Polícia passa a abordar usuários de drogas da cracolândia e levar para delegacia
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Dependentes químicos flagrados consumindo drogas na cracolândia, no centro de São Paulo, estão sendo encaminhados pela Guarda Civil Metropolitana e pela Polícia Civil para o 77° DP (Santa Cecília). A iniciativa, que teve início nesta semana, faz parte de um projeto que visa a internação, seja ela voluntária ou involuntária.
"Acabamos com a tolerância ao tráfico, agora, a gente está entrando em uma nova fase, em que a polícia não está mais tendo tolerância com o consumo nas ruas, e a prefeitura está estruturada para dar atendimento às pessoas que participarem de ocorrências policiais", afirmou o secretário-executivo de Projetos Estratégicos do município, Alexis Vargas.
Durante as conduções, de acordo com boletim de ocorrência, não há uso de algemas.
O objetivo, segundo a gestão Ricardo Nunes (MDB), é que usuários possam receber atendimento, seja para curar ferimentos decorrentes do uso do crack, como bolhas e machucados nos dedos, casos de sífilis ou tuberculose, e para internação, seja ela voluntária ou involuntária.
Conforme Vargas, 24 pessoas foram internadas de forma voluntária desde o dia 8 deste mês.
Houve seis internações na quarta (21), sete na quinta (22) e uma nesta sexta-feira (23).
As outras dez pessoas foram encaminhadas em outros momentos, como em abordagens realizadas por assistentes sociais.
Todas estão no Hospital Geral Cantareira, na zona norte da cidade, de acordo com a prefeitura.
Segundo o secretário, o dependente é conduzido para a delegacia após ser flagrado consumindo drogas na via pública. Depois de ser ouvido por um policial, ele é encaminhado para uma primeira avaliação no Siat (Serviço Integrado de Acolhida Terapêutica) emergencial, tenda montada pelo programa Redenção na rua Helvétia, a poucos passos do 77° DP e da maior concentração de dependentes químicos atualmente.
Se os profissionais do Siat entenderem que o usuário necessita de demais cuidados, ele é levado até a UPA Vergueiro. São os profissionais da unidade de pronto-atendimento que avaliam se o caso é para internação.
"A gente se estruturou para dar o atendimento indicado pelos profissionais de saúde, seja Caps, Siat ou hospital, para dar o atendimento individualizado para cada um", acrescentou o secretário.
Vargas afirmou que não vê problemas na ação ser conduzida por policiais, uma vez que, segundo ele, pessoas estão aceitando a abordagem e o tratamento, sobretudo após a dispersão dos usuários. "Não acho que o trabalho da polícia está atrapalhando, pelo contrário, está ajudando a gente a dar mais tratamento para as pessoas."
No entanto, o uso de policiais nas ações é criticado pelo psicanalista Jorge Broide, professor do curso de psicologia da PUC (Pontifícia Universidade Católica) de São Paulo. Ele, que realiza trabalhos com a população de rua há 46 anos, acha duvidosa a eficácia.
"Tratamento via ação policial não gera o esforço necessário que o usuário precisa ter para se tratar. É necessário desejo e confiança por parte dele. Isso se consegue com o trabalho do dia a dia junto a ele, encaminhando e acompanhando o tratamento na rede de saúde, de trabalho, de assistência moradia. A internação deve ser voluntária", disse.
A reportagem teve acesso a um boletim de ocorrência em que dependentes químicos flagrados pela GCM foram ouvidos no 77° DP.
Boa parte deles contou ser viciado em crack há muitos anos. Um homem de 34 anos relatou consumir o entorpecente desde os 11, com passagem por tratamento, mas sem conseguir sair do vício.
Além da dependência química, muitos dos conduzidos apresentavam feridas, principalmente nas mãos, além de aparente desnutrição, confusão mental e más condições de higiene, conforme descrito pelos policiais no documento. Eles foram encaminhados para a UPA Vergueiro e para serviços assistenciais no âmbito do programa Redenção.
Diversos cachimbos com resquícios de crack que estavam em posse dos usuários foram apreendidos.