Bruna Linzmeyer vive mulher desfigurada em 'Medusa'

Por JÚLIO BOLL

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Melissa, personagem de Bruna Linzmeyer, é uma das vítimas de um grupo de mulheres "belas, recatadas e do lar" em "Medusa", longa que estreia nesta quinta-feira (16) nos cinemas. Atacada simplesmente pelo fato de não seguir o molde de vida delas, Melissa dá um grito grave que chega a assustar o espectador, nos primeiros minutos do filme de Anita Rocha da Silveira.

São claras as referências a mulheres contemporâneas conservadoras e de direita, como Michelle Bolsonaro e Damares Alves. "Uma coisa muito assustadora dos últimos quatro anos foi a quantidade de horror acontecendo no mundo, mas sem uma reação a isso. Muita gente fingindo que nada estava acontecendo. O descaso frente ao horror", diz Bruna à reportagem.

Em "Medusa", a trama acompanha Mariana (Mari Oliveira), jovem integrante de uma seita de jovens religiosas que pregam durante o dia, planejam se casar com os integrantes do Vigilantes de Sião, um grupo que lembra o movimento "red pill" e , à noite, se unem para agredir mulheres fora de seus padrões: aquelas com algum tipo de comportamento que considerem promíscuo. Usam roupas decotadas e beijam em público, por exemplo.

Atacada pela gangue logo no início do filme, a personagem de Linzmeyer gera curiosidade por passar boa parte do filme usando uma máscara. É exatamente esse recado que chamou a atenção da atriz para participar da produção, um dos destaques do Festival de Cannes em 2021.

Medusa é uma das mais emblemáticas personagens da mitologia grega, e "musa" de uma das maiores obras do pintor Caravaggio. Reza a lenda (a mais popular delas; há outras versões) que era uma mulher extremamente bonita e sedutora. Enciumada e irada, a deusa Atena a transformou num monstro com cabelos de cobra, capaz de transformar em pedra quem olhasse diretamente em sua direção.

"O mito da Medusa fala dessa punição da mulher ser por punida por ser considerada 'devassa e pecadora', como é dito no filme", afirma Linzmeyer. "O julgamento que existe das mulheres, umas com as outras, é uma punição também. Tem muito trabalho pela frente para que isso diminua, e também para haja menos feminicídio".

Reconhecida por seu ativismo feminista e em favor do movimento LGBTQIA+, a atriz também integrou o elenco do curta "Uma Paciência Selvagem Me Trouxe Até Aqui", que fala sobre vivências lésbicas. Seus próximos projetos acabam sendo uma forma de dialogar mais sobre este universo. "É uma subjetividade que carrego na minha vida, por ser uma mulher, artista, sapatão nesse mundo, tenho isso para contribuir. Me interessa falar sobre isso", reforça.

"Será que a gente pergunta para uma mulher heterossexual se ela faz só personagem hétero? Meus projetos autorais têm esses recortes e camadas que me interessam, e há uma lacuna de mercado de ter projetos especificamente lésbicos, bissexuais e trans não-binários", pontua a atriz.

Em "Medusa", é possível perceber um dos maiores debates sobre o movimento feminista ?o quanto mulheres apontam o dedo umas às outras. Bruna considera que a misoginia e o ódio entre mulheres reforça o machismo estrutura. Por isso tem feito um exercício de empatia e tentado alterar essa realidade.

"Quem me aponta dedo, e julga, eu faço um exercício de empatia, já que a pessoa deve estar tão oprimida a ponto de não ficar feliz com minha felicidade. Quando olho para essas mulheres que atacam outras, eu tento falar: 'Sai daí, é mais divertido não apontar dedo, não regular corpo de outra mulher'", finaliza.