Paradoxo da escolha | Mil e uma possibilidades do desassistir

Confira a colua Metaversos da semana.

Por Anderson Santos e Diogo Pereira

Controle remoto

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São 21:20 e o casal consegue, enfim, chegar em casa. Após ligar as luzes e um bom banho, decidem ver TV para relaxar e anestesiar-se da longa rotina de quinta.

Jogados no sofá, o controle remoto em mãos, prontos para a jornada pelo universo infinito dos catálogos de streaming. Entre documentários sobre a vida marinha, séries de comédia romântica e novelas com dramalhões mexicanos, eles veem-se em um labirinto de opções. "Que tal essa série sobre um chef que também é espião?", sugere um. "E esse filme onde os gatos dominam o mundo?", pondera o outro. As horas passam, e eles assistem aos trailers como quem degusta um banquete visual, mas sem nunca se decidir por um prato principal.

À meia-noite, a TV continua ligada, exibindo a tela inicial de mais um serviço de streaming, enquanto o casal, vencido pelo sono e pela indecisão, repousa em um abraço sonolento. A sala é iluminada apenas pela luz da tela que permanece ali, rotineiramente." E assim, adormecem, não com os créditos de um filme, mas com a promessa de uma nova noite de escolhas.

Bom! O problema está em casa. Sendo assim, decidem retomar os bons tempos das idas ao cinema. Ao entrar na sala escura, envoltos ao cheiro agridoce das guloseimas típicas do lugar, acomoda-se em suas poltronas, ansiosos pelo início do filme e torcem para que a exibição seja isenta de ruídos de celular ou burburinhos desnecessários.

Distraídos, absorvem a narrativa de mais um drama requentado e a magia é logo desbotada ao primeiro devaneio de um deles que cochila, enquanto o outro diminui a luz da tela e começa a responder mensagens nas redes sociais.

Nesta era do entretenimento sob demanda, o paradoxo da escolha nunca foi tão palpável. A abundância de opções parece uma benção, mas, como nosso casal descobriu, pode rapidamente se tornar uma maldição. A ironia é que, enquanto eles navegavam pelo mar de possibilidades, o verdadeiro tesouro era o tempo que passavam juntos, na espera de um novo lançamento, sabe Deus lá quando, assim como a trilha sonora marcante que seria ouvida repetidas vezes no CD favorito.

Uma simples decisão de escolher um filme ou série tornou-se secundária à experiência compartilhada de explorar, rir e, eventualmente, adormecer juntos, pois o conteúdo pode ser revisado, entrecortado noutra ocasião, né?

O que isso nos diz sobre a natureza do entretenimento hoje? Estamos realmente buscando algo para assistir, ou estamos apenas procurando uma maneira de preencher o vazio, de compartilhar um momento, de adiar o fim do dia? Talvez o que realmente valorizamos seja a jornada e não o destino; o ato de procurar, não o de encontrar.

Em um mundo onde tudo está ao alcance de um clique, talvez o que estejamos realmente procurando seja uma conexão, um sentido de pertencimento e a doce satisfação da companhia mútua para estarmos antenados nos lançamentos, nos TOP 10 do momento.

Assim, enquanto o casal dorme, a tela escura zomba silenciosamente de suas vidas atribuladas, brilhando como um farol para os navegantes sem eira nem beira. Mas, no fundo, ela sabe que sua luz é apenas um pano de fundo para as verdadeiras histórias que se desenrolam diante dela - histórias de amor, de vida e de sonhos compartilhados. E talvez, apenas talvez, essa seja a maior certeza de todas; ou não!