Deputado apresenta proposta alternativa de regra fiscal com alta flexível de despesas

Por IDIANA TOMAZELLI

BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - Enquanto o ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), mantém sigilo em torno dos detalhes de sua proposta de regra fiscal, integrantes do Congresso Nacional começam a se movimentar para propor alternativas à iniciativa do governo.

O deputado Pedro Paulo (PSD-RJ), ex-secretário de Fazenda e Planejamento da prefeitura do Rio de Janeiro, protocola nesta quinta-feira (16) um projeto de lei complementar que sugere um novo arcabouço fiscal para substituir o teto de gastos, como foi previsto na PEC (proposta de emenda à Constituição) da Transição.

O texto propõe um limite flexível para o crescimento das despesas, com possibilidade de avanço acima da inflação se o endividamento do país estiver em trajetória sustentável.

"Com a ajuda de muita gente que entende na teoria e na prática e comunga comigo uma visão mais responsável e rigorosa da necessidade de equilíbrio fiscal e sustentabilidade da dívida, e que vive em confronto com a nossa leniência em conviver sem culpa com um Estado perdulário e gastador, apresentarei hoje uma proposta de arcabouço", disse Pedro Paulo.

A formulação da proposta contou com o apoio de técnicos da consultoria de Orçamento da Câmara, entre eles Ricardo Volpe, Eugênio Greggianin, Márcia Moura, Leonardo Rolim e Hélio Tolini.

Segundo o deputado, ele também recebeu contribuições e revisões importantes de Marcos Mendes, ex-chefe da Assessoria Especial do Ministério da Fazenda e colunista da Folha de S.Paulo, e Fábio Giambiagi, especialista em contas públicas.

Paulo elenca também como colaboradores servidores do Executivo que já estiveram em cargos de comando, como Ariosto Culau (ex-secretário de Orçamento Federal do governo Jair Bolsonaro) e Esteves Colnago (ex-ministro do Planejamento do governo Michel Temer e ex-secretário especial de Tesouro e Orçamento da gestão Bolsonaro).

A proposta é apresentada no momento em que Haddad se prepara para discutir os detalhes de seu projeto com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Os dois devem ter uma reunião nesta sexta-feira (17) para debater a proposta, juntamente com outros ministros da área econômica e com a Casa Civil.

No projeto de Pedro Paulo, os principais parâmetros de referência são a despesa, o endividamento e o resultado primário (que pode ser positivo ou negativo e é calculado pela diferença entre gastos e arrecadação).

De forma resumida, o mecanismo consiste em um limite para o crescimento das despesas, que sempre vai repor pelo menos a inflação, mas poderá ser maior caso a dívida esteja controlada e haja superávit primário -ou seja, mais receita do que gasto. Sua vigência seria a partir de 2024.

O índice de inflação seria o IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) observado em 12 meses até junho do ano anterior ao da vigência do limite de despesas. Assim, o Orçamento seria elaborado com base em um parâmetro já conhecido, em vez de uma estimativa.

A referência de endividamento seria a DLGG (dívida líquida do governo geral), que inclui governo federal, estados e municípios. A escolha se dá porque, diferentemente de outros indicadores mais conhecidos (como a dívida bruta), a DLGG exclui dívidas de estatais e títulos públicos usados pelo Banco Central para fazer sua política de juros.

O texto considera "sustentável" um patamar de DLGG que não ultrapasse os 50% do PIB (Produto Interno Bruto).

Se a dívida líquida do governo geral estiver abaixo desse patamar, o limite de despesas poderia crescer por inflação mais 1,5%, ou por inflação mais a média do crescimento da economia nos três anos anteriores -o que for maior.

Caso o indicador de endividamento se situe entre 50% e 60% do PIB, o limite poderia crescer 1% acima da inflação, caso haja superávit primário, ou 0,5%, se o quadro for de déficit.

Com dívida líquida acima de 60%, as despesas só poderiam subir pela inflação, sem alta real.

Em janeiro de 2023, a DLGG estava em 56,79% do PIB (Produto Interno Bruto), segundo dados do Banco Central. Isso significa que, caso a proposta de Pedro Paulo fosse aprovada, o governo se enquadraria na situação intermediária e poderia expandir suas despesas em até 1% acima da inflação.

Os demais Poderes, como Judiciário e Legislativo, seriam beneficiados apenas em parte pela trajetória mais sustentável das contas públicas. Com seus orçamentos concentrados em despesas com pessoal, eles teriam aval para expansão real dos gastos só até 0,5%, quando a DLGG estiver abaixo de 60% do PIB.

Há ainda exceções para gastos fora do limite, que incluem transferências constitucionais a estados e municípios, despesas com eleições e Censo Demográfico, gastos custeados com doações ou acordos judiciais firmados em função de desastres ambientais e despesas de instituições federais de ensino bancadas com receitas próprias.

Os créditos extraordinários também seguem como uma válvula de escape para despesas urgentes e imprevistas -como ocorreu em 2020, com a pandemia de Covid-19. A partir de 2027, o governo ainda poderia quitar as dívidas judiciais de anos anteriores e que foram adiadas pela PEC dos Precatórios.

O projeto também prevê mecanismos anticíclicos, isto é, para atenuar os efeitos das oscilações da atividade econômica. Em momento de crise, com queda do PIB por três trimestres consecutivos, o governo poderia acionar uma cláusula que autoriza crescimento das despesas pela média do PIB dos dois anos anteriores.

Há ainda previsão de gatilhos de ajuste, caso a dívida líquida do governo geral esteja acima do nível sustentável de 50% do PIB. O objetivo central é corrigir desvios e assegurar a convergência da trajetória da dívida.

Eles incluem medidas de preservação ou recomposição de receitas (como proibição a novos incentivos tributários e redução dos já existentes) e contenção da expansão de despesas obrigatórias, como folha de pessoal e gastos atrelados ao salário mínimo. Em situações mais extremas, a lei prevê corte linear de 20% nos gastos com cargos em comissão e funções de confiança.

Alguns gatilhos também seriam acionados caso as despesas obrigatórias ultrapassem o índice de 93% de todos os gastos. Hoje, esse percentual está em 89,11%.

O projeto também estipula punição a quem ordenar ou autorizar medidas em desacordo com essas vedações. Os atos serão considerados crime de responsabilidade e improbidade administrativa, puníveis com perda do cargo, perda dos direitos políticos e multa em até 48 salários mínimos.

"Não basta, assim, uma regra fiscal estabelecer um limite de referência -seja voltado para o controle da dívida, dos resultados fiscais, da despesa primária, ou da regra de ouro. É necessário garantir, de forma preventiva e também corretiva, que, atingido o limite fixado, sejam acionados os ajustes necessários para corrigir o desequilíbrio econômico fiscal verificado", diz a justificativa do projeto.