Bruno Gagliasso e donos de bares querem horário de verão, mas médico alerta para questão de saúde

Por CARLOS PETROCILO

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O ator Bruno Gagliasso aproveitou o momento e as redes sociais para pedir ao vice-presidente eleito Geraldo Alckmin (PSB), que conduz a transição do governo federal, a volta do horário de verão. Alguns dias depois, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) lançou uma enquete em seu Twitter como uma "consulta a população" [sic].

"O que vocês acham da volta do horário de verão?", perguntou o presidente eleito.

Mais de 2,3 milhões de pessoas votaram entre segunda-feira (7) e terça (8), e 66% são favoráveis ao retorno da medida. Teve até quem se animou e sugeriu um combo com o fim do cardápio através de QR Code, mas também teve quem protestou fazendo simulações de que Lula e seus aliados não precisam acordar logo cedo para o trabalho.

O horário de verão, tradicional no país desde 1985, foi interrompido por um decreto do presidente Jair Bolsonaro (PL), em 2019, e o seu possível retorno, a partir do ano que vem, voltou ao debate nesta semana.

Comerciantes, sobretudo donos de bares e restaurantes, clamam pela sua volta, e economistas, assim como especialistas em segurança pública, apontam vantagens com a medida. Por outro lado, médicos são mais reticentes e citam possíveis problemas de saúde.

"A principal consequência dessa mudança é a privação do sono, que afeta a quantidade de horas dormidas e qualidade. A pessoa, então, rende menos no dia seguinte e perde o seu desempenho intelectual", afirma o médico geriatra e clínico geral Paulo Camiz, professor da USP e do Hospital das Clínicas de São Paulo.

"Quando você encerra o expediente ou chega em casa à tarde, a tendência natural é que vá dormir mais tarde, e é preciso disciplina para regular esse horário", completa o médico.

Essa sensação de uma hora extra de luminosidade ao longo dia é a que enche os comerciantes de esperança.

"O horário de verão contribui muito para o setor de bares e restaurantes, principalmente no happy hour. Estimula as pessoas a confraternizar mais e realizar atividades ao ar livre", disse Rodrigo Alves, proprietário do Ponto Chic.

O bar que completará 100 anos em 2022 é um dos mais tradicionais de São Paulo. O setor foi um dos mais atingidos pela pandemia de Covid-19.

"É impossível estabelecer um parâmetro com a pandemia, mas o happy hour voltou a ser movimentado de março para cá, com as pessoas deixando o home office", afirma Alves.

Entidades como a Abrasel (Associação de Bares e Restaurantes), a ANR (restaurantes) e a CNTur (confederação nacional de turismo) têm cobrado o retorno do horário de verão.

Em dos seus pedidos ao governo de Bolsonaro, a Abrasel argumentou que a retomada da medida poderia ajudar a impulsionar o movimento nos estabelecimentos, além de sinalizar para a população que é preciso economizar energia.

"Uma ou duas horas a mais traz incremento no faturamento do setor de bares e restaurantes, a mesma lógica se aplica ao varejo, shopping center", afirma o consultor financeiro Sérgio Ferreira.

No entanto, Ferreira acredita que a adoção do horário de verão não será suficiente para aquecer o comércio a médio e longo prazo.

"Existem variáveis importantíssimas. A primeira é a geração de empregos. Depois vem o salário com aumento real, o alto nível de endividamento das famílias brasileiras e a expectativa com o futuro, pois as pessoas consomem mais se tiverem perspectivas positivas com a sua renda", afirma Ferreira.

Em relação à sensação de segurança e combate à criminalidade, o consultor Hugo Tisaka aponta para o horário de verão como um aliado principalmente no final da tarde, sendo que boa parte dos crimes se concentra no período noturno.

"Historicamente, a iluminação tem um papel preponderante na incidência de crimes. O criminoso utiliza o elemento surpresa como uma das suas táticas para poder obter êxito. Se ele pode ser visto diminui a vantagem dele sobre a vítima", afirma.

Um estudo da UFPE (Universidade Federal de Pernambuco) aponta que as ocorrências de acidentes rodoviários, entre 2007 e 2013, tiveram uma redução de 10% nas rodovias federais ?considerando os estados em que o horário de verão foi adotado.

Para João Carlos Mello, presidente da Thymos Energia, empresa na área de consultoria e gestão de energia, é válida a discussão no governo de Lula. A gestão Bolsonaro analisou que a mudança de horário tornou-se desnecessária depois que diante das mudanças no padrão de consumo de energia - a maior carga do consumo passou para o período da tarde. A economia para o consumidor também deixou de ser compensatória.

"Vale a pena rever, por exemplo, com o advento da energia solar, que atinge 1 milhão de unidades [residenciais]. Quando o sol some, a carga de energia elétrica sobre rapidamente nessas regiões", afirma Mello. "Se vou ter mais tempo de sol, a energia solar ajuda o sistema de ponta."

A assessoria de imprensa de Lula afirmou que a enquete formulada em seu perfil no Twitter tem caráter "indicativo". O presidente eleito pretende encaminhar o tema aos técnicos que avaliarão se vale a pena o retorno.