A venda foi aprovada pelo conselho deliberativo em janeiro do ano passado.
Antes alvo de protesto, o empresário norte-americano agora circula entre os torcedores quando vai ao estádio, em uma liberdade que apenas a vitória pode proporcionar. Ele viu na arquibancada visitante, junto com os outros botafoguenses, o 2 a 1 sobre o Patronato, na Argentina, em 12 de julho.
ESCALAÇÕES
O Botafogo deve seguir desfalcado por Patrick de Paula, Luís Henrique e Rafael, todos lesionados, enquanto Gabriel Pires, em transição, é dúvida.
Uma possível formação inicial do time alvinegro tem: Lucas Perri; Di Plácido, Adryelson, Cuesta e Marçal; Marlon Freitas, Tchê Tchê e Eduardo; Gustavo Sauer (Júnior Santos), Tiquinho Soares e Victor Sá
O Cruzeiro, por sua vez, deve ser desfalcado por Wesley, que cumpre suspensão, e Lucas Oliveira, lesionado. O técnico Pepa também cumpre suspensão, e o auxiliar Samuel Correia comandará a equipe.
Uma provável escalação do clube mineiro tem: Anderson; William (Palacios), Neris, Luciano Castán e Marlon; Matheus Jussa, Filipe Machado, Lucas Silva e Mateus Vital; Bruno Rodrigues e Arthur Gomes (Matheus Pereira).
Estádio: Mineirão, em Belo Horizonte (MG)
Horário: Às 18h30 (de Brasília) deste domingo (6)
Árbitro: Raphael Claus (Fifa/SP)
VAR: Rafael Traci (SC)
Transmissão: SporTV e Premiere