Advogada de Flordelis é ex-deputada, feminista e condenada por rachadinha

Por LUIZA SOUTO

RIO DE JANEIRO, RJ (UOL/FOLHAPRESS) - Na segunda-feira (14) a ex-parlamentar Flordelis foi condenada a 50 anos e 28 dias de prisão pela morte do marido Anderson do Carmo, baleado em junho de 2019 na casa da família em Niterói, região metropolitana do Rio de Janeiro. O julgamento foi marcado por muito choro, frases polêmicas e alguns embates entre a advogada da acusada e a juíza Nearis dos Santos Carvalho Arce, da 3ª Vara Criminal de Niterói.

A advogada Janira Rocha, que representou a pastora, chegou ao tribunal carregando o livro "Abuso: a cultura do estupro no país", da jornalista Ana Paula Araújo, com diversas marcações. Janira é uma figura polêmica: é ex-deputada estadual pelo PSOL do Rio de Janeiro, interlocutora do líder grevista dos bombeiros no Rio, o ex-candidato à presidência cabo Daciolo (PTB) e foi acusada de rachadinha. Fontes ouvidas pela reportagem afirmam que Janira pegou o caso de Flordelis por entender de perseguição e que não cobra nada pelo seu trabalho.

Fluminense de Nova Iguaçu (RJ), Janira, 60, é historiadora com formação em direito e pós-graduada em Ciências Criminais. Após atuar na greve nacional do funcionalismo público contra a reforma da previdência, em 2003, esteve na fundação do PSOL, partido pela qual foi eleita deputada estadual em 2010. Ela passou ainda pelo PT (1982-1995) e PSTU (1995-2000).

Em 2021 foi condenada pelo crime popularmente conhecido como rachadinha. Segundo denúncia do Ministério Público do Rio (MPRJ), ela ficava com parte dos salários de servidores enquanto exercia seu mandato parlamentar entre 2010 e 2014.

O caso veio à tona em 2012. Naquele ano, ex-assessores divulgaram áudios de uma reunião em que Janira admitiu ficar com parte dos salários de seus servidores para usar em sua campanha e na de outros integrantes do partido e na "construção do PSOL".

Na época, ela falou que as "vaquinhas", termo usado por ela, eram voluntárias e que nenhum funcionário era obrigado a entregar algum montante. Por fim, decretou que as declarações foram editadas e apresentadas fora do contexto original.

Em 2013, a Polícia Federal abriu um inquérito contra a ex-deputada, a pedido do Ministério Público Federal, para apurar o débito de R$ 8,9 milhões com a Previdência, iniciado pelo Sindicato dos Trabalhadores da Saúde, Trabalho e Previdência do Estado do Rio de Janeiro (Sindsprev-RJ) quando Janira era sua secretária de Finanças.

AMIGA DE DACIOLO

No início de 2012, o Rio de Janeiro foi palco de uma grande manifestação dos bombeiros e policiais, que pediam melhores condições salariais. Os atos foram liderados pelo cabo Benevenuto Daciolo, que anos depois se candidataria à presidência da República, em 2018, e ao Senado, nas eleições deste ano.

Em conversas telefônicas exibidas pela Rede Globo, a então parlamentar foi pega planejando junto a Daciolo estratégias de deflagração de atos grevistas e por isso teve seu mandato ameaçado. A então deputada Cidinha Campos (PDT) pediu sua cassação.

A parlamentar assumiu que era "uma articuladora da luta de policiais e bombeiros por melhores condições salariais" e ressaltou que iria apoiar todos os movimentos reivindicatórios de trabalhadores até o fim de seu mandato.

Foi através de Janira que Daciolo se aproximou do PSOL e tornou-se deputado pela legenda, antes de ser expulso do partido em 2015 quando insistiu em incluir Deus na Constituição do País e defender os policiais militares acusados de participar da morte do pedreiro Amarildo, no Rio de Janeiro. Janira foi a única contra sua saída.

CARONA A FORAGIDOS COM CARRO OFICIAL

Em 2014, outra polêmica: Janira deu carona, em veículo oficial, a duas pessoas consideradas foragidas da Justiça na época. Os suspeitos foram investigados e denunciados por supostos atos de violência em manifestações, assim como outras 20 pessoas.

Numa carta de esclarecimento à Corregedoria da Alerj, Janira informou que a advogada Eloisa Samy, o estudante David Paixão, 18, e a namorada dele, Camila Nascimento, foram até São Conrado, na zona sul da cidade, onde Eloisa encontrou familiares e advogados. E que portanto não se tratava de uma fuga.

Na sua página no Facebook, Janira defende o presidente eleito Lula (PT) e critica o atual mandatário Bolsonaro (PL). "Esse Bolsonaro é um canalha! Mas o sigilo de 100 anos vai cair e aí vamos ver quem é quem", escreve ela num dos posts, referindo-se a atos do presidente de esconder dados públicos.

Também sai em defesa de Flordelis. Num dos posts, fala do direito constitucional de qualquer pessoa ser defendida em sua plenitude máxima". Advogados não são defensores de crimes, ao contrário, defendemos direitos", ela aponta.

FEMINISTA E AMANTE DE ANIMAIS

Janira é mãe de João Pedro, 27, de seu casamento com o compositor Luiz Carlos Máximo ? hoje estão separados. Numa entrevista à revista Socialismo e Liberdade, em 2011, quando ainda eram casados, disse que sua condição de militante determinou os rumos da sua família: "Meu companheiro é militante. Já era quando nos conhecemos e nosso amor e parceria se completam na política também. Meu filho atuou de forma firme na luta para derrubar Ricardo Teixeira da CBF, é um adepto do Fluminense, portelense como o pai, que ama discutir política, samba e futebol. A família toda respira política."