Governo avalia mudar lei para afastar da Receita corregedor visto como bolsonarista
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - O governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) avalia mudar a legislação que define as regras do Sistema de Correição do Poder Executivo para pressionar o corregedor da Receita Federal, tido como bolsonarista, a entregar o cargo.
As normas vigentes foram baixadas por um decreto de Lula em 2005 que delegou à CGU (Controladoria-Geral da União) o poder sobre a atividade de controle dos órgãos da administração pública federal.
Agora, pareceres jurídicos encomendados pela nova diretoria da Receita analisam a possibilidade de que o presidente Lula possa, ao mudar a lei que norteia as corregedorias, abrir caminho para a troca do corregedor, o auditor João José Tafner, cujo mandato expira em fevereiro de 2025. .
Considerado bolsonarista pelo atual governo e colegas do fisco, Tafner participou de atos de campanha pró-Bolsonaro em 2018 e chegou a posar para fotos ao lado do então candidato a deputado Eduardo Bolsonaro (então PSL-SP), usando camisa da seleção brasileira e adesivo de um outro candidato do PSL, partido pelo qual o presidente foi eleito.
Seu nome também é mencionado por integrantes da equipe econômica como sendo ligado ao senador Flávio Bolsonaro, que acionou a corregedoria no passado sob a suspeita de que auditores tenham vasculhado suas informações indevidamente no chamado "caso das rachadinhas". Posteriormente, eles foram inocentados.
O corregedor, porém, afirmou a amigos que não tem relação com o clã Bolsonaro e que, em momentos diferentes, posou para foto ao lado de Eduardo porque o parlamentar compareceu a um evento promovido pelo sindicato dos auditores.
Menospreza o episódio ao dizer que todo mundo em Brasília tem alguma foto com um político e que isso não significa vinculação partidária ou ideológica.
Na CGU, agora comandada por Vinicius Carvalho, um quadro técnico do PT, o assunto é tratado com reserva. Há quem defenda não ser possível mexer nos mandatos vigentes, mesmo com a mudança da lei, e aqueles que veem brechas para que isso ocorra -posição predominante no atual comando da Receita.
As conversas com o Tafner, um auditor de carreira prestes a se aposentar, estão paralisadas desde o falecimento de seu pai, há cerca de uma semana.
Até o momento, o secretário da Receita, Robinson Barreirinhas, não recebeu sinalização de que o corregedor se disponha a entregar o cargo, o que resolveria o problema para a atual gestão.
Interlocutores do corregedor afirmam que ele não tem essa intenção e que, nas próximas conversas com Barreirinhas, vai tentar convencê-lo de que não é bolsonarista.
Caso perceba que sua substituição tem conotação política e que o governo quer o cargo, só concordará em encerrar o mandato em favor de seu vice ou de outro servidor do órgão de controle.
Ainda segundo relatos, nomes de possíveis cotados, como o de Luiz Fernando Nunes Teixeira -secretário-adjunto da Receita até novembro de 2019, na gestão de Jair Bolsonaro- não levarão Tafner a ceder à pressão, muito embora ele venha manifestando não querer criar problemas diante da chegada de sua aposentadoria.
Pessoas próximas a Tafner dizem ainda que, em sua defesa, ele vai dizer que Barreirinhas já escolheu pessoas ligadas a Bolsonaro para cargos de comando no Fisco.
A secretária-adjunta, Adriana Rego, foi escolhida pelo então ministro da Economia de Bolsonaro, Paulo Guedes, para comandar o Carf, o conselho que julga recursos de contribuintes. Na sequência, ela foi trabalhar na Casa Civil, coração do governo.
Aliados do corregedor lembram ainda que Adriana Rego é mulher de Paulo Ricardo de Souza Cardoso, ex-número dois de Jorge Rachid, secretário da Receita na gestão Michel Temer, que Lula chama de golpista.
Cláudia Pimentel, nomeada subsecretária de tributação, é mulher de João Paulo Fachada, número dois de Marcos Cintra, primeiro secretário da Receita de Jair Bolsonaro e um dos mentores intelectuais de seu plano de governo durante a campanha de 2018. À época, a servidora coordenava a área de tributação.
Procurados, Barreirinhas e Tafner não quiseram comentar.
Logo no início de sua gestão, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), já ajustou normas do Sistema de Correição do Poder Executivo para reduzir o mandato do corregedor da Receita Federal de três para dois anos.
A justificativa dada pelo ministério foi a necessidade de harmonização do mandato do corregedor do Fisco com o dos seus similares da administração pública federal, em que são permitidos três mandatos consecutivos de dois anos. Na Receita, única exceção, eram até dois mandatos de três anos cada um.
A mudança da duração dos mandatos, porém, não vale para o período de Tafner, que está no primeiro mandato de três anos.