Mercado celebra aumento do desemprego nos EUA

Por CLAYTON CASTELANI

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Dados que demonstraram ligeiro aumento do desemprego nos Estados Unidos geraram uma onda momentânea de otimismo no mercado financeiro global nesta sexta-feira (2). A euforia perdeu força ao longo da tarde após a notícia de que a Rússia não irá religar um gasoduto que abastece a Europa neste sábado (3).

A Bolsa de Nova York virou para o negativo nas últimas horas do pregão. Mercados da Europa, que fecharam antes da informação sobre o agravamento da crise do gás, e os da América do Sul fecharam em alta. O dólar também perdeu fôlego globalmente, um dia após ter alcançado a maior valorização em duas décadas.

A explicação para a torcida do mercado para o desemprego nos Estados Unidos está na esperança de que o Fed (Federal Reserve, o banco central americano) seja menos rigoroso em relação à sua política de elevação dos juros para contenção da inflação no país.

Com o mercado de trabalho desacelerando, há a expectativa de menor pressão para aumentos salariais e, consequentemente, queda dos preços ao consumidor.

O relatório mensal de emprego do Departamento do Trabalho dos EUA mostrou que a taxa de desemprego subiu para 3,7% em agosto. Com isso, atingiu pela primeira vez um nível mais alto do que os 3,5% de antes do início da pandemia de Covid.

"Desemprego um pouco mais alto e salário médio por hora um pouco mais fraco, sugerindo uma leve deflação de salários. Bom para o Fed. Vai na linha dos objetivos", comentou Alex Lima, estrategista-chefe da Guide Investimentos.

No Brasil, o índice de referência da Bolsa de Valores fechou em alta de 0,42%, aos 110.864 pontos, mantendo ao menos parte do bom humor que durou boa parte do dia no exterior.

Na Europa, um índice que mede o desempenho das ações das 50 maiores empresas da região saltava 2,37%. A Bolsa de Frankfurt disparou 3,33%. Na Bolsa de Nova York, após subir mais de 1% durante a sessão, o indicador de referência S&P 500 caiu 1,07%.

A geração mais fraca de vagas em agosto não quer dizer que o mercado de trabalho americano está com o pé no freio. O país permanece com quase duas vagas abertas para cada desempregado, conforme reportou nesta sexta o The Wall Street Journal.

Mas, do ponto de vista dos investidores, o relatório ameniza preocupações ao mostrar que o Fed poderá ter sucesso em esfriar a economia sem necessariamente promover uma elevação de juros muito acima do que o esperado.

Juros muito altos nos Estados Unidos tendem a motivar investidores de todo o mundo a aplicarem na renda fixa americana, mais precisamente, nos títulos do Tesouro do país. Isso diminui a disponibilidade de dinheiro para o investimento em ações de empresas.

Há consenso entre analistas sobre a necessidade de aperto ao crédito para equilibrar a relação entre oferta e demanda no consumo. O receio é quanto à dose do remédio.

Em vez de um tombo da atividade econômica, o que poderia significar uma recessão global, o mercado quer um pouso suave.

DÓLAR RECUA APÓS MAIOR ALTA GLOBAL EM DUAS DÉCADAS

No mercado de câmbio do Brasil, o dólar comercial caiu 0,97%, cotado a R$ 5,1870. No cenário internacional, o índice DXY, que compara a moeda americana às principais divisas globais, cedeu 0,07%, após ter avançado na véspera ao maior patamar para um fechamento diário desde 2002.

Esse recuo do dólar também reflete a recepção do mercado aos dados de emprego nos Estados Unidos, segundo Cristiane Quartaroli, economista do Banco Ourinvest.

"O mercado entendeu que o Banco Central americano poderá ser menos agressivo com o aumento dos juros por lá", disse Quartaroli. "Esse resultado está ajudando na queda do dólar por aqui hoje."

Nesta quinta-feira (1º), investidores intensificaram a corrida por ativos ligados ao dólar e levaram a moeda americana a renovar a maior alta mundial em duas décadas. Preocupações de que aumentos extraordinários dos juros colocariam em risco o crescimento das principais economias do planeta estimularam a busca pela segurança dos títulos do Tesouro dos Estados Unidos.

A taxa de câmbio brasileira subiu 0,71%, com o dólar comercial cotado a R$ 5,2380. Na variação máxima do dia, chegou aos R$ 5,2580.

Entre as moedas fortes que tombaram em relação ao dólar nesta quinta, a libra esterlina atingiu a menor cotação desde 1985. No mercado de câmbio brasileiro, a libra caiu 0,47%, cotada a R$ 6,0021.

Desde a semana passada reverbera nos mercados a fala do presidente do Fed (Federal Reserve, o banco central americano) durante o simpósio de banqueiros centrais em Jackson Hole.

Jerome Powell afirmou que os americanos estão caminhando para um período doloroso de crescimento econômico lento e possivelmente aumento do desemprego.

Essa expectativa de baixo crescimento se deve à intenção do Fed de manter a política de elevação agressiva da sua taxa de juros. Os Estados Unidos buscam restringir o crédito para frear a maior inflação no país em quatro décadas.

Situação semelhante ocorre na Europa, onde o Banco Central Europeu também iniciou um processo de elevação de juros para conter a inflação.

A Europa ainda enfrenta a ameaça de ficar sem o abastecimento do gás da Rússia durante o inverno.

Na China, a economia também dá sinais de desaceleração enquanto Pequim segue paralisando atividades para combater o avanço da Covid, contribuindo para uma forte queda do petróleo.