Governo Lula negocia cargos com centrão e quer sobra de emendas para ampliar base

Por THIAGO RESENDE E JULIA CHAIB

BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - Auxiliares do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) já deram início às negociações com os principais partidos que foram aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

Líderes de Republicanos, PP e até PL abriram o canal com a articulação política do governo petista, apresentaram pedidos de cargos de segundo e terceiro escalões, e, em troca, prometeram ao Palácio do Planalto votos de parte de cada bancada.

A negociação tem sido no varejo e coordenada pela Secretaria de Relações Institucionais, comandada pelo ministro petista Alexandre Padilha.

O governo quer tentar selar a adesão de siglas menores, como Podemos, Cidadania e Solidariedade, até a próxima semana, quando deve ocorrer a reunião do Conselho Político -grupo de partidos aliados de Lula.

Em relação ao núcleo da antiga base de Bolsonaro, Padilha já se reuniu com o líder do partido na Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB). No PL, a conversa tem sido com o líder da sigla, deputado Altineu Côrtes (RJ) -que é próximo do presidente do partido, Valdemar Costa Neto.

O diálogo com o PP ocorre via o presidente reeleito da Câmara, Arthur Lira (AL), e alguns deputados da ala lulista da bancada, como Aguinaldo Ribeiro (PB), que deve relatar a proposta de reforma tributária na Casa. A função é disputada por ser uma pauta prioritária de Lula neste semestre.

Os três partidos não são da base de apoio do presidente no Congresso. O governo também não espera uma adesão formal deles no curto prazo.

Segundo articuladores de Lula, a negociação de cargos deve ampliar as alianças políticas. O foco principal é a Câmara, onde o grupo formado por PP, PL e Republicanos (maiores expoentes do centrão) tem mais força. Integrantes do Planalto dizem que essas tratativas ainda vão se estender ao longo de fevereiro.

O apetite dessas legendas é por cargos na cúpula de Codevasf (Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba), DNOCS (Departamento Nacional de Obras Contra as Secas), FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação) e Correios, entre outros.

A União Brasil também já apresentou interesse nessas posições. Por isso, a ideia é o governo distribuir uma estatal para cada partido e incluir no pacote outros cargos do Executivo de menor porte.

Nesta semana, o governo indicou que colocará em negociação uma diretoria do FNDE e três diretorias dos Correios. Essa negociação foi encampada pelo deputado Elmar Nascimento (União Brasil). Ele foi preterido nas indicações para o ministério de Lula.

O deputado seria o ministro da Integração Nacional, mas foi barrado pelo PT da Bahia. Depois disso, o governo teve de fazer acenos a Elmar.

Enquanto o impasse se mantém, o governo deve analisar o restante da lista de pedidos do centrão, que reúne indicações para cargos regionais, como coordenadorias e superintendências estaduais de estatais loteadas pelo centrão (Codevasf e DNOCS) e de outros órgãos, como o Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional).

A expectativa de articuladores de Lula é que, com as negociações, o governo poderá contar com cerca de 15 votos do Republicanos (cuja bancada é de 40 deputados) e cerca de 20 votos do PL (que tem 99 deputados). O apoio do PP ainda não está claro e depende de Lira, que tem se aproximado do Palácio do Planalto. O partido tem 47 votos na Câmara.

Como mostrou a Folha, o PT costurou um acordo com o Republicanos no fim do ano passado, em um primeiro movimento para futura adesão da sigla à base.

O partido apoiou a candidatura do presidente do Republicanos, deputado Marcos Pereira (SP), para a primeira vice-presidência da Câmara na eleição desta quarta-feira (1º) e diz que irá apoiar a candidatura de Jhonatan de Jesus (Republicanos-RR) para a vaga aberta no TCU (Tribunal de Contas da União), na votação desta quinta (2).

Outra estratégia para ampliar a base de Lula no Congresso é a distribuição de emendas. Auxiliares do presidente afirmam que a ideia é usar quase R$ 10 bilhões que estavam previstos para emendas de relator.

Esse tipo de emenda ganhou expressão no governo Bolsonaro e foi usado como moeda de troca em negociações políticas.

O instrumento fortaleceu Lira e o presidente reeleito do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). No ano passado, o STF (Supremo Tribunal Federal) declarou que essas emendas são inconstitucionais.

O centrão costurou acordo com o PT para redistribuir os recursos das emendas de relator antes previstos para 2023 e que somam mais de R$ 19 bilhões. Metade dessa verba foi repassada a emendas individuais --as que cada deputado e senador têm direito. O restante foi para o orçamento dos ministérios de Lula.

Apesar da decisão do STF, o Orçamento de 2023 mantém os recursos nas mesmas ações e projetos que já estavam previstos em acordos políticos entre líderes do centrão para as emendas de relator (quando elas ainda existiam).

Integrantes do Palácio do Planalto afirmam, sob condição de anonimato, que a articulação política do governo pretende usar a liberação desses recursos como negociação em votações importantes para Lula -como a reforma tributária e a nova regra fiscal a ser apresentada pelo Ministério da Fazenda.

Como parte dos R$ 9,85 bilhões que voltaram para as mãos do governo já havia sido moeda de negociação entre a cúpula do Congresso e parlamentares, aliados de Lula querem alinhar essas tratativas. A ideia é não descumprir acordos de Lira, que foi reeleito com um recorde de 464 votos na Câmara.

Líderes do centrão já afirmavam no ano passado que, embora tenham perdido o poder de execução das emendas de relator, querem que os R$ 9,85 bilhões repassados para os ministérios sejam liberados seguindo indicações de parlamentares. Agora, mesmo integrantes do governo Lula dizem que esses recursos devem ser usados para negociações políticas.