A crueldade de um homem, é o pragmatismo de outro: O assassino (Netflix 2023)

Com cenas muito bem elaboradas, o filme possui uma fotografia impressionante que possibilita o espectador experimentar a tensão

Por Clayton Inacio da Silva

O ASSASSINO (Netflix 2023)

Um homem, uma arma, um alvo. Uma sinopse comum em filmes de matadores de aluguel, e ainda assim, surge o questionamento: é possível uma premissa como essa, se desenvolver longe da trivialidade? Em O Assassino, David Fincher, prova que é possível.


Em seu novo filme, o diretor de grandes obras como Garoa Exemplar, Zodíaco e Clube da luta conta a história de Killer, um personagem que não tem nome (ou têm vários), que, após falhar em uma missão, recebe retaliação através de um atentado contra uma pessoa de sua família. Com isso, ele resolve ir atrás dos responsáveis pelo ataque, numa missão de caça e vingança.


Como dito, a premissa dessa história não foge das tantas outras produções que possuem o mesmo enredo para o gênero. O que se destaca no novo longa de David Fincher, é a sua destreza em conduzir uma narrativa interessante, onde o personagem principal parece estar em uma sessão de psicanálise. Killer conversa o tempo todo com o espectador, criando uma atmosfera em que ele é o paciente deitado num divã, e o público, seu analista.


E logo nos primeiros oito minutos de filme, fica pré-estabelecido que a violência tão presente nas tramas do gênero, aqui não será o foco de atenção. E não é que as cenas de brutalidade e ação não existam. Elas estão presentes durante as quase duas horas do longa, mas são usadas como elementos quase poéticos, ante o discurso do protagonista, em justificar o seu trabalho.


E é aí que o filme se consolida como uma obra magnífica. Por combinar elementos de crises existenciais do ser humano e suas ações, ora tão perversas, mas que só são assim consideradas, quando olhamos para uma ação violenta, sem se dar conta que muitas vezes, a maior violência está no discurso, na manipulação que muitas vezes o ser humano se utiliza para obter o que quer.


Com cenas muito bem elaboradas, o filme possui uma fotografia impressionante que possibilita o espectador experimentar a tensão, enquanto uma arma é montada e apontada para um alvo, ou quando uma simples invasão em uma residência acontece, causando a sensação de que algo imprevisível pode acontecer. E, mesmo com a previsibilidade de alguns acontecimentos, há ótimos momentos (em especial os de confronto) em que o público é tomado por um ato inesperado do protagonista, que choca e ao mesmo tempo, impede que se tome partido, ante ao que a trama tenta justificar. E Michael Fassbender não só surpreende com sua performance de um homem violento, causando um misto de repulsa e empatia do público, como consegue convencer que suas ações são justificáveis a ponto de seu personagem não ser subjugado.


The Killer é um filme que superficialmente se enquadra em uma obra comum de seu gênero quanto à premissa, mas que se destaca pelos seus diálogos de persuasão e analogia, que utiliza a violência como cortina para o discurso filosófico do seu enredo, resultando em uma trama original, interessante e muito bem conduzida, que merece ser assistida.


Nota: 8