Abin quer evitar novo caso GDias e propõe identificar quem acessa seus relatórios

Por MATEUS VARGAS E MARIANNA HOLANDA

BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - A Abin (Agência Brasileira de Inteligência) propõe mudar as regras para identificar quais autoridades tiveram acesso a relatórios elaborados pelo órgão.

A sugestão faz parte de um pacote proposto ao Palácio do Planalto com mudanças que a agência deseja implementar. O pacote também inclui reformular a composição do Sisbin (Sistema Brasileiro de Inteligência) e do Consisbin, um conselho que trata das atividades de inteligência.

O órgão de inteligência quer evitar episódios como o que foi registrado após os ataques golpistas de 8 de janeiro, dizem autoridades que acompanham a discussão.

Isso porque a Abin chegou a citar, em relatório, que o general da reserva Gonçalves Dias, ex-ministro do GSI (Gabinete de Segurança Institucional), havia recebido alertas dias antes das manifestações. O militar mandou alterar o documento, como revelou a Folha de S.Paulo.

O militar argumenta que os informes não chegaram por "canais oficiais".

O plano mais amplo da Abin ainda é levar ao Sisbin os órgãos que lidam com informações de inteligência em diversos ministérios, enquanto o conselho seria voltado para o debate entre ministros.

O texto com as sugestões da Abin já foi enviado para a análise na Casa Civil, sem previsão de finalização. Integrantes do Palácio do Planalto dizem que ainda há muita discussão pela frente e que a ideia de reformular as atividades de inteligência é bem anterior aos ataques de 8 de janeiro.

Integrantes da Abin dizem que o objetivo das mudanças é melhorar a coordenação, transparência e rastreabilidade das atividades de inteligência. O plano também inclui aumentar a troca de informações com estados e municípios.

Os informes de inteligência sobre o risco de ataque às sedes dos três Poderes foram enviados em grupos de WhatsApp e diretamente a alguns dirigentes de órgãos públicos ou autoridades, segundo relatos feitos à Folha de S.Paulo.

O uso do aplicativo para troca de informações de inteligência se tornou comum no governo Jair Bolsonaro (PL), durante a gestão de Augusto Heleno no GSI. À época, a Abin era comandada pelo delegado e atual deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ) ?hoje membro da comissão da CPI do 8 de janeiro.

Em fevereiro, o governo Lula (PT) decidiu transferir a Abin do guarda-chuva do GSI para a Casa Civil, comandada pelo ministro Rui Costa.

Em depoimento à CPI da Câmara Legislativa do Distrito Federal, GDias disse que o relatório da Abin que o colocava na lista de autoridades que tinham recebido os informes sobre os atos golpistas não "condizia com a realidade".

"A Abin respondeu [a solicitação do Congresso] com um compilado de mensagens de aplicativo, em que tinha dia e tempo, na coluna do meio o acontecido e na última coluna a difusão. Esse documento tinha lá ?ministro do GSI?", disse GDias.

"Eu não participei de nenhum grupo de WhatsApp, eu não sou o difusor daquele compilado de mensagens. Então aquele documento não condizia com a realidade. Esse era um documento. Ele foi acertado e enviado", afirmou ainda.

Gonçalves Dias pediu demissão do governo Lula em 19 de abril após a divulgação de imagens que colocavam em dúvida a atuação do GSI durante os ataques golpistas. Ele deve depor no Senado à CPI do 8 de janeiro nesta quinta-feira (31).

De forma geral, a Abin serve para fornecer informações estratégicas ao presidente da República e seus ministros.

A agência elaborou diversos relatórios sobre planos golpistas de apoiadores de Bolsonaro. Em dezembro, o órgão alertou sobre a presença de militares da reserva extremistas no acampamento montado em frente ao quartel-general do Exército, em Brasília.

O Sisbin é composto por 48 órgãos ?mais do que o dobro dos 22 integrantes de 2002, quando o sistema foi organizado. O plano da agência é reorganizar esse grupo, por exemplo, colocando como membro o órgão específico dentro de um ministério que trata de informações estratégicas, em vez de o gabinete do ministro.

O presidente Lula indicou o delegado da PF Luiz Fernando Corrêa para o comando da Abin. O nome foi aprovado pela Comissão de Relações Exteriores do Senado em maio.

Corrêa foi diretor-geral da PF no segundo governo Lula. Ele assumiu o comando da instituição no final de 2007, quando a corporação passava por crises decorrentes das primeiras grandes operações realizadas no governo petista.

Durante a sabatina no Senado, o diretor da Abin apontou como essencial garantir a rastreabilidade dos trabalhos da agência.

"O principal, que queremos adicionar, é a rastreabilidade, ou seja, quando os senhores, como controladores externos nossos, pedirem um dado sobre uma operação ou um relatório produzido pela Abin, nós queremos ter condições de rastreabilidade, de retornar, de refazer a engenharia reversa e não deixar qualquer dúvida. Isso é um compromisso nosso", disse ele.