A criança e o urbano
A criança e o urbano
Uma característica fundamental da relação das pessoas com o espaço urbano é a apropriação do mesmo. Espaços são pensados e projetados para fins específicos, que não passam de intenções. É no seu uso que eles ganharão forma de fato, através das diversas necessidades e percepções de cada usuário. Um mesmo espaço terá diferentes significados e diferentes apropriações por diferentes pessoas. São elas que os formatam e não o contrário.
Crianças se apropriam dos espaços muito naturalmente, até mesmo, e principalmente, daqueles que não foram projetados para elas, dando a estes novas formas e usos não imaginados. Elas ressignificam os lugares que usam, tanto para si quanto para sua família, ao trazerem novas demandas.
Nesse processo de apropriação surge o sentimento de identidade e pertencimento da criança com sua rua, seu bairro ou sua cidade. Através das relações afetivas surgidas pelo fruir e brincar nesses locais.
No espaço público também acontece o convívio social com outras pessoas fora do círculo familiar. Através deste, a criança se depara com a diversidade e com a aleatoriedade, e tem a oportunidade de desenvolver a tolerância e de perceber esse outro como parte integrante do grupo ao qual ele também pertence: sua comunidade.
Crianças que desenvolvem esse tipo de relação com o urbano, com autonomia e liberdade, viram protagonistas da cidade. Percebem que o público é seu e é de todos. Se tornam cidadãos que respeitam e cuidam dos espaços, sabem respeitar regras, conviver em grupo e respeitar as diferenças.
Estimular a criança a ser participativa e se apoderar da cidade, ocupando seus espaços, discutindo e opinando sobre a mesma, leva a posturas de engajamento e participação ativa nas transformações políticas e sociais. Consolida o sentimento de coletividade. Essa sensação tão importante, que vem se desfazendo na sociedade do individualismo, de que fazemos parte de um todo.
E com isso ela pode perceber que a cidade deveria oferecer a todos a oportunidade de uma vida plena. Ou, no mínimo, espaços públicos mais democráticos, inclusivos e flexíveis.
Fica o convite: aproprie-se da sua cidade. Se você não tem espaços de lazer em seu bairro, saia para caminhar pela rua com seus filhos. Observem o que sua rua e seu bairro tem de ruim e o que ele tem de bom. Conversem sobre o que poderia ser mudado e melhorado para todos que vivem ali e como isso poderia ser feito. Vai ser um ótimo exercício para o senso crítico de suas crianças e de sua família. Dessa conversa podem surgir ideias surpreendentes que podem virar projeto que podem virar realidade. Dê esse presente a seus filhos e a sua cidade.
*Arquiteta