Bolsonaro e Lula já derrubaram a Bolsa com propostas para furar teto de gastos

Por CLAYTON CASTELANI

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Bolsa em queda, juros e dólar em alta. A turbulência da vez no mercado financeiro é resultado de uma nova rodada de críticas a regras que limitam os gastos públicos acompanhada de uma proposta que muda a legislação para ampliar o pagamento de benefícios sociais.

Desta vez, recaem sobre o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) as críticas pelos solavancos nos preços dos ativos. Em duas ocasiões recentes, porém, o mercado também tombou diante de medidas do presidente Jair Bolsonaro (PL) para ampliar o valor do Auxílio Brasil, sendo a última já com corrida eleitoral em curso.

Da queda de 4,22% observada no Ibovespa desde o segundo turno das eleições, a maior parte das perdas (3,41%) ocorreu a partir do último dia 10, quando Lula passou a criticar abertamente regras fiscais em meio à necessidade pagar o Auxílio Brasil em 2023, que voltará a se chamar Bolsa Família.

Neste intervalo inferior a dez dias, o dólar subiu de R$ 5,18 para R$ 5,40 (alta de 4,3%) e a taxa de juros DI para 2024, referência para financiamentos de curto prazo, passou de 13% para 14%.

Em 22 de outubro de 2021, porém, o Ibovespa fechava a semana em queda de 7,28%, seu pior resultado semanal desde março de 2020, quando o mundo sofreu o baque da pandemia.

A crise havia começado dias antes, quando Bolsonaro provocou uma disparada do dólar e forte queda da Bolsa ao determinar que o determinou que o Bolsa Família, que passaria a se chamar Auxílio Brasil, tivesse o seu valor ampliado para R$ 400, acima dos R$ 300 estimados anteriormente.

A ordem gerou uma crise de desconfiança, que só foi amenizada após o ministro Paulo Guedes (Economia) negar que deixaria o governo.

Antes da fala de Guedes, naquele mesmo dia 22 de outubro, a Bolsa chegou a recuar 4,5% porque investidores esperavam um desmonte da equipe econômica, uma vez que a proposta de drible no teto de gastos havia provocado uma debandada no time de Guedes na véspera.

Com a popularidade ainda em baixa nos meses que se seguiram, Bolsonaro adotou uma séria de medidas para elevar sua aprovação entre a população mais pobre. Houve então uma nova ampliação de benefícios sociais.

No gráfico que mostra as oscilações do Ibovespa, o ponto mais baixo desse período ocorreu em 14 de julho deste ano, quando o indicador recuou à casa dos 96 mil pontos após o Senado ter aprovado no dia anterior a PEC da reeleição. Essa foi a menor pontuação da Bolsa em 2022 e também a mínima desde o final de 2020.

A emenda elevou o valor do Auxílio Brasil de R$ 400 para R$ 600, além de fornecer ajuda para caminhoneiros autônomos, taxistas, consumidores pobres de gás, transporte público e agricultura familiar. O gasto previsto ficou em R$ 41,2 bilhões. Os benefícios expiram em dezembro.

E por que o aumento de gastos assusta tanto o mercado?

Reginaldo Nogueira, diretor-geral do Ibmec São Paulo e Brasília, explica que o efeito mais óbvio do aumento de gastos públicos é a elevação da necessidade de financiamento do governo e o preço para atrair investimentos em um contexto de incerteza, que é a elevação dos juros.

Nogueira reforça que o cenário global é amplamente desfavorável para medidas que comprometam a sustentabilidade das contas públicas e requeiram aumento do custo do crédito.

Assim como ocorre neste momento com as discussões sobre a PEC da Transição de Lula, as turbulências proporcionadas pelas medidas de Bolsonaro também não eram as únicas preocupações no radar dos investidores.

Se até o final de 2021 o mercado ainda sofria impactos das incertezas sobre até quando a pandemia manteria interrompidas atividades econômicas, a reabertura da economia --graças à distribuição das vacinas em larga escala em 2022-- gerou um processo inflacionário mundial e, por consequência, uma alta mundial das taxas de juros que, hoje, trazem uma ameaça de recessão global.

Na prática, esse é um contexto que torna o dinheiro escasso e caro, criando incertezas sobre a capacidade do governo em atrair recursos e, até mesmo, cumprir o seu planejamento financeiro, caso resolva aumentar irresponsavelmente seus gastos.

"No momento em que o mundo esfria, a queda do crescimento internacional afetará as exportações brasileiras, pressionará a taxa de câmbio, e irá atrapalhar o próprio crescimento brasileiro", diz Nogueira.