Avicultor brasileiro cancela feiras, proíbe visitas e desinfeta caminhões contra risco de gripe aviária

Por MARCELO TOLEDO

RIBEIRÃO PRETO, SP (FOLHAPRESS) - A chegada da gripe aviária a países fronteiriços com o Brasil acendeu um alerta na cadeia produtiva brasileira, que tomou uma série de medidas protetivas em sinal de alerta para tentar evitar a chegada da doença.

Competições e eventos que reúnam pássaros foram proibidos por 90 dias no Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná, principais estados produtores de aves, e as regras nas granjas se tornaram ainda mais rígidas nas últimas semanas devido ao registro dos casos em países vizinhos, como Argentina e Uruguai.

Visitantes passaram a ser vetados nas granjas, caminhões estão sendo desinfetados, assim como carros, os telamentos das granjas foram revisados -para que aves silvestres não entrem em contato com os plantéis- e a orientação foi a de que a água coletada em lagos não seja dada diretamente aos animais. Além disso, é exigido o uso de roupas especiais no aviário.

"A gente potencializou essas medidas, assim como os estados tomaram decisões como impedir encontros de pássaros. Assim, evita-se, por exemplo, visitas comerciais", disse Ricardo Santin, presidente da ABPA (Associação Brasileira de Proteína Animal).

O Brasil é o único entre os grandes produtores mundiais que nunca registrou casos da doença, que é altamente contagiosa, mas o risco de entrada é real, afirma o setor, e isso poderia prejudicar de maneira incalculável o desempenho das exportações.

Os problemas enfrentados por vizinhos da América do Sul não impactaram de forma significativa os negócios brasileiros até aqui, segundo a ABPA, pelo fato de eles não serem grandes exportadores.

Mas houve incremento nas vendas em janeiro para os principais destinos globais devido às consequências geradas pela gripe aviária em vários países. A China, principal destino, importou 60,2 mil toneladas em janeiro, 24,7% mais que no mesmo mês do ano passado. Também houve crescimento nos embarques para Japão (23,1%), Arábia Saudita (111,3%), África do Sul (15,7%) e União Europeia (20,4%).

Do Sul do Brasil saem 65% da produção brasileira de frango e 80% das exportações -o país responde por 35% das exportações mundiais.

As exportações deverão superar 5 milhões de toneladas neste ano, ante as 4,8 milhões do ano passado, que resultaram em US$ 9,7 bilhões em receita (R$ 50,44 bilhões, ao câmbio desta segunda-feira).

O país deve produzir, no total, 14,8 milhões de toneladas de carne de frango, ante 21,3 milhões dos Estados Unidos, de acordo com o Usda (Departamento de Agricultura dos Estados Unidos).

Além das medidas de contenção, o país sempre contou com a proteção natural da Cordilheira dos Andes e da Amazônia, mas a aproximação de casos da doença nas últimas semanas preocupou o setor.

A Argentina, por exemplo, suspendeu a exportação de produtos avícolas após o primeiro caso de gripe aviária ter sido detectado num centro de produção na província de Rio Negro.

No Peru, biólogos recolheram nos últimos dias amostras de leões-marinhos diante de um surto de gripe aviária que poderia ter matado 3.487 exemplares desde novembro. Já o Uruguai detectou um caso em animal silvestre em Lagoa Garzón, distante 200 quilômetros da fronteira com o Rio Grande do Sul.

"O risco existe, ele existe porque essa doença está no mundo inteiro, hoje ela é endêmica lá na Europa, está se tornando endêmica nos Estados Unidos, tudo em aves silvestres, na Ásia é endêmica já há muito tempo. Para nós, nos países que são vizinhos nossos só vieram em áreas selvagens ou aves de fundo de quintal, não entraram em plantéis industriais, então isso é uma situação confortante. Não é tranquilizadora, mas demonstra um risco um pouco menor."

Em Santa Catarina, segundo maior mercado produtor de aves do país, a Secretaria da Agricultura e o IMA (Instituto do Meio Ambiente) suspenderam torneios de canto, exposições de pássaros e a participação de aves em feiras agrícolas por 90 dias.

O temor, conforme a pasta, é que a avicultura representa o maior faturamento nas exportações do estado, que tem três rotas de migração de animais silvestres -uma litorânea, uma no planalto e outra no extremo oeste do estado.

O trabalho no estado envolve também a não autorização de visitas aos aviários e até a distribuição de folders bilíngue em estradas próximas à região da fronteira com a Argentina.

Num comunicado, o presidente da Acav (Associação Catarinense de Avicultura), Ricardo Castellar de Faria, disse que é importante evitar áreas frequentadas por aves silvestres, já que o vírus pode permanecer por até oito meses no ambiente.

No Rio Grande do Sul, no último dia 17 já tinham sido cancelados torneios de canto de pássaros e encontros de criadores de aves como forma de prevenir a gripe aviária, pelo prazo mínimo de 90 dias.

O governo do Paraná também suspendeu a presença de aves em eventos agropecuários, feiras e qualquer tipo de exposição pelo mesmo prazo.

A decisão, tomada por meio da Adapar (Agência de Defesa Agropecuária do Paraná), entrou em vigor na semana passada e inclui orientações para não manipular nem recolher aves mortas ou moribundas.

Docente da USP (Universidade de São Paulo, especialista em agronegócio, Marcos Fava Neves disse que há risco de entrada da doença no país, mas, se isso ocorrer, o impacto deverá ser pequeno.

"Risco existe, mas como está no mundo todo e numa versão mais amena, não creio em impactos comerciais significativos [nesse momento]", afirmou.

Santin disse que o setor está preparado para esse risco. "Tanto que trouxe o Brasil até hoje livre dessa enfermidade."

Apesar de o temor ser concentrado nos estados da região Sul, que são os principais produtores, outros também têm receio, como Mato Grosso.

O governador Mauro Mendes (União Brasil) disse que as defesas sanitárias estão em alerta e redobrando medidas de cuidado, mas não há no horizonte algo que sinalize um risco ao estado.