Calouros devem ter direito é não participação no trote garantido

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Calouros devem ter direito ? n?o participa??o no trote garantido
Juliano Nery 5/3/2012

Rito mercantilizado

Além das tradicionais congratulações aos estudantes que ingressam nesta segunda-feira na Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), alerto aos calouros que tomem muito cuidado: os tradicionais trotes, outrora brincadeira de boas vindas àqueles que farão parte dos diversos cursos disponíveis no campus, promete ganhar novas roupagens nada democráticas, neste semestre. Circulou pela internet na última semana, uma listagem elaborada por veteranos com valores financeiros para evitar a realização de certas brincadeiras com os novos alunos, como raspar a cabeça, não rasgar roupas, não aplicar produtos na pele... O que era para ser apenas um rito de passagem anda, na verdade, é passando dos limites, ano após ano. E, agora, com uma roupagem capitalizada...

Deixo claro que, em minha experiência acadêmica, nunca vi nada demais na realização do trote, desde que resguardados certos limites, sendo o principal deles, a vontade de participar da brincadeira. Quando estudante, participei do trote, tanto como calouro, quanto como veterano. E fiz muitas amizades a cada novo semestre, quando aportavam mais e mais calouros. Tudo porque nunca passou de uma brincadeira. A maioria não via problema em participar. Era uma forma de identificar e se identificar entre os seus pares. Muitas histórias engraçadas nasceram destas ocasiões. Logicamente, que minha percepção não vale para todos. Alguns cursos à época, na própria UFJF, já praticavam brincadeiras desrespeitosas e, ocasionalmente, sempre se divulgava um ou outro excesso, de gente que não entende o real sentido do trote, mero rito de passagem.

Talvez seja a queda de cabelo ou até mesmo alguns fios brancos na barba que me fizeram refletir, mas discordo desta mercantilização do trote. Estranho pensar que aqueles trocados pedidos nas ruas, que em outros tempos serviam apenas para os colegas de curso se confraternizarem com cervejas em botequins do centro da cidade, tornaram-se, em algumas ocasiões, motes para megaeventos, com banda, DJ e bebida liberada, cobrando ingresso, inclusive, de quem desce às ruas para arrecadar o dinheiro. E agora esta notícia de estabelecimento de valores para os que não querem participar... Vai ver que foi ali, na minha própria geração, que algo se encarregou de conduzir do vértice da causa até a ponta desta seta de consequência... E se o saldo é este, admito que não tem se tornado uma boa prática.

Sou a favor das iniciativas solidárias de toda sorte, como campanhas de doação de sangue, visitas aos asilos, doações de alimentos e de roupas para quem precisa. E, porque não, de tomar cerveja com os novos companheiros de jornada. E aproveito para salientar à parcela da população que é contra ao trote e a pedir esmola no trânsito, que a questão é simples de resolver: basta não colaborar com dinheiro. É uma forma simples e democrática de discordar. Como devemos sempre ser, aliás. Um item que parece ter sido esquecido por alguns universitários que andam impedindo o direito da não participação por parte dos ingressantes. No mais, cerquemos os novos universitários de boas vindas e fiquemos na torcida para que, ao se tornarem veteranos, estabeleçam outro tipo de prática para os próximos colegas que estarão por vir.

Juliano Nery deseja aos universitários um excelente início de aulas.

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Juliano Nery é jornalista, professor universitário e escritor. Graduado em Comunicação Social e mestre na linha de pesquisa Sujeitos Sociais, é orgulhoso por ser pai do Gabriel e costuma colocar amor em tudo o que faz.