Cerca de R$1,5 milhão em emendas são destinados para procedimentos animais em Juiz de Fora, mas Prefeitura não utilizou o recurso

Impacto da falta dos procedimentos e aumento no número de casos de abandono de cães na cidade

Por Renan Ribeiro

Abandono de filhotes de cães aumentou em Juiz de Fora

Duas emendas parlamentares foram destinadas à Prefeitura de Juiz de Fora entre 2020 e 2023 para ações relacionadas à causa animal. A primeira, no valor de R$1.000.141,89, encaminhada para o uso em ações estruturais  e, a segunda, no valor de R$450 mil em transferência especial, valor que deveria ser destinado especificamente à realização de 10 mil procedimentos de esterilização de cães e gatos. Ambos os valores foram destinados pelo deputado estadual Noraldino Júnior (PSC).

O Acessa questionou a Prefeitura de Juiz de Fora (PJF) sobre a forma como os recursos foram empregados e se há alguma previsão para a realização das cirurgias, mas o Executivo não quis se manifestar.

Noraldino encaminhou um ofício em abril de 2022 para a PJF, por meio do qual demonstrou preocupação com o bem-estar da população de animais domésticos de Juiz de Fora. Segundo o parlamentar, não houve retorno sobre a utilização desses recursos. “Sequer do quanto foi aplicado na pasta ou ainda em que ações foram gastos os referidos valores.” O deputado sugere que seja realizado um programa robusto, que privilegie a causa animal a ser custeado com emendas da autoria dele.

No corpo do ofício Noraldino ainda cita as condições do Canil Municipal, para as quais pede atenção e melhorias que vão da estrutura aos instrumentos utilizados na lida com os animais, incluindo a qualidade da alimentação e da água. Ele ainda salientou que aguardava providências urgentes e a manifestação de interesse em receber suporte financeiro para ações que beneficiem os cães e gatos.

Para a presidente da Sociedade Protetora dos Animais de Juiz de Fora (SJPA), Maria Elisa de Souza, o impacto prático e direto da falta de cirurgias de esterilização na cidade é o crescente número de abandono de animais. “A cadela entrou no cio, foge da residência, ela tem o instinto de sair e perambular. Há, também, o fato de que muitas pessoas colocam esses animais para fora. Ocorrem procriações indesejadas e, assim, o número de cadelas e ninhadas abandonadas em montes de lixo, em depósitos de beira de estrada aumenta consideravelmente”, afirma.

O abandono, que teve um crescimento verificado pelos protetores de animais durante a pandemia, segundo Maria Elisa, continua aumentando mesmo após o período de emergência em saúde. “Durante a pandemia, conseguimos entender alguns dos motivos que levaram ao abandono. Seja por morte do tutor, ou até mesmo por perda de condições financeiras das famílias. Mas, depois da pandemia,o número continua aumentando, muitas pessoas continuam abandonando seus animais.”

Necessidade de ação do Poder Público

As ações em prol do bem-estar animal, costumam ser, conforme a presidente da SJPA, Maria Elisa de Souza, os primeiros alvos de corte quando ocorrem as crises. “Esse é o tipo de coisa que nos deixa muito chateados e preocupados. Porque as cirurgias pararam, mas elas não retornaram.Estamos sem castração há mais de um ano e isso é muito grave”, reflete.

Para ela, ações promovidas por iniciativas como Organizações Sem Fins Lucrativos (Ongs) como realização de castrações em ‘Castramóveis’ não são suficientes para resolver a questão. “Enquanto há uma unidade realizando operações no Linhares, há cadelas no cio em São Pedro, Santa Luzia, Milho Branco, então não soluciona. Se essas pessoas procuram a SJPA, certamente elas também buscam pelo Poder Público.” Ela salienta que é preciso desenvolver uma forma de controle das populações de cães e gatos abandonados com ações mais próximas das localidades, em especial, das periféricas. “Os ônibus recebem de tudo, de cadela prenha à cadela doente e, até mesmo, animais que não precisam ser castrados. Isso não é registrado, não gera dados, tem que ser acompanhado por quem possa fazer a gestão dessas informações”, pondera Maria Elisa.


“O ideal seria ter uma clínica em cada região que recebesse uma verba para realizar as cirurgias e fazer uma gestão e acompanhamento dos dados, com uma interlocução com algum setor que tenha esse controle social também na Prefeitura. A castração é uma questão importante de saúde pública, a população aceita e quer esse controle. Dessa forma, conseguimos valorizar o animal. Ele deixa de ser um bicho indesejado e passa a ser visto como, de fato, um animal de estimação.” Pela experiência na proteção animal, Maria Elisa afirma que onde há trabalho feito com esses ônibus, ocorre o aumento do número de casos de abandono.

Em um cálculo feito há alguns anos, Maria Elisa explica que apenas uma cadela pode dar origem a 2.400 filhotes. Isso ajuda a explicar a centralidade e importância da esterilização dos animais para o controle populacional. “Trabalhar esse projeto de castração de maneira digna, sem politicagem no meio, vai nos levar a conseguir uma diminuição de animais em situação de abandono.”