Comando Vermelho se expande e tenta criar 'cinturão' de domínio no RJ
RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) - A megaoperação policial que deixou nove mortos em diferentes regiões do estado do Rio de Janeiro, na última terça (27), tinha como objetivo apreender armas que são enviadas para a zona oeste da capital, área que o CV (Comando Vermelho) tenta dominar por completo, segundo a polícia.
Lideranças da facção também estavam na mira, mas teriam fugido para a Rocinha, na zona sul.
De acordo com investigadores, o CV quer criar uma espécie de "cinturão" entre a Baixada Fluminense, a zona norte e a zona oeste. Para isso, disputa as áreas que têm influência de milicianos e traficantes do TCP (Terceiro Comando Puro).
Atualmente há cinco grandes regiões em conflito: Barra da Tijuca e Jacarepaguá, na zona oeste; Penha, na zona norte; e Nova Iguaçu e Queimados, na Baixada Fluminense.
A polícia afirma que Edgar Alves, o Doca, apontado como um dos chefes mais antigos do CV, planeja a expansão desde janeiro de 2023, ao notar o enfraquecimento da milícia que atua na região.
Doca não tem advogado constituído. A reportagem não conseguiu contato com ele.
Interlocutores afirmam ter ouvido dele os planos de expansão.
De acordo com investigadores, hoje não há diferença na forma de atuar de traficantes e milicianos --ambos cobram taxas de moradores e vendem drogas. Investigações das polícias Civil e Militar apontam, no entanto, maior envolvimento de agentes públicos com milicianos do que com traficantes.
As diferenças entre as quadrilhas, segundo a Promotoria e a Polícia Civil, estão no modo de dominar o território. A milícia utiliza o medo difuso com ameaças e não há homens com armamento pesado nos acessos, nem barricadas ou pichações com símbolos das quadrilhas. Já o tráfico coopta crianças da própria comunidade para o crime e realiza mais ações assistencialistas em suas áreas.
Embora disputas entre facções sempre tenham existido no Rio, o traçado de um "cinturão" e da expansão em definitivo ocorreu após a morte de Rodrigo Dias, o Pokémon, apontado como chefe de milícia de Rio das Pedras, em janeiro de 2023.
Rio das Pedras é o berço da milícia do Rio e tem um dos mais rentáveis lucros da criminalidade. Somente com a exploração de vans, por exemplo, investigações da Draco (Delegacia de Ações Criminosas Organizadas) apontam lucro mensal de R$ 3 milhões.
Para dominar essa faixa territorial que vai da zona norte até a zona oeste, o CV empreende confrontos na região da Barra da Tijuca e em comunidades nas imediações, como Muzema, Tijuquinha e parte do Anil. Nessa grande área, a Gardênia Azul foi a primeira a ser tirada das mãos da milícia. A disputa teve várias mortes, e em 2023 os homicídios aumentaram 100% na zona oeste.
Traficantes utilizam a Cidade de Deus, reduto do CV, para ataques e roubos. Com a expansão na zona oeste, o TCP fez aliança com a milícia e envia reforços da Serrinha (zona oeste) e da Maré, na zona norte.
Na região vizinha, de Jacarepaguá, os confrontos ocorrem nas comunidades do Morro do Dezoito, Campinho, Praça Seca, Quintino, Tanque e Taquara. Essas comunidades ficam próximo do Parque Nacional da Tijuca, e traficantes usam as matas com roupas camufladas para as investidas. Há também, segundo a polícia, esconderijos subterrâneos na mata para armas e fugas.
A zona oeste é a principal área de disputa atualmente. Armas e homens, que são chamados de "equipes troias" pelos traficantes do CV, são enviados de diferentes regiões do estado para a região.
Já na zona norte os conflitos ocorrem entre as facções CV e TCP. Entre as comunidades em disputa estão Cinco Bocas, Guaporé, Quitungo, Cidade Alta, Pica Pau e Penha Circular.
Quitungo e Guaporé ficam perto do chamado Complexo de Israel, base dos traficantes evangélicos do TCP, e já foram tomadas pelo CV.
Na Baixada Fluminense, há confrontos principalmente entre milícia e CV. Em Nova Iguaçu, o tráfico quer tomar a região conhecida como KM 32.
Em Queimados, ataques do CV partem da comunidade São Simão, de um lado, com o objetivo de tomar o Morro da Torre, do TCP. As comunidades são divididas pela linha do trem, e paralisações no transporte sobre trilhos são frequentes devido aos tiroteios.
Em entrevista coletiva na terça-feira, o secretário de Segurança Pública do Rio, Vitor Santos, afirmou que a operação foi exitosa.
"Essa operação é uma resposta a invasões de todo o período pré-Carnaval e durante o Carnaval. Então, o serviço de inteligência teve informações que essa organização criminosa estava planejando outras invasões. O objetivo dessa operação foi tão somente estancar, paralisar essa tentativa, no sentido de proteger as pessoas que moram nessas comunidades, trazer tranquilidade para eles. Dentro desse contexto, entendo que a operação foi bastante exitosa."