Governo federal deixa de repassar verba para equipes de atenção básica de SP

Por PATRÍCIA PASQUINI

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Distribuídas em 507 dos 645 municípios paulistas, 1.172 equipes de atenção básica trabalham sem verba federal, segundo relatório do Cosems/SP (Conselho de Secretários Municipais de Saúde do Estado de São Paulo) de novembro deste ano.

O levantamento, obtido pela Folha de S.Paulo, aponta que o problema atinge 392 das 6.734 equipe de saúde da família no estado. Passam pela mesma situação 780 das 2.430 equipes de atenção primária. Essas equipes atuam em cerca de 5.000 UBS (Unidades Básicas de Saúde), de acordo com a entidade.

Na área de saúde bucal, 1.489 das 4.297 equipes paulistas estão sem o recurso federal, além de 7 de 59 de Consultório de Rua e 5.014 dos 34.051 agentes comunitários de saúde.

Questionado, o Ministério da Saúde afirmou que o pagamento das equipes e serviços da atenção primária está vinculado ao cumprimento de critérios para repasse de recursos federais, como credenciamento, homologação e demais regras apresentadas pelas portarias nº 6/2017 e nº 1/2021.

"Os serviços que não recebem custeio federal podem apresentar algum tipo de suspensão por falta de envio de produção, duplicidade profissional ou por não estarem devidamente credenciados e homologados. Além da composição física da equipe no estabelecimento, a gestão municipal deve realizar o cadastro no sistema do CNES", disse a pasta, em nota.

O ministério não respondeu à reportagem quais critérios não estão sendo obedecidos pelos municípios e que implicam corte do repasse.

O levantamento do conselho tem como fontes o CNES (Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde) e o E-gestor AB, de setembro, com base nas transferências municipais da competência financeira de novembro.

Para Adriana Martins, vice-presidente do Cosems/SP, a falta da verba federal onera os cofres municipais.

"O que acontece na prática? O planejamento orçamentário inicial do município fica defasado ao pagar a equipe sem o recurso federal. O gestor tem que reduzir em outras áreas, ou fazer escolhas, porque o orçamento é único. O custeio do serviço continua mesmo sem o repasse. Quando o cidadão vai à UBS não sente a ausência da equipe, mas a assistência à saúde prejudicada", explica.

De acordo com a Política Nacional de Atenção Básica, o custeio da saúde é tripartite e deve estar garantido nos planos nacional, estadual e municipal de gestão do SUS (Sistema Único de Saúde).

O financiamento federal chega aos municípios por meio do Previne Brasil, do Ministério da Saúde.

Para o cálculo do recurso, são considerados quatro componentes: captação ponderada (número de pessoas cadastradas pelas equipes de saúde); pagamento por desempenho; incentivo financeiro com base em critério populacional e incentivos para ações estratégicas (contemplam a implementação de programas, estratégias e ações que refletem na melhoria do cuidado, como saúde bucal, consultório de rua, saúde na hora e outras).

"O Previne traz nova metodologia de repasse de recurso. Se não consigo cadastrar a população e vinculá-la a uma equipe, começo a ter perdas. Na divisão por perfil de município, o estado de São Paulo, que vem acumulando uma série de déficits, foi o que mais perdeu", diz Martins. "Uma das perdas é a de médicos não repostos."

O programa Médicos pelo Brasil, substituto do Mais Médicos, não tem conseguido enviar profissionais para compor as equipes. Com isso, o município perde o financiamento e não dá assistência adequada aos pacientes.

Segundo o Cosems/SP, a falta de uma política federal que apoie os municípios na fixação de médicos faz com que os gestores municipais ampliem a remuneração para conseguir contratar, sobrecarregando ainda mais as cidades que já investem mais de 25% de seus orçamentos em saúde.

Em 2022 (dados de setembro), o programa Médicos pelo Brasil disponibilizou 801 vagas para o estado de São Paulo. Destas, 222 foram ocupadas.

Maria Inez Padula Anderson, diretora-científica e de desenvolvimento profissional contínuo da Sociedade Brasileira de Medicina de Família e Comunidade, afirma que a falta do financiamento federal prejudica o atendimento aos pacientes.

"A falta do cofinanciamento pode afetar a remuneração dos profissionais de saúde, a qualidade da atenção prestada, diminuir insumos, o que vai criando uma situação de desgaste para o profissional. Fica complexo para manter a longitudinalidade, que é fundamental na atenção primária, ou seja, a garantia de quando eu chegar lá ter uma equipe que me conhece, estabeleceu um vínculo comigo e sabe a minha história", afirma ela.

Segundo a Secretaria Municipal da Saúde de São Paulo, em outubro, o Ministério da Saúde efetuou o repasse financeiro referente à 1.503 equipes do programa Previne Brasil.

A Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo disse à reportagem que, mediante à defasagem da tabela SUS e para ampliar a assistência à população, cumpre além de suas responsabilidades com a destinação extra para o Piso de Atenção Básica -em 2022, foram enviados R$ 289,4 milhões aos municípios.

Há investimentos também por meio de programas, como o Dose Certa, e repasses do Fundo Estadual de Saúde.