Vintage Culture e Duke Dumont agitam pistas do Só Track Boa com batidas intensas e luzes neon

Por ALESSANDRA MONTERASTELLI

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Quando o relógio deu meia-noite, a pista do mainstage já estava inundada de pessoas. O público preenchia cada metro do gramado disponível para o palco principal no Autódromo de Interlagos, formado por estruturas que lembram um aglomerado de edifícios --ou uma paisagem urbana de "Blade Runner", ao estilo cyberpunk. Com cerca de 13 andares de altura, os painéis projetam animações neon intercaladas a painéis de led, possibilitando um show frenético de luzes que acompanham os ritmos dos DJs.

Dali a meia-hora, iniciou a contagem regressiva para uma das atrações mais esperadas da madrugada. Vintage Culture, dj brasileiro de fama mundial e idealizador do festival de música eletrônica Só Track Boa, arrancou gritos e pulos contínuos do público ao começar sua apresentação com uma série de fogos de artifício e "Tina" -música de batida dançante que narra uma paixão intensa, rápida e angustiante com uma moça que se parece muito com Tina Turner.

A track foi uma das mais recentes lançadas por Lukas Ruiz, junto dos DJs Meca e Bhaskar -irmão gêmeo de Alok, que se apresentará na madrugada de sábado no palco Garden, o segundo do festival que acontece nesse final de semana em São Paulo. O show de Ruiz, o Vintage Culture, correspondeu a fama do DJ por suas produções exageradas e pirotécnicas: junto dos fogos de artifício e as projeções, lazers, jatos de fogo no palco e até um show de drones acompanharam as mixagens do brasileiro.

O remix robotizado de "Day n Night", clássico dos anos 2000 de Kid Cudi, e as músicas "Somebody That I Used to Know", de Gotye, e "Drinkee", de Sofi Tukker -esta um dos grandes sucessos de Vintage- foram algumas das faixas mais comemoradas da apresentação, que foi substituindo o tom festivo por graves mais densos no final do show, quando a ucraniana Korolova subiu ao palco para mixar junto com Vintage Culture. Ambos chegaram a erguer as bandeiras brasileira e ucraniana, em solidariedade ao país que vive em guerra.

O show duplo substituiu a esperada apresentação do Meduza, headliner que cancelou sua presença no Festival 16h antes de subir ao palco. O trio italiano divulgou, através de sua conta no Twitter, que seu voo ao Brasil foi um dos mais de 150 cancelados pela British Airways após uma falha técnica. O grupo é destaque mundial nas pistas de house music desde o lançamento de "Piece of Your Heart", em 2019, junto do grupo inglês Goodboys -indicada ao Grammy de melhor música dance no ano seguinte. Com letras intensas que descrevem paixões, emoções contraditórias e a vida noturna, o trio já afirmou que a música das décadas de 1970, 1980 e 1980 é fonte de inspiração para suas composições.

Semelhança compartilhada com Vintage Culture, que iniciou a carreira fazendo remixes de "Blue Monday", do New Order, "Another Brick in the Wall", do Pink Floyd, e "Bete Balanço", de Cazuza -que viralizaram nas redes sociais. O nome artístico "Vintage Culture" foi uma homenagem aos grupos de eletrônica dos anos 1980, responsáveis pelos primórdios dos estilos techno e house, que misturavam a música afro-americana, como jazz, funk, dance music e electro com as composições eletrônicas de grupos como Kraftwerk.

Apesar de ser comum em festivais grandes de música artistas internacionais ganharem mais destaque, não foi o caso na madrugada de sexta no Autódromo: o show de Vintage Culture chegou a desfalcar o início da apresentação do francês Dombresky, no palco vizinho. Dj de grande sucesso nas pistas internacionais, sua faixa "Soul Sacrifice" virou hit ao misturar o ritmo dançante do groove a um saxofone instrumental.

Antes disso, a dupla italiana Giolì e Assia -que tem a faixa "Quedate" junto de Pabllo Vittar- se apresentou vestindo camisas da seleção brasileira. As artistas fizeram sucesso na cena underground internacional por misturar a discotecagem techno a instrumentação ao vivo e canto.

Mas foi quando o brasileiro Illusionize subiu ao palco que o gramado do Garden ficou totalmente preenchido. Conhecido pelo enfoque em experiências visuais, o DJ começou seu show com um remix de "My House", de Chuck Roberts, lançada em 1987, quando a house music se desenvolvia e popularizava entre a comunidade afroamericana de Chicago.

Os versos "I am the creator and this is my house/ And in my house there was only house music/ But I am not so selfish/ Because once you enter my house/ It then becomes our house and our house music" ("Eu sou o criador e essa é minha casa/e na minha casa tinha apenas musica house/mas eu não sou egoísta/ porque ao entrar na minha casa/ela se torna nossa casa e nossa musica house") são entoados como em um sermão religioso por Roberts, enquanto o telão mostrava um olho enorme e hiperrealista -até que os graves de Illusionize levaram a tremer o chão e arrancaram gritos do público.

Diferente das edições anteriores, o palco Garden não conta mais com um teto forrado de plantas --que remetia a uma estufa. Com um enorme telão, as projeções e efeitos cênicos podem ficar a cargo do DJ, motivo pelo qual Duke Dumont, longe do Brasil há 7 anos, decidiu se apresentar no palco menor. O inglês se tornou referência mundial da dance music em 2014, com "I Got U" -indicada ao Grammy na categoria melhor música dance no mesmo ano.

Iniciando com o hit "Red Light, Green Light", o ator Shaun Ross incita, em gravação projetada no enorme telão atrás de Duke, o público a dançar no ritmo da mixagem. A irreverência continuou em "Burn Dem Bridges", em que a batida rápida junto a sentença "burn the bridges" ("queime as pontes"), somada a imagem de um carro policial pegando fogo na tela, levou quem assistia a dançar mais intensamente. A última apresentação no palco principal, a cargo do melodic techno de Korolova -vertente considerada mais cru e conceitual do gênero -acompanhou o nascer do sol em tons de laranja e amarelo.