'Cadê a turminha da carta pela democracia?', diz Bolsonaro sobre ordem do STF contra empresários
PORTO ALEGRE, RS (FOLHAPRESS) - O presidente Jair Bolsonaro (PL) cobrou nesta quarta-feira (24) os responsáveis pelas cartas pela democracia a se manifestarem sobre a controversa operação que, um dia antes, teve como alvo empresários bolsonaristas.
"Somos ainda um país livre. E eu pergunto a vocês: O que aconteceu no tocante aos empresários agora? Esses oito empresários. Eu tenho contato com dois deles. Luciano Hang e o Meyer Nigri. Cadê aquela turminha da carta pela democracia?", disse em fala a prefeitos e líderes evangélicos em Betim (MG).
"A gente sabe que em época de campanha continuam lobos em pele de cordeiro. Acreditar que eles são democratas e nós não somos? Cadê a turminha da carta pela democracia?", completou.
Depois, em novo discurso também na cidade, o presidente deu voz a um imigrante venezuelano, que contou as agruras da sua entrada no país por Roraima após uma caminhada de cinco dias. Depois de atacar o governo Nicolás Maduro e relacioná-lo à esquerda brasileira, Bolsonaro questionou a veracidade das pesquisas eleitorais que apontam vantagem do ex-presidente Lula (PT).
"O único lugar em que o Lula ganha é no Datafolha", disse o presidente.
Mais tarde, em Belo Horizonte, Bolsonaro caiu durante caminhada com apoiadores. O vídeo do tombo viralizou nas redes sociais.
A decisão do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes, presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), de autorizar buscas contra empresários bolsonaristas gerou novos atritos entre o Planalto e o Judiciário a pouco mais de um mês das eleições.
Os alvos da operação pedida pela Polícia Federal e autorizada por Moraes foram empresários de grupo de WhatsApp em que se defendeu golpe de Estado caso Lula vença Bolsonaro nas eleições presidenciais de outubro.
Além das buscas, Moraes determinou que os empresários sejam ouvidos pela PF e o bloqueio de suas respectivas redes sociais. A operação irritou o procurador-geral da República, Augusto Aras, e gerou questionamentos de advogados.
Entre os alvos estiveram Luciano Hang, da Havan, José Isaac Peres, da rede de shopping Multiplan, Ivan Wrobel, da Construtora W3, José Koury, do Barra World Shopping, André Tissot, do Grupo Sierra, Meyer Nigri, da Tecnisa, Marco Aurélio Raymundo, da Mormaii, e Afrânio Barreira, do Grupo Coco Bambu.
As conversas entre os empresários foram reveladas pelo site Metrópoles. Após a divulgação das mensagens, participantes do grupo negaram intenção golpista.
Advogados consultados pela Folha de S.Paulo veem com ressalvas a operação realizada nesta terça (23). O problema, dizem esses advogados, é saber se a ação foi baseada apenas nas conversas de WhatsApp ou se há outras circunstâncias ainda desconhecidas do público.
A depender dessas outras circunstâncias, caso elas existam, as medidas adotadas podem ser consideradas apropriadas. Até este momento, contudo, não foram divulgados os fundamentos da iniciativa policial.
Bolsonaro tem feito neste ano seguidos ataques ao sistema eleitoral e aos ministros do STF para acusar uma suposta fraude caso não vença as eleições. Também na fala em Betim nesta quarta, Bolsonaro declarou que "perder uma eleição na democracia é natural, faz parte da regra", mas não se comprometeu em respeitar o resultado em caso de derrota.
O sistema eletrônico de votação, porém, foi exaltado e ovacionado diante de Bolsonaro na posse do ministro Alexandre de Moraes como presidente do TSE, na semana passada.
A retórica golpista do presidente inclui ainda o flerte com as Forças Armadas, que participam de uma comissão de transparência eleitoral e, na prática, têm sido uma das linhas de frente do questionamento do presidente às urnas.
O ataque mais grave às urnas ocorreu em 18 de julho, quando ele chamou embaixadores estrangeiros para expor suas mentiras acerca das urnas e do processo eleitoral, repetindo argumentos já descartados após sua exposição em uma live no ano passado.
A reação veio no último dia 11, com um ato que reuniu milhares de pessoas para a leitura de duas cartas de apoio à democracia na Faculdade de Direito da USP. A primeira carta foi endossada por entidades como a Fiesp e centrais sindicais. Já a segunda, inspirada na Carta aos Brasileiros de 1977, ultrapassou 1 milhão de assinaturas.