Passageiros se tornam 'reféns' e perdem compromissos com ato golpista

Por HELOÍSA BARRENSE E LUIZ FERNANDO FIGLIAGI

SÃO PAULO, SP (UOL/FOLHAPRESS) - Passageiros de várias partes do país relatam transtornos enfrentados desde o início de atos golpistas que se espalham nas estradas brasileiras -atualmente com 267 pontos de interdição por caminhoneiros e manifestantes a pé, que contestam a derrota de Jair Messias Bolsonaro (PL) nas eleições deste ano. Desde o anúncio do resultado da vitória de Luís Inácio Lula da Silva (PT) no domingo (30), trechos de rodovias em pelo menos 25 estados e no Distrito Federal foram fechados, contra os votos da maioria dos eleitores e a favor de uma intervenção militar.

A estudante da UFRRJ Carolina Yumi, 25, levou 32 horas para conseguir chegar no Rio de Janeiro, a partir de São Paulo -viagem normalmente feita em 6 horas até a capital carioca e em 8 para a Região dos Lagos, por exemplo. Ela conta que ficou presa por diversas horas na Rodovia Presidente Dutra a partir das 3h da madrugada e só chegou ao destino na manhã desta terça-feira (1º).

"Nada foi liberado tanto para voltar para São Paulo quanto para o Rio de Janeiro. O motorista conseguiu ir até Resende e esperou o dia clarear para tentar passar", disse ela à reportagem. Segundo Carolina, os motoristas de ônibus estavam se comunicando para informar os bloqueios nas estradas e compartilhar orientações. Elas pararam em um estabelecimento de rodovia, onde aguardaram na madrugada.

"Forneceram para a gente uma alimentação por volta das 17h30. Desde 3h da manhã até umas 18h teve gente que ficou sem alimentação", disse ela.

Maria Fernanda Piccarolo Ceravolo perdeu uma conferência da empresa em que trabalha na Califórnia, nos Estados Unidos, porque os tripulantes do voo dela não conseguiram chegar ao Aeroporto de Guarulhos na noite de ontem.

"Eu saí de casa mais cedo, em torno das 17h, para evitar atrasos, e quando o táxi chegou para me pegar, já tinha algumas manifestações se formando pela Marginal", disse ela à reportagem. Apesar dos bloqueios, Maria conseguiu chegar até o Aeroporto de Guarulhos para realizar a viagem, marcada para as 21h50.

"Eu fiz o check-in, fiquei na sala esperando e cinco minutos antes do embarque a gente foi informado que não tinha previsão de saída do voo porque os tripulantes não tinham conseguido chegar do hotel próximo ao aeroporto em que eles estavam.

"Segundo ela, as companhias aéreas começaram a distribuir um voucher para que as famílias passassem a noite em um hotel. No entanto, muitas pessoas não conseguiram sair do aeroporto antes das 0h. "A saída do aeroporto estava bloqueada também", disse. Maria decidiu cancelar o voo porque perderia a conexão que tinha em Dallas, também nos Estados Unidos. Ela retornou para a casa em São Paulo durante a madrugada.

Maria Julia Guerra, 23, está desde segunda-feira (31) tentando retornar a São Paulo. Ela tinha feito uma viagem para Petrópolis na sexta-feira passada (28), para poder votar no domingo de eleições. Residente em Jundiaí (SP), ela pretendia retornar na noite de segunda para São Paulo, mas encontrou a rodoviária "vazia". "Vi que tinha um ponto fechado na Dutra. Então, descobri que não estava saindo ônibus aqui de Petrópolis.

"Maria conta que tentou pensar em alternativas para deixar a cidade serrana, mas não conseguiu encontrar nenhuma rodoviária próxima que estivesse realizando o trajeto para São Paulo. "Eu descobri que não estava saindo ônibus direto de Petrópolis para São Paulo. Pensei em ir pelo Rio de Janeiro, mas também não tinha ônibus".

Ela disse tentou passagem de avião pela capital carioca, mas não achou como chegar à cidade. "Então eu comecei a ver passagem por Juiz de Fora, mas descobri que está tudo bloqueado por lá. [...] Agora estou sem saber como é que eu vou voltar, quando eu vou voltar. Estou perdida e ilhada em Petrópolis.

"Uma usuária do Twitter identificada como Nathalia Cardoso relatou como ficou presa na rodovia Anhanguera. "Pessoal, as pessoas aqui nos ônibus precisam de ajuda! Estamos há mais de 9h parados na Anhanguera perto de Limeira! Tem idosos passando mal, crianças com fome, estamos racionando água! Enquanto eles estão com sons ligado e fazendo churrasco! A gente não sabe mais o que fazer", escreveu ela em um tuíte às 23h25 de segunda.

O estudante Maicon Rafael Bueno, 34, perdeu a aula na segunda-feira (31), devido às paralisações que atingem todo o Brasil após as eleições. Bueno mora em Matão, cidade com aproximadamente 83 mil habitantes, onde grande parte dos estudantes do município saem para estudar em Araraquara ou em São Carlos.

"Fiquei em casa por medo de não conseguir voltar para minha cidade. Na idade, estava tudo tranquilo, mas amigos meus disseram que na volta parte da Washington Luís estava interditada", comenta o estudante de sistemas de informação.