Família Brazão mantém influência mesmo com líder sob suspeita no caso Marielle

Por ITALO NOGUEIRA

RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) - O grupo político do ex-deputado Domingos Brazão, atualmente conselheiro do TCE-RJ (Tribunal de Contas do Estado no Rio de Janeiro), continua com forte influência no estado, mesmo com seu líder sob investigação no assassinato da vereadora Marielle Franco (PSOL-RJ) e seu motorista Anderson Gomes, que completa seis anos sem solução nesta quinta-feira (14).

A família Brazão tem indicados na Prefeitura do Rio de Janeiro e no governo estadual. Mantém também representantes na Câmara dos Deputados, Assembleia Legislativa fluminense, Câmara Municipal da capital e de São João de Meriti.

O deputado federal Chiquinho Brazão (União Brasil) chegou a assumir a Secretaria Municipal de Ação Comunitária da gestão Eduardo Paes (PSD) em outubro passado.

Ele foi exonerado em fevereiro, uma semana após a divulgação de que o líder do grupo havia sido citado nas negociações para delação premiada do ex-PM Ronnie Lessa, acusado de ser o executor do crime contra a vereadora e o motorista.

Segundo levantamento do gabinete do vereador Pedro Duarte (Novo), a secretaria mantém até os dias atuais 15 pessoas nomeadas durante a gestão de Chiquinho.

"O loteamento da prefeitura a grupos políticos só tem aumentado, e não é diferente com a família Brazão, mesmo após tudo o que repercutiu na imprensa", disse o vereador.

Domingos Brazão afirma que a manutenção da influência de seu grupo político mostra confiança dos aliados no Rio de Janeiro. "Quem convive na política fluminense não dá crédito a essas suspeitas. Isso até nos conforta. Nada tem mais força do que a verdade", disse ele.

Ele diz que seu cargo atual o afastou das negociações por cargos na administração pública, mas reconhece que ainda participa de discussões do grupo político. "Conselheiro pode dar conselho. Não vou mais à rua. Mas a política está no nosso dia a dia."

Desde 2018 há suspeitas sobre Domingos Brazão no caso. Pessoas ligadas ao conselheiro foram acusadas de tentar atrapalhar as investigações com uma falsa testemunha.

O próprio ex-deputado chegou a ser nomeado como mandante do crime contra a parlamentar pela ex-procuradora-geral da República Raquel Dodge numa denúncia que o envolvia na tentativa de obstruir a apuração. Contudo a Justiça arquivou a acusação contra o ex-deputado.

O conselheiro nega as acusações. Afirma já ter sido investigado por quase seis anos no caso e que nunca foi encontrado nada contra ele.

Procurados por meio de suas assessorias de imprensa, Paes e o governador Cláudio Castro (PL) não comentaram a influência do grupo em suas administrações. Chiquinho Brazão também não retornou.

Chiquinho foi nomeado em outubro no primeiro escalão da prefeitura como parte de um acordo com o Republicanos para o apoio à reeleição de Paes. Quatro meses depois, foi substituído pelo ex-deputado Ricardo Abraão (União Brasil).

Os dois integram a União Brasil, mas já comandam o Republicanos na capital, para onde vão se transferir assim que abrir a janela partidária.

A nomeação gerou bate-boca na Câmara Municipal em dezembro, quando a Casa analisava as contas do ex-prefeito Marcelo Crivella (Republicanos). A base de Paes atuou pela aprovação para evitar rusgas com a sigla aliada.

A vereadora Mônica Benício (PSOL), viúva de Marielle, afirmou que a nomeação do secretário lhe causava "náuseas". "Queria dizer que estou surpresa, mas estaria mentindo. Para se manter no poder, o atual prefeito já deixou nítido que vale tudo, até se aliar com quem ele mesmo responsabilizou pela destruição do Rio de Janeiro."

O vereador Waldir Brazão (ex-chefe de gabinete do deputado estadual Manoel Brazão, irmão de Domingos) afirmou que a morte de Marielle era a "única pauta" da vereadora e saiu em defesa do grupo político.

"O [ex-deputado Marcelo] Freixo prendeu um monte de gente na CPI das Milícias e a gente passou batido, como vem passando batido em tudo. A menos quando querem se aproveitar do nome que a gente tem. Do que a gente construiu. Toda vez que ela fizer isso, eu vou responder. Cada vez num grau maior", disse ele.

Mônica respondeu: "Sinto muito que o senhor tenha sido pressionado a vir ao microfone fazer esse tipo de fala. [...] Quem disse da possibilidade do envolvimento da família Brazão foi a Polícia Federal. Não fui eu. O final do processo está chegando. E aí os nervosos podem ficar mais nervosos ainda, porque é uma questão de tempo. [...] A execução dela irá transformar a política e o submundo do Rio de Janeiro quando a revelação dos nomes dos mandantes e todos os envolvidos, chegarem ao conhecimento público."

No governo estadual, o grupo mantém como área de influência a Companhia Estadual de Habitação. O diretor financeiro da estatal é Flávio Brazão, sobrinho de Domingos e filho de Pedro. O vice-presidente da estatal, Guilherme Bencardino, também se apresenta como um dos representantes da família em suas redes sociais.

Bencardino afirmou, em nota, que "qualquer relação política que mantenha fora da instituição não interfere no trabalho desempenhado e nem determinou sua nomeação para o posto". Flávio não comentou até a publicação dessa reportagem.

Domingos defendeu a nomeação dos dois. "Você precisar ver o currículo deles. Os dois estudaram e se aperfeiçoaram. Meu sobrinho deve ter umas dez pós-graduações."