Resposta rápida dos EUA vai evitar colapso do sistema financeiro, diz economista

Por THIAGO AMÂNCIO

WASHINGTON, EUA (FOLHAPRESS) - A resposta do governo do presidente americano, Joe Biden, de assegurar todos os depósitos do Sillicon Valley Bank (SVB) vai impedir que a falência do banco seja o gatilho para uma crise financeira sistêmica, defende o economista Justin Wolfers, professor da Universidade de Michigan.

Doutor em economia por Harvard, Wolfers afirma que o colapso ocorreu devido ao afrouxamento que Donald Trump fez em 2018 das políticas implementadas após a crise de 2008, e defende o aumento da regulação do setor.

Lei de 2010 colocou bancos sob a fiscalização de um Conselho de Supervisão para Estabilidade Financeira (FSOC), com função de identificar riscos que possam afetar o mercado, e criou uma Agência de Proteção Financeira ao Consumidor (CFPB) para supervisionar o setor de crédito a pessoas físicas, entre outras medidas para aumentar a transparência.

Em 2018, Trump assinou lei que liberou bancos de médio porte das regras mais rígidas estabelecidas em 2010. Com a flexibilização, somente os bancos com mais de US$ 250 bilhões em ativos ficaram sujeitos às supervisões federais ?o que restringiu à época o universo de instituições a menos de dez. Antes, a régua era mais baixa, US$ 50 bilhões.

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PERGUNTA - A falência do SVB é o gatilho para uma crise financeira sistêmica?

JUSTIN WOLFERS - Não. Na teoria, se o governo federal não tivesse feito nada, uma crise poderia ter se espalhado. Mas a resposta do governo federal foi garantir todos os depósitos. Implicitamente, é uma promessa de que se outro banco falir, os depositantes terão uma restituição integral. Isso muda completamente a probabilidade de novas falências.

A corrida aos bancos acontece quando há a preocupação de que o banco não terá dinheiro para pagar os depósitos, então tentam limpar as contas enquanto ainda há dinheiro nos cofres. Se você sabe que vai receber seu dinheiro independentemente do que os outros façam, você não precisa mais correr para o banco, e assim os bancos não falem. É uma resposta muito forte do governo federal que remove o incentivo para outros depositantes retirarem seus fundos mesmo de bancos em dificuldades. Houve grande preocupação, mas os mercados já estão se recuperando e o cenário está mais claro.

P - Economistas falam desde o ano passado em recessão nos EUA. Estamos mais perto disso?

JW - Não muito. O Silicon Valley Bank é um banco que atende apenas um setor da economia, o de tecnologia. É um setor pequeno, predominante em apenas uma parte do país. E todos garantiram seu dinheiro. Se você pensar na maioria das pessoas na economia, como a vida delas é diferente hoje do que era na última sexta-feira [quando o banco faliu]? A resposta é que não muito. Se eu possuo uma fábrica em Ohio, vou produzir tantos carros hoje quanto na semana passada. E se eu possuo uma lanchonete em Maryland, vou tentar vender o mesmo número de sanduíches. Isso se deve em grande parte à resposta do governo.

P - Os dados mostram que a inflação continua resiliente.

JW - Os dados não refletem o que aconteceu com o SVB, mas, sim, mostram duas coisas verdadeiras: a inflação ainda é um problema constante e está melhorando lentamente. A recessão não acontece quando a inflação está alta ou baixa, crescente ou decrescente, mas quando estamos produzindo menos, comprando menos, com menos empregos. Os dados até aqui sugerem que a economia cresce bem. O número de empregos criados no mês passado foi extremamente alto, o que não parece uma economia perto de uma recessão.

P - Bancos pequenos e médios também estão seguros?

JW - Muitos bancos pequenos estão menos seguros porque eles sempre são menos seguros. Mas a maioria de nós não temos depósitos acima dos US$ 250 mil [limite assegurado por fundo garantidor de crédito nos EUA]. No SVP, a maioria de seus clientes tinha grandes quantias de dinheiro, e 97% de seus depósitos estavam acima desse valor. Isso significa que o SVB estava muito mais exposto.

Quando você pensa em quem está em risco, eu não diria necessariamente que o critério é ser pequeno ou regional, a maioria dos depósitos no seu banco está totalmente segurada. Houve grande preocupação com os bancos regionais na segunda, mas a maioria deles já viu uma recuperação forte e parece que não estão realmente em risco. E mesmo se estivessem em risco, eles formam uma parcela muito pequena da economia. Portanto, não será uma grande consequência macroeconômica.

P - Haverá impacto nos aumentos das taxas de juros?

JW - O SVB apostou que as taxas de juros permaneceriam baixas e estavam errados. Quando perderam a aposta, em vez de admitir que perderam, continuaram com os investimentos ou dobraram as apostas, deixaram aumentar as perdas. E você pode dizer "é terrível que esses bancos possam fazer apostas tão grandes e depois o governo federal ter que intervir", e eu concordo com isso. Isso se tornou possível por causa do enfraquecimento da regulamentação bancária que ocorreu em 2018 e, portanto, os grandes bancos não seriam autorizados a correr riscos como o SVB correu. É louca a ideia de permitir que esses bancos de médio porte façam essas coisas especialmente quando é o governo federal que tem que limpar a bagunça.

P - O governo Trump afrouxou a regulamentação imposta após a crise de 2008. A resposta agora é endurecer as regras?

JW - Tenho bastante confiança de que veremos algum tipo de ação regulatória nessa direção. O SVB literalmente não poderia fazer esses investimentos se não fosse a desregulamentação de 2018. A questão mais ampla é que se nós, os contribuintes, vamos bancar o seguro dos bancos, temos que garantir que eles não possam fazer essas negociações que basicamente são: cara, ganham, coroa, o governo limpa a bagunça. Temos que impedi-los de brincar com isso se somos nós quem arcaremos com as perdas. É por isso que existe a necessidade de maior regulamentação em relação aos investimentos de bancos, ao tamanho deles, ao risco e à facilidade de liquidá-los.

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RAIO-X

Justin Wolfers

Professor de políticas públicas e economia na Universidade de Michigan, é doutor em economia por Harvard. Escreve para o jornal americano The New York Times e é pesquisador sênior dos think tanks Brookings e Peterson Institute for International Economics.