Ato por preso político egípcio em greve de fome tem tumulto na COP27; veja vídeo

Por PHILLIPPE WATANABE

SHARM EL-SHEIKH, EGITO (FOLHAPRESS) - Um membro do parlamento egípcio chamado Amr Darwish tumultuou e conseguiu, por alguns instantes, interromper as falas da ativista britânico-egípcia Sanaa Seif na COP27 (conferência do clima da ONU), em Sharm el-Sheikh, no Egito. O homem foi retirado do local por seguranças do evento.

Sanaa Seif é irmã de Alaa Abd el-Fattah, preso político no Egito que há mais de 200 dias está em greve de fome e que, durante a COP, parou também de ingerir água.

Seif foi à COP27 nesta terça-feira (8) para comentar a situação do seu irmão. Visivelmente abalada, com a voz embargada, a ativista afirmou não saber se o irmão ainda está vivo.

"Não sabemos onde ele está, não sabemos se ele está vivo. Minha mãe ontem [segunda] esperou por dez horas na porta da prisão para a carta semanal dela. Eles não deram para ela. Ela está de volta lá agora", afirmou Seif. "Eu pedi para autoridades britânicas nos darem alguma prova de que Alaa está vivo. Eu não tive resposta."

A irmã disse ainda temer que Fattah esteja sendo alimentado à força para não correr o risco de morrer durante a COP27.

"Imaginar que agora ele pode estar algemado a uma cama recebendo comida à força e que isso seria uma forma de solução... Isso é grotesco. Se esse for o caso, ele mergulhou em um pesadelo ainda pior do que o que ele já estava", afirmou Seif.

Após Seif ter falado por cerca de dez minutos no evento, os organizadores deixaram que o público presente fizesse perguntas. Amr Darwish foi então o primeiro a pegar o microfone. Ele começou dizendo que falaria em árabe, não em inglês.

Seif tentou iniciar uma tradução, mas foi interrompida pelo homem, que continuou a falar. Em seguida, um segundo homem, também como uma credencial do país-sede, iniciou falas em árabe.

Segundo uma tradução resumida feita por Seif, ambos afirmavam a mesma coisa: que Fattah não seria um preso político.

Em seguida, Amr Darwish ficou em pé e levantou o tom de voz. Uma discussão teve início e um segurança retirou o homem do local.

"Você está em terra egípcia, não encoste em mim", dizia Darwish, enquanto era conduzido para fora do encontro.

A reportagem, que acompanhava a sessão, registrou em vídeo a discussão.

Amr Darwish é membro da Câmara dos Representantes do Egito e também membro da Coordenação de Partidos Juvenis e Políticos. Ele chegou na manhã desta terça em Sharm el-Sheikh, cidade que recebe a COP27. Em uma postagem, Darwish se refere às falas Seif como "enganosas".

Abdel Fattah é um militante democrático e foi uma das principais figuras da revolta popular que levou à queda do ditador egípcio Hosni Mubarak em 2011, durante as manifestações da Primavera Árabe.

Detido desde 2019, ele foi condenado por "divulgação de informações falsas", uma das acusações genéricas que o governo egípcio costuma usar para prisões políticas.

O país é comandado por Abdel Fattah al-Sisi, ex-chefe da segurança do Exército entrou no poder em 2013, a partir de um golpe de Estado.

O presidente al-Sisi proibiu manifestações públicas e protestos no Egito, país que, segundo organizações de direitos humanos, pode ter mais de 60 mil presos políticos, sendo Fattah um dos mais conhecidos.

Não é a primeira vez que Fattah está preso sob o governo de al-Sisi. Entre 2014 e 2019, o ativista ficou preso após participação em uma manifestação. Pouco tempo depois de libertado, ele acabou preso novamente, dessa vez após postagem em redes sociais.

Por ter nacionalidade britânica, conquistada no ano passado, Fattah pode ter sua liberdade negociada pelo Reino Unido. A sua greve de fome começou em protesto às condições pelas quais era tratado, inclusive tendo acesso impedido a autoridades britânicas.

"É um homem que negou a si mesmo comida por sete meses porque ele quer se encontrar com sua embaixada. É um pedido muito simples. Só deixe a embaixada ter acesso", disse a irmã de Fattah.

Em maio, o ativista foi transferido para uma penitenciária com centro médico. Segundo sua família, ele passou a ter um colchão para dormir.

A vinda do primeiro-ministro britânico Rishi Sunak para a COP27 levantou a possibilidade de avanço nas negociações para a liberação de Fattah. Sunak ?que chegou a cogitar não estar presente na atual conferência?, inclusive, enviou uma carta para a família do prisioneiro político às vesperas de viajar para a COP.

Sunak afirma, na correspondência, estar comprometido a resolver o caso. Ele classificou o assunto como "uma prioridade para o governo britânico", segundo o jornal The Guardian.

O primeiro-ministro britânico se encontrou com al-Sisi nesta segunda (7). Em nota, o governo britânico afirma que no encontro foi tratada a questão do prisioneiro político, um "caso de profunda preocupação". A nota diz que Sunak continuaria a pressionar por progressos.

Sameh Shoukry, ministro das Relações Exteriores do Egito e presidente da COP27, chegou a ser questionado, pela rede CNBC, sobre a situação grave do prisioneiro político, uma vez que, sem ingerir nem mesmo água, ele pode morrer. Shoukry disse que a prisão providencia "saúde e cuidado" a todos os presos.

"Eu acho que temos que nos concentrar na missão que temos em mãos, que são as prioridades, considerando que elas estão relacionadas à mudança climática. Nós temos profundas relações bilaterais com o Reino Unido", disse Shoukry.

Na visão de Seif, o governo egípcio não se importaria com a morte de Fattah, mas não querem que isso aconteça durante a COP27.

Apesar da situação crítica, ela afirma, o irmão atingiu o seu objetivo. "O que quer que aconteça, eu sinto que Alaa ganhou, a batalha simbólica foi ganha. Eu só espero que ele, o corpo dele, não seja sacrificado por isso."