GCM impede moradores de entrarem em prédio ocupado no centro de São Paulo
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Moradores de uma ocupação na avenida São João, no centro paulistano, estão impedidos de entrar no prédio por agentes da GCM (Guarda Civil Metropolitana) desde a tarde da última segunda-feira (31). Dois carros e sete agentes da guarda restringem o acesso ao local e apenas mulheres com filhos podem entrar e sair.
O imóvel, que pertence à prefeitura e estava vazio havia seis meses, foi ocupado na noite de sábado (29). No local, funcionava um hotel social para abrigar moradores de rua, desativado em maio.
De acordo com a Companhia Metropolitana de Habitação de São Paulo (Cohab-SP), dona do prédio, a reforma do imóvel foi contratada para disponibilizá-lo, posteriormente, à moradia social. A pasta, porém, não disse quando a contratação foi feita e nem o motivo da demora para concluí-la.
A ocupação do prédio ocorreu um dia antes da decisão do ministro Luís Roberto Barroso, do STF (Supremo Tribunal Federal), que determinou a criação de comissões para mediar despejos antes de qualquer decisão judicial.
Com caráter transitório, a medida surgiu após o fim da determinação do STF que suspendeu as remoções durante a pandemia de Covid, no último dia 31. A criação das comissões foi uma sugestão dos movimentos sociais e deve durar por até um ano e meio, segundo a corte.
As comissões também deverão realizar inspeções judiciais e audiências de mediação antes de qualquer decisão de desocupação, com participação do Ministério Público e da Defensoria Pública.
Uma reunião entre representantes da ocupação e funcionários da Cohab ocorreu no fim da tarde de terça, mas não houve acordo.
Uma das moradoras, a diarista Gisele Luciene Vieira, 38, saiu da ocupação na manhã de segunda-feira para levar a filha de 14 anos para a escola e, quando voltou, foi impedida pelos guardas-civis de entrar no prédio. Ela também é mãe de uma bebê de nove meses que ficou lá dentro com outras integrantes da ocupação. "Foi tenso. A sorte é que o pessoal cuidou dela. Eu só consegui entrar de novo à noite", afirma.
"A gente levantava a bebê na janela para ela ver que estava tudo bem", diz a coordenadora da ocupação, Suzane Veríssimo.
Mãe solo, a diarista diz que sua renda é insuficiente para pagar o aluguel de R$ 900 na casa onde morava na zona leste, por isso optou por se mudar para a ocupação no centro.
Segundo a coordenadora, parte dos integrantes da ocupação morava desde 2019 em outro imóvel ocupado na avenida Ipiranga, próximo dali, e deixaram o endereço após acordo com a Cohab de que seriam atendidos pelo programa de habitação municipal. "O atendimento nunca aconteceu", diz. O mesmo imóvel está ocupado por um outro grupo atualmente.
A reportagem questionou a gestão do prefeito Ricardo Nunes (MDB) sobre esses atendimentos, mas não recebeu resposta.
Os agentes também impediram a entrada de comida e água no prédio, e os moradores amarram cordas a sacos plásticos com os mantimentos para serem içados pelas janelas.
A autônoma Rita de Cássia dos Santos, 44, mudou-se para a ocupação com a filha de 15 anos, mãe de um bebê de 2 meses, e outras quatro crianças de 3 a 7 anos, suas enteadas e netas. "Eu posso entrar, mas meu marido não", afirma.
Desempregada, Rita diz que morava de favor na casa de uma amiga com as cinco crianças e a filha adolescente antes de se mudar para o prédio ocupado na avenida São João.
Outro morador, o garçom Mario Sergio da Rocha, 40, afirma que saiu para uma entrevista de emprego na manhã de segunda e, ao voltar, foi impedido de entrar. Está na calçada com duas mochilas de roupas em frente ao prédio desde então. "Minhas coisas estão todas lá dentro", diz. "Eu passei na entrevista de emprego, mas pedi para começar a trabalhar só semana que vem por causa dessa situação."
Ele diz que tinha uma hamburgueria na zona leste, mas teve que fechar o negócio devido à alta nos preços dos alimentos. "Ou você come, ou paga aluguel", afirma o garçom, que pagava R$ 800 de aluguel em São Mateus, na zona leste, antes de decidir se mudar para a ocupação.
Dois colchões infláveis e uma barraca foram montados na calçada para abrigar os moradores.
A educadora social Flavia Regina Antunes Pereira, 39, segurava a filha bebê no colo enquanto esperava o filho de 15 anos voltar da escola. "Não fui trabalhar com medo dele não conseguir entrar de novo", diz ela. Mãe solo de três filhos, ela conta que seu salário é insuficiente para pagar aluguel e sustentar as crianças sozinha.
De acordo com a Secretaria de Assistência e Desenvolvimento Social (Smads), foi ofertado encaminhamento aos abrigos da prefeitura, mas as pessoas não aceitaram.