Hacker da Vaza Jato monitorava Paulo Guedes em tempo real, afirma juiz em sentença
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - A decisão que condenou à prisão Walter Delgatti, conhecido como hacker da Vaza Jato, afirma que ele monitorava em tempo real mensagens do então ministro da Economia Paulo Guedes, além de outras autoridades.
Nesta segunda-feira (21), o juiz federal Ricardo Leite, da 10ª Vara Federal do DF, decidiu pela condenação do hacker pela invasão de contas no Telegram em 2019, incluindo a do então juiz Sergio Moro, hoje senador pela União Brasil-PR, e do então procurador Deltan Dallagnol, ex-coordenador da Lava Jato.
A pena foi fixada em 20 anos e um mês de prisão ?cabe recurso.
"Verificou-se que Walter Delgatti monitorava em tempo real a conta do então ministro de Estado da Economia Paulo Guedes, além de outros 30 perfis do Telegram", afirma Leite na sentença, mencionando um relatório da Polícia Federal na época. É dito também que foram 99 as vítimas de interceptação online.
De acordo com o magistrado, em uma subpasta de arquivos, havia imagens e prints de telas de "diversas pessoas, entre elas procuradores da República, delegados de Polícia Federal, advogados, entre outros".
Para o magistrado, o fato indica que Delgatti não agia de forma idealista.
"Se o intuito, realmente fosse somente o de reparar injustiças, não teria hackeado o ministro Paulo Guedes e conselheiros do CNMP [Conselho Nacional do Ministério Público]. A amplitude das vítimas é imensa e poderia render inúmeras ocasiões de extorsões", disse.
O juiz, citando depoimento de outro acusado, diz que havia intenção de vender as conversas, "fato este confirmado por Luiz Henrique Molição, que relatou que buscavam o melhor jornalista (da Veja ou Folha de São Paulo) para comprar o material hackeado".
"Fulmina a alegação de Walter de que agiu de forma altruísta e buscando reparar uma injustiça, chegando inclusive a propor o valor de R$ 200 mil reais para o repasse deste material."
O jornal Folha de S.Paulo não paga por reportagens, não comete ato ilícito para obter informações nem pede que ato ilícito seja cometido nesse sentido.
Para o juiz, só houve um "esfriamento inicial" na intenção de venda do material "após perceber a resistência de jornalistas a pagarem para ter acesso a este material".
O site The Intercept Brasil, que primeiro publicou reportagens com base nos diálogos hackeados dos procuradores da Lava Jato, sempre afirmou que obteve o material de fonte anônima e que não houve nenhuma espécie de pagamento. Após o site permitir a análise de seu acervo, outros veículos também publicaram reportagens com as conversas, incluindo a Folha de S.Paulo.
A revelação das conversas abalou a credibilidade da Operação Lava Jato ao mostrar colaboração entre o ex-juiz Sergio Moro e os procuradores. Posteriormente, trechos dos diálogos foram lidos por ministros do Supremo Tribunal Federal para anular sentenças contra o hoje presidente Lula (PT), em 2021.
Com base neles, também foi invalidado o uso em processos judiciais do acordo de colaboração da empreiteira Odebrecht.
Na sentença desta segunda, o juiz Leite também disse que, segundo a PF, havia subpastas de arquivos hackeados de autoridades como o ex-procurador-geral Rodrigo Janot e o ex-ministro da Fazenda Henrique Meirelles.
Em relação ao senador Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), presidente do Senado naquela época, um relatório afirma que foi hackeado todo o histórico de mensagens.
Também há menção, sem detalhamento, à invasão do celular do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP). Em entrevista à revista Veja em 2021, Delgatti disse que não encontrou conversas ao invadir perfis dos filhos do ex-presidente Jair Bolsonaro.
O advogado do hacker, Ariovaldo Moreira, disse nesta segunda que ainda precisa analisar a sentença para se manifestar.
À Justiça a defesa tentou desqualificar os crimes imputados e questionou a atribuição da Vara Federal do DF para conduzir o processo. O hacker confessou na investigação e na tramitação do processo que invadia as contas no aplicativo.