Encapuzados atacam polícia na Irlanda do Norte em dia que celebra acordo de paz
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Um grupo de pessoas mascaradas e encapuzadas atacou policiais com coquetéis molotov na cidade de Londonderry, na Irlanda do Norte, durante protesto contra o Acordo de Belfast, que encerrou décadas de guerra civil e completou 25 anos nesta segunda (10).
A polícia informou que nenhum agente ficou ferido, mas relatou danos patrimoniais -ao menos uma viatura policial foi atingida pelas chamas no bairro de Creggan, de maioria católica e nacionalista.
O episódio de violência aconteceu na véspera da visita do presidente dos EUA, Joe Biden, ao país. O democrata tem origens irlandesas e fez parte do grupo de senadores americanos que pressionou para que Washington se esforçasse diplomaticamente para pôr fim ao conflito. Nesta semana, o americano cumprirá agendas em Belfast e Dublin.
"O que vimos acontecer em Creggan foi desanimador. Um ataque sem sentido e imprudente contra oficiais que cumpriam deveres legais", disse o chefe da polícia local, Nigel Goddard. Ele acrescentou que as autoridades trabalham para reunir provas e que as imagens coletadas devem ser analisadas como parte de uma investigação sobre crimes de terrorismo.
Assinado em 1998, o Acordo da Sexta-Feira Santa encerrou três décadas de conflito civil que deixou mais de 3.500 mortos. Os embates colocaram em lados opostos a população protestante favorável à aproximação com a Grã-Bretanha, e a católica, que defendeu a independência ou a integração com a República da Irlanda.
Também chamado de Acordo de Belfast, o tratado foi obtido após anos de promessas de cessar-fogo e negociações, que envolveram uma frente multipartidária e representantes do Reino Unido e da República da Irlanda. Mas ainda hoje são registrados casos de violência esporádicos.
Líderes do governo e da oposição condenaram a violência. Vice-presidente do nacionalista Sinn Féin, Michelle O'Neill chamou o ato de deplorável. "Esta desordem não tem lugar em nossa sociedade. Como líderes políticos, devemos permanecer unidos e apelando para acabar com esses ataques", disse. O Sinn Féin, antigo braço político do Exército Republicano Irlandês (IRA), venceu as eleições regionais no ano passado.
Já Naomi Long, líder da Aliança, legenda que não é alinhada nem aos católicos nem aos protestantes, disse que era trágico ver pessoas nascidas após o acordo de paz atacando a polícia.
Diante do temor de possíveis ataques, a inteligência britânica elevou no mês passado o alerta de segurança para severo. O status mudou depois que um policial fora de serviço ficou gravemente ferido após um ataque com arma de fogo do Novo IRA, grupo militante dissidente.
Além das manifestações nas ruas, o aniversário do Acordo da Sexta-Feira Santa intensificou o debate sobre pontos do tratado que precisam ser aperfeiçoados. Um deles é o próprio funcionamento das instituições políticas no país. Há quase um ano, a Irlanda do Norte não tem governo Executivo e Assembleia Legislativa em plena operação.
Apesar de ter vencido pela primeira vez as eleições, o Sinn Féin, que defende a reunificação com a República da Irlanda e é apoiado pela maioria católica, não conseguiu empossar a primeira-ministra, Michelle O'Neill.
Isso porque seu principal opositor, o Partido Unionista Democrático (DUP), pró-Reino Unido e identificado com os protestantes, é também seu aliado forçado. Pelas regras do acordo de paz, as duas legendas são obrigadas a compartilhar o poder. O mais votado indica o primeiro-ministro, o segundo, o vice, e ambos têm o mesmo status. O DUP, no entanto, recusa-se a cumprir as formalidades para que o governo assuma e o Legislativo tenha um presidente.
É diante deste imbróglio que Biden deve chegar a Belfast nesta terça-feira (11). Na quarta (12), ele deve ir a uma universidade onde está previsto um discurso seu.