Europa promove elevação histórica dos juros em resposta à inflação

Por CLAYTON CASTELANI

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Em uma elevação sem precedentes, o BCE (Banco Central Europeu) anunciou nesta quinta (8) uma alta de 0,75 ponto percentual em sua taxa de juros na tentativa de conter a inflação na região. Esse foi o segundo ajuste consecutivo, após a alta de 0,50 ponto em julho, elevando a taxa para 1,25% ao ano. É o nível mais alto desde 2011.

A inflação acumulada em 12 meses até agosto na região é de 9,1%, muito acima da meta de 2% ao ano.

"Ao longo das próximas reuniões, o Conselho do BCE espera aumentar ainda mais as taxas de juros para diminuir a demanda e se proteger contra o risco de uma persistente mudança para cima nas expectativas de inflação", disse o BCE em comunicado.

O grande aumento nos custos de empréstimo veio acompanhado de mudanças nas próprias previsões de inflação do BCE, que continua a ver um crescimento de preços bem acima de sua meta de 2% ao longo de todo o horizonte de projeção.

"Os funcionários do BCE revisaram significativamente suas projeções de inflação e agora esperam que a inflação fique em média em 8,1% em 2022, 5,5% em 2023 e 2,3% em 2024", acrescentou o BCE.

Assim como ocorre em outras partes do mundo, o BCE tenta tirar dinheiro de circulação ao tornar o crédito mais caro e, com isso, espera diminuir demanda e preços.

Nos mercados de ações, o efeito esperado desse aperto monetário é redução de liquidez. Na prática, investidores ficam com menos recursos para aplicar em ativos arriscados, como ações de empresas.

Embora a decisão do BCE tenha provocado quedas nas Bolsas nas primeiras horas do dia, os mercados assimilaram o golpe no decorrer da tarde.

Claudia Rodrigues, economista do C6 Bank, ressaltou que, apesar de agressivo, o aumento da taxa de juros na zona do euro era esperado.

A Bolsa de Frankfurt terminou o dia com ligeira queda de 0,09%. Paris e Londres fecharam com ganhos idênticos, de 0,33%. O índice que acompanha 50 das principais empresas da Europa subiu 0,29%.

Na esteira da decisão do BCE, a moeda comum europeia subiu 0,29% em relação ao dólar, cotada a US$ 0,9998, quase retomando a paridade com a divisa americana.

A libra esterlina também subiu ligeiramente, 0,17%, após ter renovado na véspera o menor patamar frente ao dólar desde 1985.

No câmbio brasileiro, o euro teve valorização de 0,34%, cotado a R$ 5,2062.

Quando os juros de referência dos países sobem, os seus títulos soberanos atraem mais investidores e a moeda atrelada a esses ativos tende a ganhar valor. Mas isso não é necessariamente uma regra.

Juros altos também podem sinalizar que a inflação está colocando uma economia em risco. No caso da Europa, o mercado precisa avaliar o efeito da política monetária em um cenário de ameaça de crise energética provocada pela Guerra da Ucrânia.

"Os preços da energia estão, em última análise, ao sabor do vento soprado pelo governo do presidente russo Vladimir Putin. Em um pior cenário, com um corte total de gás russo e racionamento obrigatório na União Europeia, a Alemanha entraria em recessão e o crescimento da zona do euro enfraqueceria em 1,4 ponto porcentual", disse Simone Pasianotto, economista-chefe da Reag Investimentos.

Reforçando a expectativa de investidores internacionais sobre um período de forte contração monetária, o presidente do Fed (Federal Reserve, o banco central americano), Jerome Powell, disse que os Estados Unidos devem continuar a agir energicamente para reduzir a demanda e conter a pressão sobre os preços para evitar um pico de inflação como o observado nas décadas de 1970 e 1980.

"Precisamos agir agora diretamente, energicamente, como temos feito e devemos continuar a fazê-lo até que o trabalho seja concluído para evitar [...] os custos sociais altíssimos", disse Powell, em uma referência às medidas consideradas extremas adotadas por Paul Volcker, presidente do Fed na época.

Apesar das oscilações provocadas por BCE e Fed, o índice de referência da Bolsa de Nova York, o S&P 500, subiu 0,66%. Os indicadores Dow Jones e Nasdaq avançaram 0,61% e 0,60%, respectivamente.

No mercado internacional de petróleo, o preço do barril do Brent avançava 0,57% no encerramento da tarde, cotado a US$ 88,50 (R$ 461,51). O valor da matéria-prima se recuperava apenas parcialmente do tombo de 5,20% na véspera.

O preço da commodity foi severamente impactado por dados da balança comercial da China significativamente abaixo das previsões. O país sofreu com o impacto negativo do aumento da inflação para a demanda no exterior, ao mesmo tempo em que voltou a conviver com novas restrições por causa da Covid-19 e com ondas de calor que interromperam a produção.

As importações de petróleo pela China caíram 9,4% em agosto em relação ao ano anterior, com a extensão das restrições de mobilidade por causa da pandemia reduzindo a demanda por combustível. O gigante asiático é o maior consumidor global de petróleo.

MERCADO IGNORA 7 DE SETEMBRO DE BOLSONARO

Bolsa em alta e dólar em queda. O cenário no mercado financeiro neste pós-feriado de 7 de Setembro é bem diferente em relação ao ano anterior, quando atos promovidos pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) e seus apoiadores derrubaram ações e a moeda brasileira.

O índice Ibovespa avançou 0,14%, aos 109.915 pontos. O dólar comercial caiu 0,61%, cotado a R$ 5,2070 na venda.

"Bolsonaro falou apenas para a clientela dele", comentou o economista Roberto Macedo, diretor acadêmico da Faculdade do Comércio de SP, sobre o desempenho da Bolsa brasileira nesta quinta. "O risco fiscal das medidas que ele [Bolsonaro] vem adotando, como a ampliação do Auxílio Brasil, já estava precificado no câmbio e na Bolsa", afirmou.

Antes de os indicadores confirmarem que o 7 de Setembro passou ao largo do mercado, empresários já tinham relatado à Folha de S.Paulo que não ficaram surpresos com as manifestações bolsonaristas.

As finanças do país também passaram por um dia de ajustes em relação ao pregão de terça-feira (6), quando o dólar subiu 1,72% e o Ibovespa recuou 2,17% na esteira de sinalizações do BC (Banco Central) de que a taxa de juros pode permanecer em patamar mais elevado por um período acima do previsto pelos investidores.