Quebra do SVB afeta pagamentos de empresas mesmo após ação do governo
WASHINGTON, EUA (FOLHAPRESS) - Mesmo com o socorro do governo dos Estados Unidos, o colapso do SVB (Silicon Valley Bank) na última sexta-feira (10) já causou problemas para sua base de clientes, quase todos eles com depósitos acima do limite do seguro do governo.
O Departamento de Proteção Financeira e Inovação da Califórnia fechou o SVB na sexta, e dois dias depois o governo americano garantiu que todos os clientes teriam acesso integral aos recursos depositados na instituição. Cerca de 90% deles tinham depósitos acima dos US$ 250 mil assegurados no fundo garantidos de crédito do país, o FDIC (Corporação Federal Asseguradora de Depósitos).
Nesta segunda (13), o FDIC afirmou que todos os recursos foram transferidos para um "banco ponte" recém criado para que os clientes do SVB possam acessá-los a partir desta manhã, da mesma maneira que funcionava o banco, inclusive com caixa eletrônico e cartão de débito.
Em meio às incertezas ao longo do fim de semana, porém, houve impactos secundários. A Etsy, plataforma de comércio online similar ao Mercado Livre focada em produtos de design gráfico e artesanato, enviou emails a vendedores alertando que os pagamentos seriam atrasados, o que afeta sobretudo pequenos comerciantes.
As mensagens, que foram compartilhadas por usuários nas redes sociais, dizem que o atraso "foi causado pelos desenvolvimentos recentes envolvendo o SVB, que o Etsy utiliza para facilitar os pagamentos a alguns vendedores."
A crise também chegou a Hollywood, com a Wrapbook, startup fundada em 2018 para processar pagamentos de profissionais do audiovisual, que afirmou ter 96% de seus recursos depositados no SVB. A empresa que a crise adiaria pagamentos e o processamento de cheques, mas que espera voltar à normalidade até quarta-feira (15).
O CEO do Compass Coffee, rede que funciona na região da capital Washington, disse à Fox Business que poderia haver atraso nos pagamentos de funcionários.
Outras empresas tinham grande parte de seus recursos no SVB, como a Wrap. É o caso da Roku, empresa que fabrica um aparelho de streaming similar ao Chromecast da Google. Ao todo, mais de um quarto do patrimônio da empresa estava no banco. Do caixa de US$ 1,9 bilhões da companhia, US$ 487 milhões estavam depositados no SVB, segundo relatório da companhia à Comissão de Valores Mobiliários dos EUA.
Outras têm uma porcentagem menor, mas volume de recursos muito maior, como a Circle, plataforma de pagamentos que administra a criptomoeda USDC. A companhia afirmou que tinha US$ 3,3 bilhões em depósitos no SVB, dos cerca de US$ 40 bilhões da empresa.
A Vox Media, que comanda uma série de portais como o Vox, The Verge e a revista New York Magazine, também tem "uma concentração substancial" de recursos no banco, segundo o New York Times citando uma fonte da empresa.
Para Paul Orlando, professor da Universidade do Sul da Califórnia e diretor de incubadoras e aceleradoras de startups no estado, o impacto pode se estender além dos pagamentos de funcionários. "O colapso do SVB certamente afeta startups que fizeram negócios com eles, mas também impacta outras empresas interessadas em financiar serviços para startups em geral. Pode certamente tornar mais difícil para startups sobreviverem", disse.
Ele acredita, porém, que a falência não vai engatilhar um colapso do sistema financeiro, porque, "além do apoio governamental nessa crise, muitas das startups de hoje têm boas práticas de negócios depois dos últimos anos de inflação e redução de financiamento", diz. "Estou sendo otimista, mas companhias já vão ser criadas para se beneficiar do que aconteceu com o SVB. O ciclo continua."
Na manhã desta segunda, o presidente dos EUA, Joe Biden, fez um discurso para garantir que "os americanos podem ter confiança que o sistema bancário está seguro". "Pequenos negócios pelo país que têm contas nesses bancos podem respirar tranquilamente sabendo que poderão pagar seus funcionários e suas contas", disse.
O governo tem tentado ainda passar uma mensagem de que o prejuízo da falência dos bancos não será absorvido pelos cidadãos do país mesmo com o socorro do governo, para evitar uma crise política maior. Biden disse nesta segunda que "nenhuma perda será paga pelos pagadores de impostos", mas de taxas pagas pelos bancos ao FDIC (Corporação Federal de Segurança de Depósitos, na sigla em inglês).
Também enfatizou que, embora os depósitos tenham sido protegidos, os investidores do banco não serão assegurados. "Eles tomaram um risco consciente, e quando não têm êxito, investidores perdem dinheiro. É assim que o capitalismo funciona."
Fundado há 40 anos, o SVB tinha cerca de US$ 209 bilhões em ativos e de US$ 175,4 bilhões em depósitos até 31 de dezembro de 2022, segundo o FDIC, e quebrou em meio aos aumentos da taxa de juros do Fed, o banco central americano.
O banco viveu um boom em 2021, com aumento de 86% nos depósitos, após período de juros zerados que levaram a um aumento do apetite a risco. Para dar conta desse volume de aportes, o SVB começou a colocar dinheiro em títulos pré-fixados de longo prazo do governo, investimento considerado super seguro. Mais da metade dos recursos do banco estavam nesse tipo de ativo.
Mas as altas de juros derrubaram os preços dos títulos, e o banco vendeu os papéis com prejuízo para cobrir saques feitos pelas startups em meio à queda de investimentos no setor no ano passado. O prejuízo fez com que as ações do banco despencassem e, sob temores de falência, correntistas correram para retirar o dinheiro da instituição, até que o banco foi fechado pelo governo na sexta.