Valorização dos cidadãos ou simples interesse nos novos consumidores?
Valorização dos cidadãos ou simples interesse nos novos consumidores?
Ao longo da última década, em particular a partir do fim de 2003, a pobreza declinou de forma acentuada no Brasil, fator que, associado a outros, promoveu a entrada de milhares de famílias na chamada "nova classe média". Segundo estudo organizado pela Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República (SAE/PR) para um seminário realizado em 2011, esta "nova classe C" é predominantemente jovem e composta por expressiva fatia de afrodescendentes1. Outros aspectos:
- Os jovens da classe C, mais educados e conectados, são hoje os formadores de opinião na família e na comunidade
- 68% dos jovens da classe C estudaram mais que os pais
- A nova classe média não deseja o estilo de vida das elites e prefere produtos que valorizam a sua origem
- Em 2009 a classe C foi responsável por R$ 881 bilhões dos gastos com consumo – a maior fatia do total de R$ 2,2 trilhões do país
Outro estudo, intitulado Vozes da Nova Classe Média, também da SAE, ao analisar trabalho e renda como fatores de ascensão, menciona que este processo vivenciado pelos brasileiros possibilitou que segmentos da população historicamente marginalizados dos circuitos financeiros tivessem à sua disposição linhas de crédito e bens de consumo antes inacessíveis: "Todo esse processo de mudança resultou em melhoria das condições de vida e de consumo das famílias brasileiras, em particular dos trabalhadores da base da estrutura social, e deu ensejo à identificação do que seria uma 'nova classe média'", pontua a pesquisa.
A questão do consumo talvez seja o aspecto mais contundente e denunciatório desta nova classe média. Pois, uma vez detentora de capital, de moeda de troca, ela passa a ser alvo – e protagonista – da avalanche diária de informações, mensagens publicitárias, filmes, telenovelas, telejornais, programas de auditório, reality shows, desenhos animados, entre outros produtos.
“Vendendo” estilos de vida, os conteúdos midiáticos destinam-se principalmente a gerar um ambiente cognitivo e afetivo que propiciem o despertar de um comportamento consumista. Não por acaso, negros, moradores de periferias e outras camadas, há até pouco tempo invisíveis na mídia, passaram a ganhar espaço de destaque em algumas produções. Entre uma mensagem publicitária e um projeto de comunicação pública, a mídia destaca-se como espaço legitimado para a produção deste novo Brasil. E aqui emerge a questão: a tênue linha entre cidadãos e consumidores. É preciso ter olhar crítico. O que acha? Estamos em um processo de valorização dos cidadãos ou de simples interesse nos novos consumidores?1-Estudo disponível em http://www.sae.gov.br/novaclassemedia/?page_id=58. Acesso em 30/11/2013
Aline Maia é jornalista e professora universitária. Doutoranda em Comunicação na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. Tem experiência em internet, rádio e TV. Interessa-se por pesquisas sobre mídia, juventude e cidadania. Atuante em movimentos populares e religiosos.