Secretaria de Justiça diz que não conhece casos de exploração de crianças como o citado por Damares

Por RAQUEL LOPES

BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - A Secretaria Nacional de Justiça, do Ministério da Justiça e Segurança Pública, afirmou em um ofício a organizações da sociedade civil que fazem parte do Conatrap (Comitê Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas) que não recebeu nenhuma informação e não tem ciência de casos de exploração sexual de crianças apontados pela senadora eleita Damares Alves (Republicanos-DF).

Damares afirmou, em 8 de outubro, durante um culto e sem apresentar provas, que teria tomado conhecimento de um esquema de tráfico de crianças para exploração sexual. Segundo ela, as vítimas tinham seus dentes arrancados para facilitar a prática de sexo oral.

O pedido de esclarecimento foi feito por entidades da sociedade civil que fazem parte do Conatrap em 13 de outubro. O órgão, que também possui representantes do poder público, possui a competência para o desenvolvimento de ações contra o tráfico de pessoas. A informação foi revelada pelo G1 e confirmada pela reportagem.

"A Secretaria Nacional de Justiça (Senajus), por intermédio da Coordenação-Geral de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas e Contrabando de Migrantes (CGETP) não recebeu informações ou tem ciência sobre os casos específicos de tráfico de pessoas, exploração sexual e tortura de crianças no Arquipélago do Marajó", disse Bruno de Andrade Costa, secretário Nacional de Justiça, em ofício.

Um vídeo com as declarações de Damares foi publicado pelo senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), filho do presidente Jair Bolsonaro (PL), em suas redes sociais. Ela ainda afirmou que o número de estupros de recém-nascidos teria crescido nos últimos anos e que o ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, que já foi chefiado por ela, "tem imagens de crianças de oito dias" sendo vítimas do crime.

"Nós descobrimos que essas crianças comem comida pastosa para o intestino ficar livre para a hora do sexo anal. Bolsonaro disse: 'Nós vamos atrás de todas elas'. E o inferno se levantou contra esse homem. A guerra contra Bolsonaro que a imprensa, o Supremo e o Congresso levantou, acreditem, não é uma guerra política. É uma guerra espiritual. [...]", prosseguiu ela.

Damares Alves não é clara ao tentar explicar a origem dos supostos casos de exploração e abuso de crianças no Pará que ela descreveu durante o culto. A senadora eleita dá diferentes versões sobre o surgimento das supostas denúncias, citando como origem CPIs (comissões parlamentares de inquérito) já encerradas, a ouvidoria do ministério e depoimentos de moradores da Ilha de Marajó (PA).

Após ser questionada diversas vezes por mais detalhes, a ex-ministra passou a dizer que os casos estão em um inquérito sigiloso, e, por isso, não poderia dar mais informações.

"Eu vou pagar o preço por muito tempo ainda de acharem que eu menti, mas é para preservar as investigações. Aguardem", afirmou à Folha.

O Ministério Público Federal, por sua vez, afirma que atuou em inquéritos sobre supostos casos de tráfico internacional de crianças desde 1992 no arquipélago do Marajó e que, em 30 anos, nenhuma das denúncias mencionou nada semelhante ao citado pela ex-ministra.

Os promotores aguardam esclarecimentos sobre as declarações para que o caso seja investigado. "A gente vai ter que entender", respondeu Damares sobre a solicitação do Ministério Público.

O relator da CPI da Assembleia Legislativa do Pará, Arnaldo Jordy (Cidadania), já disse à reportagem que também nunca ouviu falar nos casos citados pela ex-ministra.