Senado evita iniciativas contra o Banco Central após Lula estimular pressão

Por THAÍSA OLIVEIRA

BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - Mesmo com a pressão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sobre o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, senadores descartam fazer uma ofensiva contra a instituição e cobram do governo o envio do novo marco fiscal para reduzir os juros.

Diante das críticas de Lula, o Senado aprovou um convite para que Campos Neto explique por que a taxa básica de juros (Selic) está em 13,75% ao ano --o maior patamar desde 2017. A audiência na CAE (Comissão de Assuntos Econômicos) está prevista para 4 de abril.

O requerimento para que Campos Neto vá ao Senado foi apresentado pelo presidente da CAE, senador Vanderlan Cardoso (PSD-GO), e já estava acertado com o próprio presidente do Banco Central desde o mês passado.

Não vai haver essa pressão [contra Campos Neto]. Até mesmo porque já ficou provado que não adianta. Então pressão política e frases de efeito não adiantou", afirma o presidente da CAE sobre a audiência pública.

O senador afirma que a ideia era ouvir também as impressões de Campos Neto sobre a nova regra fiscal, que vai substituir o teto de gastos. A ideia é que a proposta fosse divulgada após o retorno de Lula da visita oficial à China.

Com o cancelamento da viagem oficial por conta de questões de saúde do petista, há a possibilidade que o marco seja apresentado já nos próximos dias.

O líder do MDB, senador Eduardo Braga (AM), que integra o grupo, diz que o presidente do BC vai poder esclarecer o que tem baseado a decisão sobre a Selic, mas avalia que só o envio do novo arcabouço fiscal poderá influenciar a queda dos juros.

"Eu acho que vai haver um debate sobre a questão dos juros, mas não vai passar disso: um debate. Não é assim: 'o senador fulano de tal amanheceu de mau humor e vai cassar o presidente do Banco Central'", diz.

Na quinta (23), dia seguinte à decisão do Copom (Comitê de Política Monetária) que manteve a Selic em 13,75% ao ano, Lula disse que o presidente do BC não cumpre a lei e que o Senado precisa cuidar dele. O petista também voltou a se referir a Campos Neto como "esse cidadão".

"Quem tem que cuidar do Campos Neto é o Senado, que o indicou. Ele não foi eleito pelo povo, nem pelo presidente. Ele foi indicado pelo Senado. Se esse cidadão quiser, ele não precisa nem conversar comigo. Ele só tem que cumprir a lei que estabeleceu a autonomia do Banco Central."

Apesar disso, nem mesmo senadores próximos a Lula, como o líder da maioria, Renan Calheiros (MDB-AL), têm entrado na artilharia contra Campos Neto. Calheiros diz que o patamar da Selic é "imoral", mas que o parlamento não pode apenas fazer pressão contra isso.

"Todos que votamos pela independência do Banco Central queremos vê-la plena. O presidente [Campos Neto] tem tido até então uma relação boa com o parlamento", afirma Calheiros.

"Você não pode fazer apenas uma pressão para baixar os juros. É evidente que esses juros são imorais, mas tem que compreender as razões. O papel do parlamento é fazer esse debate, essa discussão. E não fazer pressão meramente."

O líder do Podemos no Senado, Oriovisto Guimarães (PR), que também é membro da CAE, diz que a possibilidade de tirar Campos Neto do cargo "é zero". O senador afirma que o "grande responsável" pelos juros "é o Executivo, que não propõe um marco legal".

"Possibilidade de rever a autonomia do Banco Central: zero. Possibilidade de interferir no mandato do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto: zero. Não há nenhum ambiente para isso no Senado", afirma.

"A autonomia do Banco Central é uma luta antiga da política brasileira. É um patamar civilizatório. E, se você não vai mexer com a autonomia do BC, muito menos com o presidente. Ninguém cogita propor uma coisa dessa", completa.

O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), tem afirmado que a autonomia do Banco Central é questão superada no Congresso, e que defende o diálogo entre Campos Neto e integrantes do governo federal.

O senador propôs uma audiência no plenário do Senado para ouvir, entre outras autoridades, o presidente do Banco Central e os ministros da Fazenda, Fernando Haddad (PT), e do Planejamento, Simone Tebet (MDB), sobre inflação, juros, e "retomada do crescimento".

O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), também tem dito a pessoas próximas que a chance de algum movimento contra o BC ou Campos Neto ir adiante no Congresso é mínima, mas avalia que falta sensibilidade da instituição em relação aos juros.